Palestino é retirado de escombros de casa destruída em Khan Yunis | Foto: Mohammed Dahman/AFP

O ministério da Saúde palestino denunciou que o exército de ocupação israelense matou mais de 800 palestinos em seus ataques a Gaza desde o fim da trégua e ao longo do fim de semana, com o total de mortos beirando os 16 mil, mais 42 mil feridos. 70% das vítimas são mulheres crianças.

Na segunda-feira, Israel mandou uma coluna de tanques contra a principal cidade do sul, Khan Younis, para onde havia empurrado centenas de milhares de palestinos sob bombas e mísseis, dizendo que supostamente seria seguro, e agora planfleteia ordenando-lhes que fujam para uma área ainda menor, ou morram.

Os hospitais que restam funcionando “estão sendo inundados com uma montanha de cadáveres”, denunciou um funcionário da saúde palestino. O porta-voz da Unicef, James Elder, descreveu as cenas do Hospital Nasser, em Khan Younis, como “uma zona de morte”.

“Em uma campanha militar que dura há semanas, com apenas uma breve trégua, a velocidade e a escala dos bombardeios continuam a atingir as profundezas da brutalidade”, disse o coordenador médico dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Khan Younis, Chris Hook.

O número de deslocados no Hospital Nasser voltou a aumentar acentuadamente desde sábado, com novos abrigos sendo montados em todos os cantos do estacionamento. Muitas pessoas estão dormindo no chão. “Quase dois milhões de pessoas ficam sem opções. A única solução é um cessar-fogo imediato e sustentado e o fornecimento irrestrito de ajuda a toda a Faixa de Gaza”, ele acrescentou.

“O hospital recebe pacientes gravemente feridos quase a cada hora”, disse o coordenador. “Não há mais espaço disponível, realmente é uma situação terrível. Todos estão genuinamente preocupados com o que virá a seguir”

PROVOCAR PÂNICO

O porta-voz da Unicef descreveu à BBC um “nível de pânico” que nunca tinha visto antes em um hospital de Gaza, depois de o exército israelense ter mudado o foco da sua ofensiva para o sul.

Elder disse que podia ouvir grandes e constantes explosões perto do hospital Nasser e que crianças chegavam com ferimentos na cabeça, queimaduras graves e estilhaços incrustados de explosões recentes.

 “É um hospital onde vou regularmente e as crianças agora me conhecem; as famílias me conhecem. Essas mesmas pessoas agarram minha mão ou minha camisa e dizem: ‘Por favor, leve-nos para um lugar seguro’”.

“Infelizmente a única resposta a essa pergunta é que não existe lugar seguro. Nem mesmo, como sabem, aquele hospital”, indignou-se.

CANTO ESTREITO

Por sua vez, o chefe dos direitos humanos da ONU, Filippo Grandi, disse que os palestinos na Faixa de Gaza estão “cada vez mais empurrados para um canto estreito do que já é um território muito estreito”.

“Outra onda de deslocamentos está em andamento, e a situação humanitária piora a cada hora”, disse o chefe de Gaza da agência da ONU para refugiados palestinos (UNWR), Thomas White, em um post no X.

Como parte da estratégia – confessada por um ministro de Netanyahu – de tentar impor a “Nakba de Gaza”, o exército colonial israelense passou a lançar panfletos com mapas com áreas em amarelo (alguma preferência estranha pela cor) e a divulgar pela internet, para que as pessoas fujam, ou fiquem por conta e risco.

Nesses “mapas”, três setas apontavam para o sul e para o oeste, ordenando às pessoas para irem em direção ao mar Mediterrâneo e à fronteira egípcia.

Vários dos que estavam fugindo já haviam sido deslocados de outras áreas. Abu Mohammed disse à Reuters que já era a terceira vez que ele era forçado a fugir desde que abandonou sua casa na Cidade de Gaza, no norte.

“Ontem à noite, os tanques israelenses bombardearam do leste, do norte e do oeste, e também de (navios) em direção ao mar, com anéis de fogo ao nosso redor, e a casa ficou tremendo e coberta de luz vermelha das explosões, causando pânico e horror tanto nos adultos quanto nas crianças”, afirmou ele.

“Por que eles nos expulsaram de nossas casas na Cidade de Gaza se planejavam nos matar aqui?”, ele questionou.

No relato da Reuters, em uma casa em Khan Younis que foi atingida durante a noite, chamas eram vistas na alvenaria desmoronada e fumaça cinza saía dos escombros. O brinquedo de pelúcia de uma criança estava em uma pilha de poeira. Meninos estavam revirando os destroços com as mãos.

Na casa ao lado, Nesrine Abdelmoty estava em meio a móveis danificados no quarto alugado onde mora com a filha divorciada e o bebê de dois anos: “Estávamos dormindo às 5 horas da manhã quando sentimos as coisas desabarem, tudo ficou de cabeça para baixo”.

“Eles disseram (às pessoas) para se mudarem do norte para Khan Younis, já que o sul é mais seguro. E agora, eles bombardearam Khan Younis. Nem mesmo Khan Younis é seguro agora, e mesmo que nos mudemos para Rafah, Rafah também não é segura. Para onde eles querem que vamos?”

21 ABRIGOS DA ONU NA MIRA

Quase 2 milhões de palestinos estão aglomerados nos 230 quilômetros quadrados que compõem o sul e o centro de Gaza, para onde a incursão terrestre de Israel está se expandindo.

A tropa colonial israelense ordenou a evacuação de uma área que constitui cerca de um quinto de Khan Younis, que abrigava cerca de 117 mil pessoas antes da guerra e agora abriga dezenas de milhares de deslocados de outros lugares.

Na área sob ataque de Khan Younis funcionam 21 abrigos da ONU, com 50 mil refugiados. Grandes áreas a leste de Khan Younis também receberam ordens para fugir.

Os militares israelenses – registrou a Associated Press – ordenaram que os civis evitem a principal rodovia norte-sul entre Khan Younis e a cidade central de Deir al-Balah, dizendo que a estrada se tornou um “campo de batalha”.

O que indica que as tropas israelenses estavam se aproximando de Khan Younis pelo nordeste, possivelmente com planos de cortar o centro de Gaza do sul.

A televisão Al Jazeera exibiu imagens de médicos resgatando pessoas feridas pelo que parecia ter sido um ataque a um carro naquele trecho da rodovia. Um tanque israelense podia ser visto logo acima da estrada.

“INSTRUÇÕES PRECISAS”

Para melhor aterrorizar os civis palestinos, os novos “mapas” mostram o sul de Gaza dividido em dezenas de quarteirões com “instruções precisas” – esse é o linguajar dos psicopatas israelenses – aos moradores sobre onde evacuar.

Inclusive o principal conselheiro do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, Mark Regev, asseverou que as tropas israelenses estão tentando ser “o mais cirúrgicas possível” e alertar “com antecedência”.

“O nível de sofrimento humano é intolerável”, disse Mirjana Spoljaric, presidente do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, durante uma rara visita à Gaza. Ela também pediu a libertação imediata de dezenas de reféns capturados por militantes palestinos durante o ataque de 7 de outubro.

“É inaceitável que os civis não tenham um lugar seguro para ir em Gaza e, com um cerco militar em vigor, também não há uma resposta humanitária adequada atualmente possível.”

O Hospital dos Mártires de Al-Aqsa, em Deir al-Balah, recebeu 32 corpos durante a noite após ataques israelenses no centro de Gaza, disse Omar al-Darawi, um funcionário administrativo. Imagens da agência de notícias Associated Press mostraram mulheres em lágrimas, ajoelhadas sobre os corpos de entes queridos e beijando-os.

“Ouvimos bombardeios ao nosso redor, dia e noite”, disse Katrien Claeys, dos Médicos Sem Fronteiras no centro de Gaza.  “Atendemos pacientes com sinais de infecção e tecido necrótico, pois não recebem troca de curativo há dias e, às vezes, semanas”, acrescentou.

“ISRAEL VIRA AS COSTAS AOS REFÉNS EM FAVOR DE DESTRUIR GAZA”

O colunista do jornal israelense Haaretz, Gideon Levy, advertiu que a decisão de preferir a retomada e intensificação da destruição de Gaza, tomada por Netanyahu e seu gabinete de guerra, significa que Israel “virou suas costas aos reféns em favor de destruir Gaza”.

Segundo ele, a retomada por Israel da guerra é seu maior erro desde 7 de outubro. “Uma guerra ‘pesada em dias, pesada em sangue’, nas maravilhosas palavras de Moshe Dayan a respeito de outra guerra, tornou-se uma guerra ainda mais pesada em dias e sangue, com os seus objetivos a recuarem e os seus crimes a acumularem-se”.

As manifestações pelo “traga-os de volta” não vão cessar, nem o clamor para que Netanyahu renuncie.

O comando do Hamas já advertiu que a libertação de mais reféns só com um cessar-fogo negociado.  

“NETANYAHU, O CARNICEIRO DE GAZA”

O presidente da Turquia, Tayyip Erdogan, disse na segunda-feira que o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, acabará sendo julgado como criminoso de guerra por causa da ofensiva em curso de Israel na Faixa de Gaza, ao mesmo tempo, em que criticou os países ocidentais que apoiam Israel.

Em um discurso em uma reunião da Organização de Cooperação Islâmica (OIC) em Istambul, Erdogan disse que as nações ocidentais que apoiam Israel estão dando “apoio incondicional para matar bebês” e são cúmplices de seus crimes.

“Além de ser um criminoso de guerra, Netanyahu, que é o carniceiro de Gaza neste momento, será julgado como o carniceiro de Gaza”.

“Aqueles que tentam ignorar as mortes de todos aqueles inocentes usando a desculpa do Hamas, não têm mais nada a dizer à humanidade”, acrescentou, referindo-se às potências ocidentais, que ele disse serem “cegas e surdas”.

Fonte: Papiro