Estudantes de Harvard protestam contra o massacre de palestinos | Foto: Julian J. Giordano/Harvard Crimson

No afã de deter a crescente repulsa, entre a juventude dos EUA, ao genocídio perpetrado por Israel em Gaza, que já matou e feriu mais de 60 mil palestinos, com a proliferação de manifestações nas universidades a favor do cessar-fogo, círculos extremistas do establishment norte-americano vêm promovendo uma caça às bruxas, sob o pretexto de que tais protestos seriam “antissemitas” e poriam em risco vidas de judeus.

Como denunciou o respeitado portal judaico Mondoweiss, “em um precedente perigoso, a Câmara dos deputados dos EUA aprovou um polêmico projeto de lei que equipara o antissionismo ao antissemitismo” na semana passada.

Projeto que, denuncia o Mondoweiss, “efetivamente estabelece as bases para que outras leis sejam elaboradas que possam classificar protestos e manifestações pró-Palestina como crimes”.

A aprovação – acrescenta o portal – provocou indignação “entre os defensores da Palestina e da liberdade de expressão”.

VOZES JUDAICAS CONTRA NAKBA DE GAZA

Registre-se que expressões importantes da comunidade judaica nos EUA, como os grupos Voz Judaica pela Paz e IfNotNow, encabeçaram algumas das mais significativas manifestações nos EUA contra o genocídio e a limpeza étnica em curso em Gaza, perpetradas pelo regime no poder e conclamando ao “cessar-fogo já”, “Nunca Mais é para Todos”, “Assassinar crianças é autodefesa?”, “Não em Nosso Nome” e “Palestina Livre”.

Manifestações motivadas pela extensão apocalíptica do desastre humanitário em curso em Gaza: 60 mil palestinos mortos e feridos por bombas e mísseis, na maioria mulheres e crianças; 1,8 milhões expulsos de seus lares; escolas da ONU, padarias, mesquitas e hospitais bombardeados; sob um cerco total que pune coletivamente os palestinos com o bloqueio de água, luz, combustível, comida e remédios. Um massacre que – como assumido pelos próprios chefes atuais do projeto sionista – visa, em uma segunda Nakba, deslocar até os milhões se possível da população palestina na Faixa de Gaza a míssil e bomba.

Mondoweiss aponta que ao estabelecer, em sua quarta cláusula, “clara e firmemente que o antissionismo é antissemitismo”, a nova lei objetivamente desconhece que, historicamente, uma parcela ponderável dos judeus se considera antissionista tanto por objeções religiosas quanto por uma longa tradição de ativismo secular.

DISSIMULAÇÃO FLAGRANTE

O portal judaico denuncia ainda como “uma dissimulação flagrante” a reivindicação de que a frase ‘Do Rio ao Mar… é um grito de guerra pela erradicação do Estado de Israel e do povo judeu”. “Isso foi desmascarado tantas vezes e de tantas maneiras, até o Congresso deveria se envergonhar de uma mentira tão óbvia”.

“A ausência de qualquer menção concomitante a ataques anti-árabes e islamofóbicos – apesar de termos visto uma criança palestina-americana esfaqueada até à morte no Illinois, três jovens palestino-americanos baleados em Vermont e um estudante palestino atropelado com um carro na Califórnia, entre um enorme aumento de crimes de ódio antiárabes e antissemitas – deixa claro que não se trata de proteger minorias religiosas”, adverte Mondoweiss.

Mondoweiss denunciou, em desdobramento, um grupo de deputados bipartidário pró-Israel simplesmente apresentou um projeto de lei (HR 6578), intitulado “Estabelecer a Comissão para Estudar Atos de Antissemitismo nos Estados Unidos”, destinado “EXCLUSIVAMENTE a visar críticas a Israel e ao sionismo”.

Qualquer semelhança com o período do macartismo não é mera coincidência, com o Mondoweiss registrando que o projeto pretende proibir qualquer testemunha intimada para a comissão de invocar seu direito da Quinta Emenda para evitar a autoincriminação.

“Isso é particularmente problemático em uma atmosfera em que as críticas a Israel estão se preocupando em ser categorizadas como discurso de ódio” e com a definição de antissemitismo ainda mais vaga do que na resolução já aprovada.

Mondoweiss acrescentou que a comissão “lembra assustadoramente o Comitê de Atividades Não-Americanas da Câmara que o senador Joe McCarthy usou para destruir tantas vidas, incluindo um grande número de esquerdistas judeus”.

Uma nova caça às bruxas – que buscaria destruir a vida de americanos que ousem criticar Israel, incluindo judeus americanos. “A pergunta ‘Você é agora ou já foi um defensor dos direitos palestinos’ pode muito bem vir a assombrar a história americana, assim como McCarthy fez”.

CAÇA ÀS BRUXAS EM HARVARD, PENN E MIT

Nos EUA, o establishment pró-genocídio em Gaza intensificou nos últimos dias a pressão contra as manifestações de repúdio, que insistem em tachar de “antissemitas”, embora expressem, ao contrário, um enorme compromisso com a paz e a vida.

Além das ameaças de punição a estudantes que foram exigir no campus o “cessar-fogo” ou o “fim do genocídio”, o establishment dirigiu seu fogo contra reitores que supostamente não estariam reprimindo adequadamente os “antissemitas” que se indignam com quase 8 mil crianças palestinas mortas em dois meses e 6 mil mulheres.

As reitoras da Universidade da Pensilvânia, Mary Elizabeth “Liz” Magill, de Harvard, Claudine Gay, e do Massachusetts Institute of Technology (MIT), Sally Kornbluth, foram submetidas à santa inquisição no Congresso dos EUA, por supostamente serem coniventes com o “antissemitismo” e defenderem a liberdade de expressão nos campi.

Magill já renunciou – depois que o principal doador da universidade cortou donativo de 100 milhões de dólares – e sobre Gay a pressão continua enorme.

O bilionário, Bill Ackman, ex-aluno de Harvard, sub-repticiamente ameaçando não fazer mais doações, exigiu que Gay “renuncie em desgraça”.

“Em seu curto mandato como presidente, Claudine Gay causou mais danos à reputação da Universidade de Harvard do que qualquer indivíduo em nossos quase 500 anos de história”, acrescentando que ela “catalisou uma explosão de antissemitismo e ódio no campus sem precedentes na história de Harvard”.

PELA LIBERDADE DE EXPRESSÃO

Mais de 500 membros do corpo docente assinaram uma carta à Harvard, pedindo ao corpo diretivo da universidade que não removesse Gay, informou o Harvard Crimson no domingo.

Na carta, os membros do corpo docente instaram a universidade “a defender a independência da universidade e a resistir às pressões políticas que estão em desacordo com o compromisso de Harvard com a liberdade acadêmica, incluindo pedidos para a remoção da presidente Claudine Gay”.

“O trabalho crítico de defesa de uma cultura de livre investigação em nossa comunidade diversa não pode prosseguir se deixarmos que sua forma seja ditada por forças externas”, acrescentaram.

Na audiência no Congresso, uma deputada republicana equiparou os chamados de estudantes por uma “Intifada” – as revoltas palestinas contra a ocupação – à exortação ao “genocídio contra os judeus em Israel e no mundo” e depois usou a defesa da liberdade de expressão no campus, feita pelas reitoras, para encenar que haveria uma conivência com o “antissemitismo sistêmico”.

A provocação incluiu perguntar se “conclamar o genocídio dos judeus é uma violação do código de conduta” de suas universidades.

Como não há nenhum genocídio de judeus em campi norte-americanos, era só um estratagema para defesa do genocídio que realmente está acontecendo: em Gaza, de palestinos, e perpetrado pelo regime mais extremista que já governou Israel.

No dia seguinte à inquisição das reitoras, o Comitê de Educação da Câmara dos deputados, encabeçado pelos trumpistas, cinicamente considerou “inaceitáveis” as respostas ao que chamou de “antissemitismo endêmico” nas universidades e anunciou a abertura de uma “investigação para identificar as falhas individuais e institucionais”.

Fonte: Papiro