Eleições e maturação do PAC se somam a reformas para alavancar economia em 2024
Canal do Fragoso, em Olinda, está no Novo PAC. Divulgação/Governo Federal
As previsões iniciais para 2023 estavam baseadas em uma visão equivocada do que seria o terceiro mandato do presidente Lula. As expectativas do mercado, muitas vezes influenciadas por preconceitos políticos, não consideravam a estabilidade e a tranquilidade indicadas pelos dois primeiros governos do presidente. O crescimento de 3% em 2023 foi impulsionado por fatores como o setor agrícola e uma reativação econômica após a normalização da sociedade.
Estas são as opiniões do economista Marcelo Fernandes, em entrevista. Ele também preside o Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro e é professor na UFRRJ, e aborda de maneira otimista as perspectivas econômicas para o Brasil, especialmente focalizando o ano de 2024.
Marcelo Fernandes destaca que 2023 foi um ano de recolocar o Brasil na rota do crescimento e do desenvolvimento social, enquanto 2024 se configura como um ano de preparação para mudanças estruturais que podem impulsionar o país para um novo patamar de desenvolvimento. Contudo, ele ressalta que, para alcançar essas metas, é necessário um esforço conjunto na superação de desafios fiscais e no estímulo ao investimento.
“Em resumo, eu diria que 2023 foi um ano de basicamente colocar as coisas no seu devido lugar, recolocar o Brasil numa rota de crescimento, numa rota de melhoria e desenvolvimento social e 2024 é um ano para preparar um outro patamar de desenvolvimento do nosso país”.
Desmistificando previsões equivocadas
Fernandes inicia sua análise destacando as discrepâncias entre as previsões para 2023 e a realidade. Ele aponta que muitas das previsões baseavam-se em uma visão equivocada do que seria um terceiro mandato do presidente Lula. O economista ressalta que, mesmo antes das eleições, já era possível prever, com base no plano de governo e na experiência dos dois primeiros mandatos de Lula, uma trajetória de estabilidade e crescimento moderado.
“Já se sabia de certo modo o que ia se fazer. Estava previsto no plano de governo, e mais do que isso, a história dos dois primeiros governos do presidente Lula indicavam muito mais tranquilidade e menos instabilidade do que o mercado naquele momento percebia, ou pelo menos imaginava”.
Ele critica a postura do setor financeiro, que, segundo ele, tende a ter um viés de baixa em expectativas quando se trata de governos de esquerda. Ele ressalta que o último crescimento robusto no Brasil ocorreu justamente em 2010, no governo Lula, com 7,5% de crescimento, e argumentou que o país precisa superar a lógica fiscal que tem limitado seu crescimento.
“Esse mercado, que é o mercado financeiro, normalmente tem um viés de baixa de expectativas, quando é um governo de esquerda. Esse mercado, na realidade, apoiou o Bolsonaro”, afirma.
O crescimento de 3% em 2023 foi atribuído a diversos fatores, incluindo o desempenho positivo no setor agrícola e uma reativação geral da economia à medida que a sociedade se normalizava. No entanto, Fernandes destaca que o país ainda enfrenta desafios significativos, especialmente em relação ao investimento, que permanece abaixo do ideal.
“O crescimento dos 3% foi influenciado por uma série de fatores, entre eles a própria questão da agricultura, em todo o setor agrícola, principalmente no primeiro semestre, mas depois também uma redinaminização da economia que começa a acontecer com uma normalização da nossa sociedade na economia em geral”, enfatiza ele.
Desafios em 2024: Investimento e questões fiscais
O entrevistado identifica o baixo nível de investimento como o principal desafio para o Brasil em 2024. O economista aponta para a necessidade de uma queda mais acelerada dos juros e destacou a importância das discussões sobre o arcabouço fiscal, incluindo a reforma tributária. Ele ressalta que o cenário para 2024 é marcado pela expectativa de eleições, o que pode impulsionar o investimento. “Ano eleitoral tem as suas características próprias. É normal a gente assistir um crescimento maior inclusive, porque o investimento vai crescer, em especial nos municípios”, diz.
Além disso, menciona a maturação de projetos estruturais, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). “Então é possível imaginar que 2024 seja um ano não mais de consolidação e normalização da economia e da sociedade em geral, mas muito mais um ano de criação de potenciais e mudanças estruturais que possam alavancar o crescimento brasileiro para um patamar diferente”, analisa.
Fernandes enfatiza que o investimento público, a discussão da reforma tributária e outros marcos importantes, como a discussão ambiental, desempenharão papéis cruciais em 2024. Ele expressa a esperança de que o próximo ano seja marcado por mudanças estruturais que impulsionem o crescimento do Brasil para um patamar mais elevado no desenvolvimento econômico e social.
O economista expressa preocupação com a política fiscal, mencionando que o Brasil precisa urgentemente sair da lógica de equilíbrio fiscal que vem sendo adotada há décadas. Destacou que, historicamente, quando o país se desvincula dessa lógica, o crescimento é mais expressivo.
“É bom que se diga que o governo não fez grandes movimentos para que isso [o crescimento de 3%] acontecesse. Infelizmente a gente ainda está preso àquela mesma lógica fiscal que vem nos aprisionando há pelo menos três décadas. Quando você consegue sair um pouco disso, como foi por exemplo lá em 2010, você tem um crescimento maior”, explica.
As previsões de um crescimento em 2024 abaixo da média mundial, podem acabar se confirmando, segundo o economista. “Por essa lógica fiscal, essa perseguição, essa meta de equilíbrio fiscal de qualquer maneira, de corte nos gastos, que é algo que vem se impondo há muito tempo no Brasil. Infelizmente o ministro [Fernando] Haddad parece que acredita mesmo nisso; não é só uma questão de querer agradar o mercado, de tentar ganhar fôlego político. Acho que ele acredita mesmo nessa história, que vem amarrando o crescimento do Brasil”, lamenta. “O Brasil precisa, urgentemente, sair dessa lógica de equilíbrio fiscal, de superávit primário, etc”.
Inflação e medidas governamentais
No tocante à inflação, Fernandes também considera que o mercado se equivocou. “Os preços estão estabilizados; esse ano a inflação deve ficar abaixo de 5%. Para 2004, a mesma coisa, a previsão é que a inflação fique abaixo dos 4%, em torno de 3,8% e 3,9%”, pondera.
Para que isso ocorresse, ele destaca as mudanças na política de preços da Petrobras e a reorganização de programas relacionados à agricultura familiar como elementos-chave. A implementação de medidas como a reorganização dos estoques reguladores contribuiu para a redução da inflação de alimentos, beneficiando as camadas mais populares da sociedade. O economista salienta também a valorização do salário mínimo como um fator positivo.
O economista ainda avalia que as iniciativas do governo em 2023, como a retomada do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a oferta de crédito e políticas de renegociação de dívidas, marcaram a presença do Estado como um agente econômico dinamizador. “A retomada do PAC e a retomada de obras paralisadas e a retomada da elaboração de projetos e a retomada da indicação de diretrizes para o investimento em infraestrutura econômica e social, dinamiza a organização do sistema produtivo considerando sua capacidade para atender as demandas que irão se colocar daqui para frente, ou que passam a se colocar já com a retomada, por exemplo, das obras paradas”, pontua.
A estratégia do governo para 2024, segundo ele, deve fortalecer essas iniciativas, buscando formas de oferecer crédito para investimento e promovendo a inovação tecnológica, integrando a economia brasileira ao cenário mundial e preparando o país para um novo patamar de desenvolvimento.
“A oferta de crédito a custos bem mais baixos do que aquela ofertada pelo sistema oficial, seja por meio do cooperativismo de crédito, seja por meio dos bancos públicos, no caso do investimento especialmente o BNDES, que abre carteiras com taxas de juros bem menores e, portanto, compatível com o custo de capital necessário para fazer os investimentos pelo setor privado. A oferta de projetos estruturantes nos âmbitos federal, mas também as políticas, por exemplo, associada a todo o programa de renegociação de dívidas, especialmente das famílias”, continua citando ele. “São inúmeras iniciativas que visaram, de um lado, manutenção da renda, do outro lado, crédito, do outro lado, investimento, do outro lado, retomada de projetos”.
Fernandes acredita que é nessa estratégia que o governo procurará sustentando a dinâmica de crescimento, integrando a economia brasileira e a economia mundial. “Ampliando nossas carteiras especialmente de exportação de produtos manufaturados, promovendo a agregação de valor na nossa economia, na nossa produção no mercado interno, incorporando o conteúdo nacional às diferentes frentes de estruturação da capacidade industrial e de transformação”. De acordo com ele, essas são as diretrizes que vão sustentar um esforço para manter uma taxa de crescimento e fazer o chamado PIB potencial, ampliar sua perspectiva e, portanto, a sustentação de um crescimento econômico que mantém simultaneamente a inflação baixa e amplia a capacidade de aumentar a renda do trabalho.
(por Cezar Xavier)