Argentinos tomaram as ruas em defesa das instituições culturais atacadas por Milei | Foto: Enrique García Medina

Entoando “Milei, basura (lixo) não toque na cultura” e “A Pátria não se vende”, centenas de manifestantes marcharam do prédio do Fundo Nacional das Artes (FNA) até o Instituto Nacional do Teatro (INT), em Buenos Aires, para rechaçar o projeto do governo argentino que ameaça as instituições de fomento cultural de “apagão”.

Há três semanas de sua posse, o presidente Javier Milei anunciou um decreto com o qual pretende revogar o Decreto-Lei que criou a FNA, em 1958, e a Lei do Teatro Nacional, em 1997. A reação do setor ao atentado foi imediata.

Centenas de lideranças, artistas, professores, estudantes e trabalhadores culturais tomaram as ruas, com amplo respaldo da população, que reverberou com buzinaço e aplausos ao protesto.

“Tudo isso é gravíssimo. Estou aqui apoiando a FNA porque defende todos os artistas com objetividade e justiça. É uma instituição exemplar”, declarou a escritora de contos, romances e ensaios Liliana Heker, Prêmio Nacional de Literatura, para quem “a medida mostra que o governo age com uma veemência e ódio incomparáveis”.

“É muito assustador. Ultimamente, a frase de Goebbels passou várias vezes pela minha cabeça: ‘Quando ouço a palavra cultura, tiro minha arma’. Acho que chegará um momento em que teremos que sair e defender muitos direitos que nos estão sendo tirados. Este é um e aqui estamos nós”, acrescentou.

Entre as inúmeras medidas da FNA que tiveram papel histórico na vida cultural argentina está o empréstimo concedido ao magistral compositor e bandoneonista Ástor Piazzolla para comprar um piano.

“Hoje defendemos o que foi tão violentamente atacado com as medidas que tentam destruir de uma só vez: os direitos adquiridos pelos quais tantas pessoas lutaram. Sinto isso como uma provocação”, declarou o ator Diego Velázquez, conclamando os parlamentares para que ajam em conjunto e barrem mais este atentado de Milei.

“ATAQUE VIOLENTO E FASCISTA DO DNU”

“Estou aqui para nos defender do ataque violento e fascista do DNU (Decreto Nacional de Urgência) e daquelas bases horrendas que Milei apresentou. Hoje tratam de eliminar nossa identidade cultural, que é o que nos define como país”, apontou o diretor de teatro Rubén Szuchmacher.  “Atacar as instituições artísticas é uma forma de desintegrar uma identidade nacional que pode ser repulsiva para quem tenta vender o país a todo custo e adotar uma tradição totalmente estrangeira como a dos Estados Unidos”, acrescentou

O que tantas vezes se explicou é que ambas as organizações são autônomas e, como observou o ator Osqui Guzmán, “não tocam no dinheiro do Estado”. Além disso, o investimento na cultura que o governo pretende eliminar representa apenas 0,2% do orçamento nacional. Outro ponto a destacar, observou, é que o setor cultural gera um valor agregado anual de 1,8%, pelo que o seu orçamento é superavitário.

Conforme os manifestantes, tanto o FNA como o INT são instituições transparentes, com ampla representatividade e geram milhares de empregos diretos e indiretos. As instituições que estão no alvo do governo, ressaltou Guzmán, “são ferramentas para os trabalhadores culturais, não só aqui, em Buenos Aires, mas de todo o país”.

A atriz Leticia González de Lellis recordou que são “direitos adquiridos” sem os quais muitas obras não poderiam ser materializadas. “Os artistas não vivem do INT porque às vezes só se compram os sapatos para uma obra com essas contribuições. Sem esses recursos a obra simplesmente não pode ser feita”, destacou.

De acordo com o diretor e autor Emilio García Wehbi “a ameaça contra o INT e a FNA, instituições estratégicas, é extremamente grave, pois em termos socioeconômicos e culturais o que se propõe é praticamente um desmantelamento do conceito de nação”.

Fonte: Papiro