Prisioneiros palestinos libertados saem em condições degradantes
Pessoas se reúnem com fotos de prisioneiros palestinos mantidos sob custódia israelense durante uma manifestação em solidariedade a eles na cidade de Nablus, na Cisjordânia ocupada, em 17 de abril de 2023
A recente trégua em Gaza trouxe um breve alívio para a população palestina, permitindo um respiro em meio à devastação causada pelos intensos bombardeios e destruição. No entanto, enquanto a atenção do mundo se volta para a situação humanitária em Gaza, o presidente do Fórum Latino Palestino, Mohamad El Kadri, destaca um aspecto sombrio e muitas vezes negligenciado do conflito: as condições degradantes enfrentadas pelos prisioneiros palestinos sob custódia israelense.
Em entrevista, El-Kadri descreveu a situação criminosa dos prisioneiros palestinos liberados durante a trégua. O tratamento dispensado por Israel revelou-se desumano e, em muitos casos, chocante. Membros do Hamas trataram os reféns com respeito, evidenciando uma relação humanizada, enquanto, paradoxalmente, prisioneiros palestinos retornaram em estado de saúde debilitado, tanto fisicamente quanto psicologicamente.
“Até a gente percebeu nas imagens dos reféns saindo, junto com membros do Hamas, que havia uma relação, que eles se cumprimentaram, deram tchau um para o outro. Isso demonstrou que o Hamas foi mais humano do que os próprios israelenses em relação aos prisioneiros palestinos libertados”, observa ele.
“Os prisioneiros palestinos saíram de tal forma que chega a ser até chocante”, enfatiza El-Kadri. Ele destaca o caso de um jovem que, após o período de detenção, mal conseguia reconhecer seu entorno, resultado de torturas físicas e psicológicas intensas, além da privação de necessidades básicas como alimentação, água e banho.
“Bassel Aiaede, passou 16 anos nas prisões sionistas, a maior parte na solitária, perdeu a memória devido as torturas e sequer reconheceu seus familiares”, relata.
A maioria dos prisioneiros, alarmantemente, são crianças, algumas detidas desde tenra idade, como no caso de um jovem que entrou com 10 anos e saiu com 18 anos. El-Kadri ressalta a gravidade dessas detenções arbitrárias. “Você prende criança sob a alegação de que ela cometeu um crime. Qual foi o crime? Ela participou em manifestação contra a ocupação, foi uma criança que jogou uma pedra num tanque”, critica.
As prisões arbitrárias e a falta de acusações formais deixam os prisioneiros palestinos desprotegidos, sem assistência adequada. A entrada da ajuda humanitária proporcionou a oportunidade para a mídia testemunhar a tragédia e a catástrofe resultantes dos ataques israelenses em Gaza. “O mundo está vendo, de fato, –inclusive funcionários da ONU que entraram lá –, que prestam ajuda humanitária em Gaza, ficaram horrorizados”.
Enquanto a comunidade internacional observa atentamente os desenvolvimentos em Gaza, El-Kadri ressalta a importância de responsabilizar Israel pelas violações dos direitos humanos, instando à proteção dos prisioneiros palestinos e à promoção de uma solução justa e duradoura para o conflito. A busca por uma paz verdadeira na região exige uma avaliação crítica das práticas de detenção e tratamento de prisioneiros, destacando a urgência de ações concretas para garantir os direitos fundamentais da população palestina.
Respiro em meio à devastação
O dirigente do Fórum Latino Palestino avalia que a recente trégua em Gaza trouxe um alívio tão esperado para a população palestina, permitindo que o povo recupere o fôlego após dias intensos de bombardeios e destruição. El-Kadri destacou os impactos positivos dessa pausa nas hostilidades.
Ele ressaltou a importância da trégua para os palestinos, proporcionando uma oportunidade para a população se reorganizar e recuperar condições mínimas de vida. Essa assistência teve um papel fundamental em amenizar as condições precárias enfrentadas pelos palestinos. “A entrada de ajuda humanitária deu um refresco enorme, enorme, enorme para o povo palestino, que não tinha nada lá dentro, e continua entrando. Isso vai ajudar bastante com alimentação, água, combustível para os hospitais e tudo mais”, disse.
A entrada da ajuda humanitária permitiu que a mídia visse de perto a devastação causada pelos ataques israelenses em Gaza. El-Kadri mencionou que funcionários da ONU que entraram na região ficaram horrorizados com a magnitude da tragédia. Hospitais foram descritos como “locais de morte”, revelando o impacto desastroso dos conflitos na infraestrutura e nos serviços essenciais.
“Cada um está retornando à sua casa para ver se está em pé ou está destruída. Muitas situações trágicas em que a pessoa chega na sua casa e não a vê. Só um monte de escombros e mais nada”, relata.
O dirigente palestino expressou sua esperança de que a trégua seja estendida, proporcionando mais tempo para a população civil em Gaza. “Aguardamos para ver se Israel vai aceitar essa nova trégua e acabar ajudando os palestinos de uma forma indireta, ao permitir a entrada de ajuda humanitária. As pessoas poderem se locomoverem dentro de Gaza, já é um grande avanço para a população palestina tão sofrida e que sofreu a mais brutal das barbáries cometidas nessa guerra”.
Ele enfatizou a importância de continuar expondo a realidade da situação e de pressionar por uma solução justa e duradoura para o conflito. A comunidade internacional está testemunhando os eventos em Gaza, e El-Kadri acredita que é crucial responsabilizar Israel pelos ataques que causaram sofrimento desmedido à população palestina.
Nestes últimos dias, foram presos mais palestinos do que libertados. A Sociedade dos Prisioneiros Palestinos afirma que as forças israelenses detiveram 168 palestinos na Cisjordânia ocupada desde o início da trégua na sexta-feira. Durante o mesmo período, 150 palestinos foram libertados por Israel desde sexta-feira como parte do acordo.
O escândalo das crianças palestinas detidas
A ocupação israelense nos territórios palestinos é marcada não apenas pela constante tensão política e violência, mas também pela massiva detenção de palestinos, incluindo crianças, em um complexo sistema prisional que está sendo fortemente criticado por organizações de direitos humanos.
Altas taxas de encarceramento: Desde 1967, quando Israel ocupou Jerusalém Oriental, a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, aproximadamente um milhão de palestinos foram presos, representando um em cada cinco palestinos. Entre os homens palestinos, a taxa de encarceramento chega a dois em cada cinco.
Comparativamente, nos Estados Unidos, famoso por ter a maior população carcerária do mundo, a taxa de encarceramento é de uma em cada 200 pessoas.
Prisioneiros atuais: Atualmente, cerca de 5.200 palestinos estão detidos em prisões israelenses, incluindo 33 mulheres e 170 crianças. Se julgados, esses prisioneiros enfrentarão processos em tribunais militares, levantando preocupações sobre o devido processo legal.
Detenção administrativa: Dentre os detidos, 1.264 palestinos estão sob detenção administrativa, sendo mantidos indefinidamente sem julgamento ou acusações formais. Essa prática, herança do Mandato Britânico, é baseada em “provas secretas”, permitindo a extensão indefinida da detenção.
Crianças como alvo: Desde 2000, mais de 12 mil crianças palestinas foram detidas por forças israelenses. Anualmente, pelo menos 700 crianças são processadas em tribunais militares israelenses, muitas vezes acusadas por lançamento de pedras.
Ordens militares controversas: Diversas ordens militares israelenses geram controvérsias. A Ordem Militar 1726 permite a detenção preventiva de crianças por até 40 períodos de 15 dias antes de apresentar acusações. A Ordem Militar 1745 exige a gravação de interrogatórios, exceto para crianças detidas por razões de segurança.
Mudanças na lei: Israel alterou sua lei em 2016, permitindo que crianças menores de 14 anos fossem responsabilizadas criminalmente. Essa mudança foi aplicada ao caso de Ahmed Manasra, detido aos 13 anos, evidenciando uma flexibilidade na legislação.
O sistema prisional israelense continua a ser alvo de críticas, sendo descrito como um “complexo monstruoso”. As detenções arbitrárias, especialmente de crianças, são apontadas como uma forma de punição coletiva e exploradas para obter informações ou extorquir financeiramente as famílias, revelando sérias violações dos direitos humanos. O tema permanece como uma questão urgente e controversa no cenário internacional.
(por Cezar Xavier)