Sabesp já pode universalizar serviços de água e esgoto sem privatização
O governador Tarcísio de Freitas, do partido Republicanos, tem argumentado que a privatização é a chave para universalizar os serviços de tratamento de água e esgoto no estado deSão Paulo. Contudo, Amauri Pollachi, diretor da Associação de Profissionais Universitários da Sabesp (APU), e Helena Maria da Silva, vice-presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema), apresentam argumentos convincentes de que a Sabesp tem todas as condições de atingir essa universalização sem a necessidade de privatização.
Esta reportagem participou da entrevista coletiva organizada pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé nesta sexta-feira (15), que ressaltou os enormes riscos, alguns que já são sentidos, conforme o processo de venda da empresa se aproxima. A entrevista revelou uma série de preocupações em relação à privatização da Sabesp, incluindo a possível deterioração dos serviços, a falta de transparência no processo e a necessidade de garantir o acesso universal à água.
As alegações de Tarcísio de Freitas sobre a necessidade de privatizar a Sabesp para alcançar a universalização dos serviços de saneamento são questionáveis à luz dos fatos apresentados pelos especialistas. A Sabesp já demonstrou um compromisso com políticas sociais, possui um plano de investimento sólido e tem a capacidade técnica para alcançar a universalização.
Eles defendem que a Sabesp tem uma trajetória positiva na melhoria do acesso à água e ao saneamento e que a privatização não é necessária para alcançar a universalização dos serviços, além de levantarem preocupações sobre o impacto nas populações mais vulneráveis e a qualidade dos serviços sob gestão privada. Privatizar a empresa poderia representar um risco para o acesso à água e saneamento para as comunidades mais vulneráveis.
A discussão sobre o futuro da Sabesp continua, mas com base nos argumentos apresentados por Amauri e Helena, fica claro que a empresa pública tem o potencial e o compromisso necessários para cumprir seu papel na garantia dos direitos humanos à água e ao saneamento básico.
Com 1h24m de duração, a entrevista reúne argumentos precisos para desbancar as falácias do governador ao justificar a venda da Sabesp:
Água e saneamento como Direitos Humanos
O ponto de partida para essa discussão é o reconhecimento de que o acesso à água potável e ao saneamento básico é um direito humano fundamental. Tarcísio de Freitas não está sozinho em sua crença nisso, pois está em trâmite uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) na Câmara dos Deputados que visa introduzir na Constituição Federal o reconhecimento do acesso à água como um direito de todos e todas no Brasil. Amauri Pollachi destaca a importância desse reconhecimento, enfatizando que o acesso à água deve ser garantido para toda a população, sem distinção de condição social.
“Veja, por exemplo, que na cidade de São Paulo, mais de 50 mil pessoas, quase 55 mil pessoas vivem em situação de rua e têm uma dificuldade enorme de acesso à água, acesso a um banheiro digno. E nós acreditamos que a provisão desse acesso deve ser garantida para todos, inclusive quem está em situação de rua”, diz Amauri.
Políticas sociais da Sabesp
“A Sabesp sempre teve um equilíbrio entre o atendimento social e o resultado financeiro”, diz Amauri, reafirmando que a Sabesp já demonstrou um compromisso sólido com o atendimento social. Atualmente, a empresa oferece tarifas sociais de água e esgoto, com famílias de baixa renda pagando apenas R$ 27,00 por mês para o consumo de 10 mil litros de água. Além disso, existe uma tarifa ainda mais baixa, conhecida como “tarifa vulnerável,” que beneficia as pessoas em situação de miserabilidade mais extrema, permitindo que paguem apenas R$ 17,00 por mês pelos mesmos 10 mil litros de água. Essas políticas sociais, que garantem o acesso à água a preços acessíveis, são uma prova de que a Sabesp está comprometida com o bem-estar da população, algo que não é comum em empresas privatizadas.
“Vamos colocar claramente para a população. Não há qualquer vantagem [na privatização] para você que está nos assistindo, para o seu vizinho, para o seu amigo, para o seu parente, para quem quer que seja que more numa cidade onde hoje a Sabesp presta ser visto. Nenhuma vantagem.”
Amauri Pollachi e Helena Maria da Silva também refutam as alegações de Tarcísio de Freitas de que a privatização da Sabesp levaria a uma redução nas tarifas. Argumentam que essa afirmação é uma falácia e que os dados estão sendo manipulados para favorecer a privatização. De fato, a experiência internacional mostra que, após a privatização de serviços de saneamento, as tarifas muitas vezes aumentam, deixando a população em uma situação financeira ainda mais difícil.
Universalização já alcançada
“É o seguinte, eles esquecem de falar que, hoje, dos 375 municípios que a Sabesp opera, nós já temos 305 municípios totalmente universalizado o saneamento.”
Helena destaca um ponto crucial: grande parte dos municípios operados pela Sabesp já alcançou a universalização dos serviços de saneamento, atingindo 100% de cobertura em água, esgoto e tratamento. Esses municípios são comumente chamados de “municípios 300%”. Isso demonstra que a Sabesp tem a capacidade técnica e operacional de alcançar a universalização sem a necessidade de privatização.
Além disso, a Sabesp já tem um plano de investimento de R$ 56 bilhões, prevendo a universalização dos serviços até 2029. Isso inclui melhorias nas estações de tratamento de água e esgoto, o que contribuirá para a qualidade dos serviços. Amauri Pollachi enfatiza que a privatização não é a única maneira de antecipar metas, já que a Sabesp tem a capacidade técnica e os contratos existentes para fazer isso acontecer.
Impacto nas periferias
“A população preta e pobre, que está principalmente nas comunidades, nas periferias das grandes cidades, vai ser impactada drasticamente”, diz Amauri.
A discussão também considera o impacto nas comunidades periféricas. Helena destaca que a privatização poderia prejudicar a população preta e pobre, que muitas vezes vive nas periferias das grandes cidades. A entrega dos serviços a investidores privados, cujo foco é o lucro, poderia resultar em uma diminuição do atendimento a essas comunidades.
“Se a gente tem uma deterioração em termos de conhecimento técnico pode ser que tenha problemas com o futuro da qualidade da água. Com as populações periféricas sendo as primeiras e mais afetadas por isso.”
Veja abaixo gráficos elaborados pelo Ceper-USP em junho de 2020, a partir de dados do SNIS , demonstrando o status de cobertura de saneamento nos municípios paulistas naquele momento: