O presidente cubano Díaz-Canel, na presidência do G77, abriu os trabalhos da Cúpula em Havana | Foto: Cuba Debate

Contando atualmente com 134 Estados membros, representando dois terços da Organização das Nações Unidas (ONU) e 79% da população mundial, o G77+China fez importantes pronunciamentos nesta sexta e sábado (15 e 16) em defesa do desenvolvimento, da soberania e da democratização das relações internacionais, através do estabelecimento de um novo sistema de relações internacionais.

O encontro aberto pelo presidente cubano Miguel Díaz-Canel apontou que a humanidade enfrenta hoje uma crise de gigantescas proporções e consequências imprevisíveis, em que os efeitos negativos gerados pela aplicação de uma ordem econômica internacional injusta, potencializados pela pandemia da Covid-19, atingiram níveis assustadores.

Diante destes desafios, assinalou Díaz-Canel, é preciso “colocar o papel da ciência, da tecnologia e da inovação como componentes essenciais do desenvolvimento”. “As conquistas nesta matéria são o que nos permitirá avançar nos objetivos de desenvolvimento sustentável”, sublinhou.

O dirigente cubano condenou a injusta e antidemocrática arquitetura financeira global vigente, bem como os efeitos adversos das mudanças climáticas e da degradação ambiental. “O aumento dramático e simultâneo da riqueza e da pobreza extremas, o peso crescente da dívida externa e a fragilidade dos sistemas de saúde e de educação são alarmantes”, sublinhou.

“Cabe ao Sul mudar as regras do jogo. Com o direito que temos como a grande maioria do G77 e as principais vítimas da crise multidimensional que o mundo está sofrendo. Exigimos a democratização pendente do sistema de relações internacionais”, enfatizou.

Em sua intervenção, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, saudou Cuba, que “tem sido defensora de uma governança global mais justa e até hoje é vítima de um embargo econômico ilegal”. Para Lula, “o domínio tecnológico por um “punhado de economias ricas” é algo que precisa ser superado, pois é uma condição que “reedita a relação de dependência entre centro e periferia”.

BANCO MUNDIAL E FMI

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, reiterou a necessidade de modificar as condições financeiras que impõem organismos como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), com suas “lógicas ortodoxas” que levaram o mundo “a este estado de concentração de riqueza em uns poucos e a distribuição de pobreza em milhões de seres humanos”. “A primeira coisa que precisamos fazer é mudar o sistema financeiro internacional que segue operando com as mesmas lógicas de sempre”, disse​.

Fernández também condenou o FMI por aplicar sobretaxas às nações endividadas com os maiores empréstimos, situação que afeta países como o Equador, Barbados, Egito e o seu próprio país.

O líder argentino também questionou a Organização Mundial do Comércio (OMC), “que vê como os alimentos começam a ser objeto de especulação financeira e não faz nada, enquanto a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) anuncia uma fome de 400 milhões de seres humanos”. Por isso, conclamou, “os atores do Sul global devem fazer deste momento uma grande ferramenta, uma vez que os países centrais necessitam dos alimentos produzidos no nosso hemisfério”. É o momento de acabar com um “mundo dominante e um mundo dominado”, propõe, condenando o “vergonhoso bloqueio” a Cuba feito pelos Estados Unidos há mais de 60 anos.

ASCENSÃO COLETIVA

O enviado especial do presidente chinês Xi Jinping, Li Xi, assinalou os esforços de Cuba para unir as forças dos países em desenvolvimento para enfrentar e superar os desafios globais. Os mercados emergentes e os países em desenvolvimento, recordou, contribuíram com até 80% para o crescimento econômico global, com a cooperação Sul-Sul desempenhando um papel cada vez mais importante na dinâmica da ascensão coletiva.

Li Xi destacou que, como maior país em desenvolvimento e membro natural do Sul global, a China está disposta a trabalhar com o conjunto dos membros do G77 para abrir um novo capítulo em busca de maior solidariedade e desenvolvimento, numa etapa vantajosa para todos. “A China continua comprometida com a construção de um sistema de inovação tecnológica que seja aberto e inclusivo, para expandir os intercâmbios e a cooperação”, esclareceu.

SECRETÁRIO-GERAL DA ONU

O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, felicitou Cuba pelo sucesso na sua presidência do grupo e agradeceu a calorosa hospitalidade e recepção. Guterres lembrou que há quase 60 anos um grupo de nações se reuniu para assinar o documento fundador do G77, havendo a determinação de remediar “séculos de injustiça e negligência”.

Diante de um contexto global de pobreza e fome em ascensão, de preços em disparada e desastres climáticos cada vez mais frequentes, o secretário-geral avaliou que “a conclusão é clara: o mundo está falhando com os países em desenvolvimento”.

Citando exemplos de visão e compromisso coletivo, o representante das Nações Unidas felicitou Cuba pelo sucesso no desenvolvimento das suas vacinas contra a Covid, que não apenas serviram ao seu povo, mas também ajudaram milhões de outras vítimas da desigualdade e acesso às vacinas.

Ao referir-se à necessidade de aumentar os fundos públicos nos países menos desenvolvidos, o presidente da Colômbia, Gustavo Petro destacou que existem duas formas de aumentá-los: uma, como propõem os Estados Unidos e a Europa, nos endividando mais.

O vice-presidente da Bolívia, David Choquehuanca, defendeu que é “tempo de construir e reconstruir nosso caminho, desde nossas próprias raízes, pois somente desta forma a humanidade será livre. Do contrário, seguirá sendo submetida”. Dona de uma das maiores reservas de lítio do mundo, a Bolívia quer dar a sua contribuição para a construção de um novo tempo, virando a página de uma situação em que fomos submetidos como colônia e neocolônia.

CONTRA A OCUPAÇÃO DA PALESTINA

O presidente da Palestina, Mahmoud Abbas, propôs que se melhore o acervo de conhecimentos e capacidades no domínio do desenvolvimento científico e tecnológico, destacando a necessidade de maior coordenação e integração para superar desafios e avançar na satisfação das aspirações dos nossos países e povos. Em relação à ocupação israelense, Abbas frisou que “o povo palestino, com o apoio do Grupo dos 77 e da China, está determinado a superar a injustiça histórica que sufocou o seu desenvolvimento e impediu as suas aspirações ao longo de todo um século”.

O presidente de Angola, João Lourenço destacou que o agravamento das tensões e conflitos geopolíticos, a aplicação de medidas ou iniciativas coercitivas unilaterais, o aumento exponencial da pobreza extrema, o peso crescente da dívida externa e a fragilidade dos sistemas de saúde e educação, alimentação e a insegurança energética, e a exclusão digital que se expressa pela grave dificuldade de acesso à Internet, bem como os efeitos adversos das alterações climáticas e da degradação ambiental, entre outros, constituem sérios obstáculos ao progresso e representam uma séria ameaça à estabilidade dos nossos Estados. Por conta disso, os países em desenvolvimento não ficarão de braços cruzados à espera de soluções milagrosas para os problemas que enfrentam. Pelo contrário, “saberemos encontrar as soluções e estratégias que nos levarão à concretização da nossa agenda de desenvolvimento”.

Fonte: Papiro