Palácio de La Moneda, sede do governo chileno, sob bombardeio durante o golpe de 1973 | Foto: Arquivo

Documentos só agora revelados pelo governo dos Estados Unidos atestam que, além de estimular e financiar o sangrento golpe contra o presidente Salvador Allende, com a participação da CIA, o então presidente Nixon acompanhou de perto o desenrolar do golpe contra o líder popular chileno em 1970.

Dois trechos de relatórios divulgados nas últimas horas, vinculados ao golpe de Estado promovido pelos EUA contra a democracia e a soberania chilena, confirmam que a Casa Branca sabia de antemão os planos para a derrubada de Allende em setembro de 1973, quando o Palácio de La Moneda foi bombardeado. O material reforça a afirmação do conjunto de documentos já desclassificados com o título de “A opção extrema: derrubar Allende”, que inclui memorandos dos funcionários envolvidos, incluindo o então diretor da CIA, Richard Helms.

Conforme já havia sido estampado pelo documentário ‘El Diario de Agustín’, um dos instrumentos de propaganda contra o governo Allende foi o Mercúrio, maior jornal do país, que depois de uma reunião secreta do seu proprietário, Agustín Edwards Eastman, com o presidente Richard Nixon (1969-1974) recebeu US$ 2 milhões através de organizações ligadas à CIA.

Segundo o documentário, após sair da Casa Branca, o megaempresário se resguardou em Miami, retornando ao Chile assim que instalou o terrorismo de Estado que custou mais de três mil vidas, entre assassinatos e “desaparecidos” oposicionistas.

Ao aproximar-se o 50° aniversário do golpe, o Departamento de Estado publicou outro lote dos informes diários recebidos por Nixon elaborados pelos “serviços de inteligência” norte-americanos naquele momento sobre a situação no Chile.

No primeiro, de 8 de setembro de 1973, aponta para a proximidade da “possível tentativa de golpe” contra Allende, e o segundo já assinala que várias “unidades militares chave” estão apoiando a derrubada.

Os documentos avaliam que Allende considerava que seus apoiadores não possuíam armas suficientes para um enfrentamento e que estava “preocupado pelas pressões da oposição e, em especial, pelas intenções do Exército”. Os serviços de inteligência assinalaram a data e a hora em que os “setores chave” militares estariam no golpe, mas que estes poderiam não ter “um plano efetivo e coordenado para aproveitar a extensa oposição civil” ao governo chileno. “O presidente Allende, por sua parte, ainda tem esperanças de que postergar uma decisão evite o conflito”, conclui o relatório.

No mesmo 11 de setembro as Forças Armadas do Chile, sob o comando do general Augusto Pinochet, bombardearam o palácio de governo e mataram Allende, iniciando uma ditadura que durou 17 anos de servilismo aos Estados Unidos.

“BUSCA DA VERDADE”

“50 anos depois do golpe militar, a desclassificação dos arquivos desta documentação promove a busca da verdade e reforça o compromisso dos nossos países com os valores democráticos, porque a democracia é memória e é também o futuro”, afirmou a subsecretária de Relações Exteriores do Chile, Gloria de la Fuente, tentando borrar as evidências de que o papel dos EUA na América Latina foi exatamente na direção oposta, ou seja, de apoio aos golpes antidemocráticos.

A ministra do Interior, Carolina Tohá, ressaltou o significado da desclassificação dos arquivos. ​“O que estava acontecendo no Chile era visto como um fator estratégico para o planeta e nós como país temos, portanto, a obrigação baseada no que vivemos, de tirar lições, de aprender, de não repetir erros, de não repetir horrores como esses que ocorreu naquela época”, acrescentou.

“Esses documentos registram o objetivo deliberado das autoridades americanas de minar a capacidade de Allende para governar e de derrubá-lo para que não pudesse estabelecer um modelo bem-sucedido e atraente de mudança estrutural que outros países poderiam seguir”, declarou Peter Kornbluh, analista sênior encarregado do Chile no Arquivo de Segurança Nacional, uma ONG com sede em Washington que analisa os documentos desclassificados pelos EUA.

No dia 9 deste mês, a Câmara dos Deputados do Chile aprovou um pedido ao presidente Gabriel Boric para instruir o Ministério das Relações Exteriores a tomar medidas para acessar a história secreta dos Estados Unidos sobre a sua intervenção antes e durante o golpe. A exigência, promovida por parlamentares da Convergência Social (oficialista), foi aprovada por ampla maioria, com 125 votos a favor, dois contra e sete abstenções.

Fonte: Papiro