'Mercado de órgãos' de Milei seria um sinistro leilão entre os mais ricos | Foto: Luis Robayo/AFP

Embora a candidatura de Javier Milei lembre de todo jeito o remake de um filme ruim já visto no Brasil, parece que o autodenominado líder “antissistema” portenho não tem poupado esforços para superar seus ídolos Bolsonaro e Trump, como faz ao propor a liberação da compra e venda de órgãos humanos na Argentina, segundo ele, “solução de mercado” para os transplantes no país.

No ano passado, Milei já havia defendido a sinistra proposição, sob o argumento de que a venda de órgãos humanos “é só mais um mercado”, o que teve, como registrou o jornal argentino Página 12, amplo repúdio da comunidade médica e da sociedade em geral.

Em maio, em entrevista à TN, Milei retomou a proposta, buscando ‘sustentá-la’ com uma “lógica macabra”, segundo a descrição do Página 12.

“Quantas pessoas morrem na Argentina por ano? Mais de 350 mil que, pela Lei Faustina, são todos potenciais doadores. São 7.500 pessoas que estão sofrendo e esperando por transplantes. Então tem alguma coisa que não está funcionando bem ”, asseverou Milei, embora com um erro: a moça que deu nome à lei chamava-se Justina.

“Vamos procurar um mecanismo de mercado para resolver esse problema”, recomendou o chicago-boy que virou candidato, como se o “mercado” não fosse por razões óbvias funcionar a favor dos endinheirados, e os pobres que precisassem de um transplante, como diria o impoluto deputado Justo Verissimo, “que se explodam”.

Além disso, como observou o Página 12, Milei não considerou as variáveis que existem no processo, “como a falta de compatibilidade de órgãos, a possibilidade de todos os falecidos não estarem em condições de serem doadores ou de seus familiares expressarem o contrário ao decidir sobre o corpo”.

Como registrou o Página 12, o remédio que Milei oferece não se aplica em nenhum lugar do mundo. “Não há país onde os transplantes sejam um mercado”, destacou Carlos Soratti, presidente do Incucai, órgão estadual responsável pelos transplantes.

“Essas propostas exóticas, que já eram feitas há um século, hoje são absurdas. Essa questão remonta a um século, do debate bioético que desenvolveu a história do transplante de órgãos no início do século 20”, disse o especialista.

Para o fascista Milei, a fila dos transplantes não anda porque “a garra do Estado” (seu cavalo de batalha) não quer. Se não fosse assim, acrescentou, “ninguém precisaria vender nada”.

“Se você tem 350.000 doadores por lei, então o problema é porque (os órgãos) não chegam. Não chegam porque há pessoas que se beneficiam com isso não acontecer”, disse sem apresentar uma única prova disso.

Na entrevista com a TN, Milei foi questionado sobre tal matemática que desumaniza um problema social. Ele recorreu à sua falácia preferida, que consiste em exagerar e distorcer a ideia que o contradiz. “Por que você concorda que 7.500 pessoas sofrem quando há 350.000 doadores em potencial por ano?”, perguntou.

“O que estou dizendo é que as coisas como estão não funcionam” e buscar uma solução de mercado como a compra e venda de órgãos “não é pior” para aliviar o déficit, insistiu. “Não há solução pior do que aquela que implica a garra do Estado. O melhor é sempre os indivíduos agirem livremente”, alegou.

Em suma, quem tem um rim, que se cuide, pois Milei quer liberar o cartel dos transplantes regido pelo “mercado”, e ainda tem o risco de que, aproveitando o ensejo, o tráfico de órgãos floresça.

Fonte: Papiro