Tarcísio elogia operação com 8 mortes, sob críticas à “vingança” policial
Governador se diz “extremamente satisfeito” com operação da polícia na Baixada Santista, mas parlamentares e ouvidoria criticam a escalada de violência contra as comunidades
A Vila Baiana, no Guarujá (SP), que se encontra sitiada pela polícia na Operação Escudo.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), elogiou a operação policial feita na Baixada Santista, desde sexta-feira (28), após a morte de um policial de rondas ostensivas. A operação é vista como uma vingança dos policiais contra moradores da região, por ter resultado na chacina de, pelo menos, oito pessoas. Os moradores também relatam anúncios de futuras novas mortes pelos próprios policiais que sitiam as comunidades.
O secretário da Segurança, Guilherme Derrite, afirmou que quatro suspeitos da participação na morte do policial já foram identificados, sendo que dois deles estão presos. Um dos apontados como responsável pela morte do soldado Patrick Bastos Reis foi preso, neste domingo (30), em São Paulo. Erickson David da Silva, gravou um vídeo pedindo para que o governador e o secretário de segurança do Estado, Guilherme Derrite, parem com a “matança” de inocentes em Guarujá. A Ouvidoria das Polícias de SP fala em ao menos dez pessoas mortas para encontrar o suspeito.
“Diversos órgãos de Direitos Humanos e movimentos sociais vêm relatando uma série de possíveis violações de direitos na região, à margem da legalidade, com indicativos de execução, tortura e outros ilícitos nas ações policiais na região, por ocasião da referida operação. A morte violenta do soldado PM e dos civis são inaceitáveis. Nada, nem nenhuma assimetria se justifica quando se clama por justiça e segurança para todos”, disse, em nota, o ouvidor da Polícia Claudio Silva.
Segundo ele, os relatos de moradores da região preocupam, ensejando ações de acompanhamento e prevenção por mecanismos de proteção de Direitos Humanos, no controle da atividade estatal. O ouvidor ressalta que, historicamente, a região da Baixada Santista tem indicadores preocupantes no que diz respeito à segurança pública e à proteção de direitos, com altos índices de letalidade e vitimização policial.
Justificativas
Assim como, em 2012, após chacina semelhante, o governador Geraldo Alckmin afirmou que “quem não reagiu está vivo”, Tarcísio disse que “aqueles que resolveram se entregar à polícia foram presos, foram apresentados à Justiça”. “A polícia quer evitar o confronto de toda forma, ninguém quer o confronto. Agora, nós temos uma polícia treinada e que segue à risca a regra de engajamento”, disse Tarcísio.
“Nós vamos investigar, nós vamos prender, nós vamos apresentar à justiça, nós vamos levar ao banco dos réus. Foi isso exatamente que foi feito neste final de semana. Eu estou extremamente satisfeito com a ação da polícia, extremamente triste com o que aconteceu porque nada vai trazer um pai de família de volta”, disse o governador, durante entrevista coletiva.
O Ministério Público de São Paulo vai instaurar nesta segunda-feira procedimento para analisar a operação policial. Dois promotores do Gaesp (Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial) vão acompanhar as investigações das mortes cometidas pelos policiais.
Em nota, a Defensoria Pública de São Paulo afirmou que foi acionada pela Ouvidoria das Polícias acompanha a operação policial por meio do Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos.
Violência prometida
Segundo a Ouvidoria das polícias de SP, o homem morto na sexta seria um vendedor ambulante, atingido por 9 tiros na sexta (28). A família dele teria encontrado o rapaz com queimaduras de cigarro e um corte no braço.
O ouvidor Claudio Aparecido da Silva afirmou em entrevistas que moradores do Guarujá relataram que policiais torturaram e mataram um homem e prometeram matar ao menos 60 pessoas em comunidades da cidade. O número de mortes pode ser ainda maior, de acordo com ele.
O ouvidor ainda disse que a Polícia Militar tem dito que atua com câmeras corporais. Diante disso, vai pedir essas imagens para que nada fique escondido e se possa verificar, através das imagens, se houve ou não ilegalidades nas ações da polícia naquele território.
Vingança
As reações negativas à operação também têm vindo da política. A presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, deputada Luizianne Lins (PT-CE) lamentou a “chacina” e comparou o ocorrido com a chacina do bairro Curió, em Fortaleza.
“O modus operandi é muito semelhante e o suposto motivo também: vingança. Só agora os acusados pela chacina do Curió estão sendo julgados. Também esperamos justiça para as famílias das vítimas do Guarujá”, disse a parlamentar.
O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que antecedeu Luizianne na mesa da Comissão, considerou o episódio grave. “A suspeita é que se trata de vingança pelo assassinato de um PM”. Para ele, é inadmissível que agentes que deveriam proteger a sociedade, “pratiquem verdadeiras chacinas à margem do processo e da lei”.
Ele também mencionou a naturalização com que estes extermínios são praticados, perpetuando a violência em comunidades pobres.
“No trágico maio de 2006, sob a mesma alegação, policiais e grupos de extermínio vitimaram 600 pessoas no estado. Apresentei o PL das Mães de Maio, que prevê o dever de reparação estatal às famílias de vítimas da violência policial”, completou.
A deputada Luiza Erundina (PSol-SP) pontuou as irregularidades da operação para qualificar como chacina. “10 pessoas morreram numa ação policial que envolveu tortura, falso flagrante, invasão de propriedade e outras medidas autoritárias. É inadmissível algo dessa natureza enquanto que o governador se diz “satisfeito”.
O deputado Marcio Jerry (PCdoB-MA) criticou o governador ao dizer que não se trata de “disputa de narrativa”. “Trata-se de um fato gravíssimo, que precisa de rigorosa apuração”, afirmou.
(por Cezar Xavier)