Para 81%, há racismo no Brasil, mas só 11% admitem ter atitudes racistas
As desigualdades e contradições que marcam a história brasileira estão claramente presentes em pesquisa que se debruçou sobre a percepção da população a respeito do racismo. Se por um lado, 81% concordam que o Brasil é racista, por outro apenas 11% reconhecem ter atitudes discriminatórias em relação à raça.
Os dados foram colhidos pela pesquisa “Percepções sobre o racismo no Brasil”, realizada pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), sob encomenda do Instituto de Referência Negra Peregum e do Projeto Seta (Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista).
De acordo com o levantamento, do total de 81% que afirmam ser o Brasil um país racista, 60% concordam totalmente e outros 21% enxergam parcialmente desta forma. Do lado oposto, 5% discordam parcialmente e 11% totalmente. Além disso, 51% dizem já ter presenciado alguma situação de racismo, mas apenas 11% admitem ter comportamento racista e 46% afirmam conviver com quem sofre racismo.
Como apontou o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), um dos mais atuantes na luta contra a discriminação, “no Brasil, o racista é sempre o outro”. Para Márcio Black, coordenador de projetos do Instituto de Referência Negra Peregum, “o que aparece aqui é que os brasileiros são incapazes de reconhecer como o racismo se materializa na rotina, no dia a dia, que é uma dimensão individual, e também nos espaços em que circulam, tanto públicos como privados, que têm uma dimensão coletiva”.
Gerador de desigualdades
Vale destacar ainda que, segundo a pesquisa, 44% da população encara o racismo como o principal gerador de desigualdade; outros 29% apontam a classe social; 7% o local de moradia; 6% o gênero ou o sexo; 5% a orientação sexual e 2% o local de nascimento.
Para a grande maioria, 96%, as pessoas pretas são as que mais sofrem discriminação, seguidas dos povos indígenas, com 57%. Na avaliação dos entrevistados, a principal manifestação de racismo no país se dá pela violência verbal (66%), seguida de tratamento desigual (42%), violência física (39%) e negação de oportunidades (28%), entre outros fatores.
Também é importante ressaltar a percepção quanto à postura da polícia e a criminalização da população negra: 71% das pessoas concordam totalmente que há diferença no tratamento por parte da polícia em relação a negros e brancos. Para 63%, a abordagem policial é baseada na cor da pele, no tipo de cabelo e de vestimenta e 76% acreditam que as pessoas negras são mais criminalizadas.
Além disso, 88% acreditam que a população negra é a mais criminalizada. Quanto à necessidade de criminalização do racismo, 57% concordam totalmente e 24% discordam totalmente.
Segundo Ana Paula Brandão, gestora do Projeto Seta e diretora programática na ActionAid, “esses dados escancaram o racismo no Brasil, e demonstram que a população em geral reconhece o racismo em uma das suas faces mais cruéis: a violência institucional, no caso específico, a policial. De forma prática, ela é reflexo do racismo que estrutura nossas instituições, da maneira como naturalizamos a violência contra as pessoas negras e as pessoas moradoras das periferias – cuja maioria é negra”.
O Instituto de Referência Negra Peregum ressalta que “é nítido como a dimensão interpessoal permanece sendo a principal forma de identificação das práticas racistas e há um desafio, a partir dessa coleta de dados, em incidir culturalmente para ampliar a compreensão da manifestação do racismo por vias institucionais, estruturais e sistêmicas”.
O estudo teve abrangência nacional e ouviu de 2 mil pessoas. Os dados foram coletados presencialmente pelo Ipec em 127 municípios das cinco regiões no período de 14 a 18 de abril de 2023, considerando-se participantes com 16 ou mais anos de idade. Para ler a íntegra da pesquisa, clique aqui.