Jenin sob ataque da ocupação israelense | Foto: Jaafar Ashtiyeh/AFP

As forças de ocupação israelenses mataram pelo menos oito palestinos – três deles, adolescentes – e feriram mais de 50 na segunda-feira (3), na maior incursão em 20 anos a cidade Jenin, na Palestina, com centenas de soldados e bombardeio com mísseis e drones. Em um incidente separado, um nono palestino foi morto a tiros por soldados israelenses perto de Ramallah.

A cidade de Jenin foi construída em torno de um dos campos de refugiados palestinos que tiveram que abandonar seus lares quando da implantação de Israel que se deu em paralelo a ações terroristas para realizar uma limpeza étnica do povo palestino no que viria a ser o idealizado Estado Judeu, em 1948.

A Autoridade Palestina classificou o ataque de “crime de guerra” e a matança foi repudiada veementemente pela Liga Árabe e pela Organização de Cooperação Islâmica. Egito, Jordânia, Emirados Árabes e Turquia também condenaram. Já a Casa Branca deu aval à matança em Jenin como “direito de defesa” de Israel.

O enviado da ONU, Tor Wennesland, pediu a “desescalada” e a “proteção da população civil”. Segundo o mais recente relato da Al Jazeera, a razia se estendeu por 20 horas e novos ataques são relatados.

O repórter Alan Fisher, da Al Jazeera, relatou que o ar está ficando pesado com a fumaça enquanto os protestos continuam, com uma dúzia de jovens jogando pedras nos israelenses. Também houve uma grande explosão perto da mesquita. Enquanto Israel diz que a operação não tem “hora para acabar”, o campo teve água e energia elétrica cortadas e até mesquitas foram profanadas.

Com o governo Netanyahu enfrentando os maiores protestos internos em décadas, o regime tem procurado restaurar o agora fraturado consenso judaico em torno do establishment israelense, para isso a coligação supremacista que se reuniu em torno de Netanyahu aposta na incitação à guerra contra o Irã e na promoção do supremacismo judaico, intensificando o roubo de terra alheia na Cisjordânia e o recurso a pogroms contra os palestinos, junto com a presente ação militar no território palestino.

Moradores de Jenin disseram à CNN que ouviram explosões e tiros pesados na área, enquanto o vídeo da cena mostrava palestinos feridos sendo evacuados de ambulância para o Hospital Governamental de Jenin. Fontes palestinas acusaram as forças israelenses de bloquear os médicos que tentam socorrer os feridos.

Dos feridos, 10 estão “em estado grave”, disse o Ministério da Saúde palestino no início da tarde de segunda-feira. Os ferimentos na maioria são “graves e na parte superior do corpo”, apontou Mahmoud al-Saadi, diretor do Crescente Vermelho Palestino no campo.

Os mortos de Jenin são Nour el-Din Husam Marshoud, 16; Majdi Ararawi, 17; Ali Hani al-Ghoul,17; Husam Mohammad Abu Theeba, 18; Aws Hani Hanoun, 19; Sameeh Firas Abu al-Wafa, 20; Ahmad Mohammad Amer, 21; e Mohammad Muhannad al-Shami, 23. O palestino morto em Ramallah, e Mohammad Imad Hasanein, 21.

“NOVO CRIME DE GUERRA”

O presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, condenou a operação militar israelense em larga escala, chamando-a de “um novo crime de guerra”.

“Segurança e estabilidade não serão alcançadas na região a menos que nosso povo palestino sinta isso. O que o governo de ocupação israelense está fazendo na cidade de Jenin e seu acampamento é um novo crime de guerra contra nosso povo indefeso”, disse ele, segundo o porta-voz presidencial Nabil Abu Rudeineh.

Por sua parte, Netanyahu garantiu que a operação “Lugar e Jardim” continuará pelo tempo “que seja necessário”. “Nossas forças entraram em Jenin para fazer frente a terroristas”, acrescentou, justificando o massacre que desencadeou. O ataque ocorre menos de duas semanas depois que um ataque militar israelense em Jenin deixou cinco palestinos mortos e dezenas de feridos

A Organização de Cooperação Islâmica (OIC), que congrega 57 países de fé islâmica, condenou a operação israelense, chamando-a de “crime hediondo”, que constitui “uma extensão dos crimes e do terrorismo organizado de estado praticado pela ocupação israelense contra o povo palestino”.

O Egito também condenou a incursão israelense, chamando-a de ato de “agressão”.“A República Árabe do Egito condena com as palavras mais fortes a agressão conduzida pelas forças israelenses na cidade de Jenin, na Cisjordânia ocupada”, manifestou o Cairo no Twitter.

“Estamos profundamente preocupados que, com esses ataques, a tensão atual na região possa desencadear uma nova espiral de violência”, disse o Ministério das Relações Exteriores da Turquia em um comunicado que pediu a Israel que suspenda a campanha militar.

Os Emirados Árabes Unidos enfatizaram a necessidade de “interromper imediatamente as repetidas e crescentes campanhas contra o povo palestino” para cumprir as disposições do direito internacional e as resoluções do Conselho de Segurança.

Daniel Levy, um ex-negociador do governo israelense com os palestinos que agora é presidente do think tank US/Middle East Project, disse que o ataque a Jenin é “parte integrante da violência estrutural da ocupação”. “Não há nada que tenha precipitado isso imediatamente”, disse ele à Al Jazeera de Londres.

Levy disse que a ofensiva militar do governo de extrema direita de Israel demonstrou “a continuação de uma escalada” que remontava aos governos israelenses anteriores. “O que é um pouco diferente aqui, talvez, é que este governo está testando a água apenas para garantir – dado o quão extremo o mundo o considera – se ainda terá impunidade de seus aliados” no Ocidente e na região, ele advertiu.

TIROS NOS JORNALISTAS

A TV Al Arabya denunciou que seus correspondentes foram alvejados a tiros pelos israelenses em Jenin.

Um vídeo mostrou a câmera e o dispositivo de transmissão ardendo, enquanto o jornalista Ameed Shehadeh relatou que os israelenses atingiram a câmera com 10 tiros. Ele e mais quatro jornalistas ficaram encurralados em uma casa até serem evacuados por uma ambulância do Crescente Vermelho.

Shehadeh chamou a situação no campo de “um horror real”. Ele postou ainda que viu “homens batendo suas cabeças contra as paredes porque não tinham nada com que defender suas famílias e crianças. Crianças e mulheres choravam incessantemente, e as balas do exército de ocupação choviam por todo lado”.

O prefeito de Jenin, Nidal Obeidi, denunciou que o ataque israelense é um “verdadeiro massacre e uma tentativa de acabar com todos os aspectos da vida dentro da cidade e do campo”. O que está acontecendo agora – destacou – “é a destruição total da infraestrutura do campo. O que está sendo visado inclui as linhas principais de água, o sistema de esgoto, bem como as caixas d’água nos telhados”.

Haifa Abu Sariya, uma mãe de três filhos de 34 anos, disse que [os soldados israelenses] “acabaram de lançar um míssil em direção à casa de nossos vizinhos, que fica a cerca de 10 metros de distância de nós”.

“Hoje acordamos com sons de bombardeio aéreo por volta de 1h15. … Embora estejamos acostumados com esse clima tenso, desta vez o bombardeio foi tão alto que meus filhos taparam os ouvidos o tempo todo. Minha filhinha estava chorando e tremendo com os sons”, ela acrescentou.

Mohammed Jabareen, morador de 55 anos do campo de refugiados de Jenin, disse que dois de seus filhos ficaram feridos na última rodada de bombardeio aéreo. O pai de cinco filhos teve um filho que foi morto pelas forças israelenses em janeiro. Ele se lembra de estar sentado perto do túmulo de seu filho por volta da 1h da manhã, quando um caça israelense “passou por nós e atacou uma área próxima”.

“Saí correndo para ver o que havia acontecido e encontrei três jovens feridos. Nós os levamos para o hospital e ficamos dentro do campo de refugiados. Não podíamos sair porque soldados israelenses entraram e cercaram todo o acampamento”, disse Jabareen à Al Jazeera.

O líder comunitário palestino Jalal Abu Khater disse que o que está acontecendo em Jenin repercute em todos os territórios ocupados e cercados. “É uma situação muito intensa e que temos testemunhado no último um ano e meio. Raids constantes, matanças, massacres prolongados de palestinos – isso tudo vem acontecendo sem parar”.

Jenin tem “um valor muito simbólico por resistir à ocupação” na margem ocidental, ele destacou. “Israel quis esmagar este valor simbólico nos últimos dois anos… o sistema de opressão… Com que os palestinos se defrontam em toda a terra”, ele disse. “O que acontece na margem ocidental está sempre interconectado com o que acontece em Jerusalém e também com os palestinos… Que mantêm cidadania israelense e aqueles que vivem sob o cerco draconiano na Faixa de Gaza”.

Fonte: Papiro