Burguesia já está apaixonada pela inteligência artificial
O jovem empresário indiano Suumit Shah, fundador e diretor-executivo da Dukaan, não conseguiu esconder a alegria após substituir 90% de seus funcionários por um chatbot de inteligência artificial (IA). Os trabalhadores demitidos estavam empregados no serviço de atendimento ao consumidor (SAC) da empresa, que atua no comércio eletrônico.
Em maio, a nova edição do Relatório sobre o Futuro dos Trabalhos, do Fórum Econômico Mundial, já advertia que, devido às novas tecnologias – e, sobretudo, à inteligência artificial –, muitos empregos estavam com os dias contados. O estudo destacava que o atendimento presencial ao cliente – em agências bancárias, postos dos Correios, supermercado e lojas – era um dos serviços mais ameaçados.
A demanda para caixas de bancos, funcionários relacionados e atendentes de serviços postais cairá 40% em cinco anos, dizia o Relatório. Para operadores de caixa de supermercado e outros tipos de varejo, a queda será de 37%. Um relatório do Goldman Sachs, também de maio, sugere que, em breve, a inteligência artificial substituirá 300 milhões de empregos em tempo integral.
Pois Suumit Shah mostrou – e celebrou – o fato de que esse futuro de incógnitas pode estar ainda mais próximo. Alçado de pronto a novo guru do capitalismo parasita do século 21, o indiano, de 31 anos, começou a distribuir lições de gestão no Twiiter.
“Dado o estado da economia, as startups estão priorizando a lucratividade em vez de tentar se tornar ‘unicórnios’, e nós também”, teorizou. “Na era da gratificação instantânea, começar um negócio não é mais um sonho distante. Com a ideia certa, a equipe certa, qualquer um pode transformar os seus sonhos empresariais em realidade.”
A inteligência artificial é capaz de responder, de forma ágil e confiável, a uma série de tarefas rotineiras, sobretudo aquelas que demandam opções mais ou menos delimitadas e previsíveis. Quem já precisou usar um aplicativo para pedir a segunda via de alguma fatura, por exemplo, sabe o quanto esse procedimento se tornou prático. Porém, conforme se eleva a complexidade do serviço, o trabalho humano se torna menos substituível.
Novos paradigmas no mundo do trabalho costumam ceifar determinadas modalidades de empregos, mas também criam outras. O sonho capitalista do trabalho sem trabalhador segue absolutamente fora de cogitação. Mas o que causa estupor nas mensagens de Suumit Shah é a falta de sensibilidade pela demissão em massa, somada a uma certa ridicularização da antiga equipe.
À CNN, o executivo declarou que o chatbot, construído em apenas dois dias, respondia às consultas iniciais dos clientes de modo instantâneo, enquanto os funcionários demitidos demoravam, em média, 1 minuto e 44 segundos para responder a essas consultas. A resolução completa do problema apresentado pelo cliente teria caído 98% com o chatbot. Por isso, segundo ele, as demissões foram “difíceis”, mas “necessárias”, embora sua efusão não tenha passado nenhuma impressão de dificuldade em tomar a medida.
A BBC listou reações de internautas aos tuítes de Suumit Shah. Para um deles, falou “nenhuma menção ao fato de 90% dos funcionários terem sido demitidos. Que assistência eles receberam?”. Outro internauta acrescentou: “Talvez tenha sido a decisão certa para o negócio, mas não deveria ter se tornado um tópico de comemoração/marketing”. Um terceiro emendou: “Provavelmente houve demissões porque os negócios estão falindo e o financiamento está seco. Não por causa da IA”.
Para todos os efeitos, se a burguesia já está apaixonada pela inteligência artificial, não é bom sinal para os trabalhadores. Muitos setores do movimento sindical terão de adotar o combate às demissões como uma nova prioridade de luta. Os funcionários rifados sumariamente da Dukaan deixam o alerta no ar.