Christian Lindner, ministro das Finanças da Alemanha | Foto: Eric Piermont/AFP

Por causa dos “gastos não planejados” na Ucrânia, a UE está ficando sem dinheiro, segundo a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, registrou a edição alemã da RT no sábado (1º).

Admissão que confirma declaração anterior do ministro das Finanças alemão, Christian Lindner, alegando que Berlim não tinha como prestar apoio financeiro adicional ao orçamento da União Europeia, porque está tendo que contar tostões, conforme registrou o portal Sputnik.

De acordo com Lindner, bilhões de euros em apoio militar, econômico e financeiro direto para a Ucrânia e mais bilhões fornecidos através de instituições da UE esgotaram completamente o orçamento alemão.

“Tendo em vista os cortes necessários no nosso próprio orçamento nacional, não podemos atualmente fazer quaisquer contribuições adicionais para o orçamento da União Europeia”, disse Lindner em uma entrevista ao portal Welt.

As observações do ministro das Finanças vêm na sequência de queixas da Comissão Europeia de que a ajuda à Ucrânia “esgotou ao máximo” o orçamento do bloco de longo prazo 2021-2027, sugerindo que a Alemanha e outras grandes economias da UE devam contribuir para compensar a diferença.

De acordo com o Instituto Kiel para a Economia Mundial, a Alemanha forneceu cerca de € 4,24 bilhões em ajuda militar, € 1,74 bilhões em ajuda econômica e € 1,3 bilhão em ajuda financeira à Ucrânia entre janeiro de 2022 e fevereiro de 2023. Já as instituições da União Europeia, nas quais Berlim contribui muito, se comprometeram a entregar € 3,6 bilhões em ajuda militar, € 1,61 bilhão em ajuda humanitária e € 30,32 bilhões em assistência financeira a Kiev durante o mesmo período.

A Alemanha está em terceiro lugar – atrás apenas dos Estados Unidos e do Reino Unido – em termos de apoio militar e econômico total à Ucrânia.

SANÇÕES E RECESSÃO

Por outro lado, para a economia alemã a consequência da decisão de Berlim de seguir caninamente as sanções dos EUA contra a Rússia – ou seja, trocar o gás russo barato por gás de fracking norte-americano caro, minando a indústria alemã – é empurrar a principal potência industrial europeia para a recessão.

O PIB alemão contraiu nos primeiros três meses deste ano pelo segundo trimestre consecutivo, constatando-se, portanto, uma recessão, de acordo com o bureau alemão de estatística, Destatis.

A agência atribui isso a um aumento persistente nos preços e a uma diminuição nos gastos do consumidor. O fato de a Alemanha estar em recessão também significa problemas para a zona do euro e para a União Européia em geral, que dependem enormemente do motor das vastas indústrias do país.

Lindner e seu partido liberal-democrático argumentam que a Alemanha não tem outra escolha a não ser cortar custos: ele previu um déficit de € 30 bilhões em receitas fiscais nos próximos anos, já que a economia sofre as consequências da guerra na Ucrânia, incluindo preços de energia mais altos e taxas de investimento menores. A chegada da recessão significa ainda que o governo não tem motivos para esperar que a receita tributária possa aumentar novamente em breve.

DESPESA COM JUROS MULTIPLICADA POR 10

Outro grande problema é o aumento das taxas de juros, que estão consumindo a folga financeira restante: em comparação com 2021, quando a Alemanha teve que pagar apenas € 3,9 bilhões em juros por sua dívida, essas despesas devem chegar a € 39,9 bilhões este ano – um aumento de dez vezes.

Novos problemas surgem, no entanto, sobre os cortes orçamentários planejados: como a Bloomberg informou, Scholz e Lindner planejam fechar uma lacuna financeira de € 20 bilhões no orçamento da Alemanha para 2024 com cortes de gastos em todos os ministérios, exceto defesa.

Por sua vez, o vice-chanceler e ministro da Economia de Scholz, o Verde Robert Habeck, alertou que era “a primeira vez em muitos anos que o orçamento federal está ficando menor e… é claro, todo o sistema não está sintonizado com isso”.

A última vez que Berlim tivera que tomar decisões tão duras de corte orçamentário foi em 2014, após a crise financeira global e em plena crise do euro, e a chamada Grande Coalisão compreendia os social-democratas e o conservador CDU/CSU de Angela Merkel

Desde a formação do governo de três vias [coalizão Semáforo] em 2021, Scholz conseguiu resolver disputas de financiamento criando fundos especiais que estão fora do orçamento regular, incluindo um controverso pote de € 200 bilhões em dinheiro para reduzir os preços de gás e energia para cidadãos e empresas, como bem como um fundo climático de € 60 bilhões para ajudar a atingir as metas ambientais.

Mas esses chamados orçamentos-sombra atingiram um tamanho considerável, que os partidos relutam em aumentar – chegando a colossais € 360 bilhões no ano passado, ou 75% do orçamento regular deste ano de € 476 bilhões (os fundos especiais serão pagos ao longo de vários anos, no entanto).

FANTASMA DA DESINDUSTRIALIZAÇÃO

Com tudo isso, a ameaça de “desindustrialização da Alemanha” tomou as manchetes da imprensa especializada, diante da perda de competitividade nas indústrias intensivas de energia, ao ter de usar energia bem mais cara, em meio à transição para as energias limpas, em paralelo às pressões de Washington para atrair para os EUA setores da indústria alemã.

Um sintoma disso é que, de acordo com um estudo do Instituto Econômico Alemão (IW), que o Handelsblatt noticiou na semana passada, ao longo de 2022 saiu da Alemanha um investimento direto líquido de US$ 132 bilhões. Isso significa que os investimentos externos na Alemanha foram menores nesse valor do que os investimentos de empresas alemãs e capital alemão no exterior. Foi a maior saída de capital entre os 46 países incluídos no estudo.

Outro dado são as insolvências corporativas, que aumentaram 16,2% em comparação com o primeiro semestre de 2022, segundo a agência de crédito Creditreform. Este é o maior aumento percentual desde 2002, e novos aumentos são esperados.

“Os enormes encargos de custos causados pelos preços de energia e materiais que são muito altos estão tendo um efeito”, disse o chefe de pesquisa econômica da empresa, Patrik-Ludwig Hantzsch. A Creditreform, cuja principal atividade é a cobrança de dívidas, tem acesso aos desenvolvimentos antes do que o Destatis.

“A inflação desestabiliza os consumidores e desacelera significativamente o ânimo de compra”, explicou Hantzsch. A inflação voltou a subir de 6,1% para 6,4%, sendo que a inflação alimentar ultrapassa 14%.

Em comparação com o mesmo mês do ano passado, o setor de varejo registrou uma queda real nas vendas de 3,6% e um aumento nominal de 2,8%. A diferença significativa entre os resultados nominais e reais reflete o aumento significativo nos níveis de preços no varejo. No varejo alimentar, em particular, a diferença entre as vendas nominais e reais está aumentando.

Fonte: Papiro