Rússia escapa de derrota estratégica e pode partir para “vitória total”
Ainda é difícil para as manchetes da imprensa internacional admitirem a dimensão do que aconteceu neste sábado (24) no sudoeste da Rússia. Após o alarde em torno da revolta liderada por Yevgeny V. Prigozhin, o chefe do grupo mercenário Wagner, contra a liderança militar russa, o dia terminou com seu recuo, encerrando hostilidades e seguindo em exílio para a Bielorrússia, enquanto as colunas de combatentes Wagner deixavam Rostov-on-Don. O domingo amanheceu com as cúpulas douradas do Kremlin brilhando como nunca.
Baixada a poeira do sábado turbulento, a reportagem consultou o jornalista Wevergton Brito, vice-presidente nacional do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade ao Povos e Luta pela Paz) para uma avaliação sobre os efeitos de um dia que prometia festas e fogos de artifício em países aliados da OTAN.
O analista internacional resume o que viu como uma oportunidade para o presidente russo Vladimir Putin, que escapou de uma derrota estratégica e pode infringir uma derrota total ao ucraniano Volodimir Zelensky. “Acaba que Putin sai com um capital muito grande. E, se no desenrolar dos próximos dias, a situação conseguir se estabilizar, a Rússia pode partir para uma vitória total. Pode ter sido um tiro no pé”, afirma ele.
A explicação do argumento de Wevergton parte do princípio que houve coordenação de um amplo movimento para garantir uma derrota política, militar e talvez desencadear um movimento popular contra Putin. Conforme as informações foram sendo divulgadas, ficou evidente, para ele, a coordenação de inteligência dos EUA e da Otan (a aliança militar do Atlântico Norte) para todo este movimento.
O jornal The New York Times afirma que oficiais de segurança nacional dos EUA tinham indicações já na quarta-feira (21) de que Prigojin estava se preparando para uma ação militar contra altos funcionários da defesa russa.
“Esse movimento do chefe da Wagner, Prigozhin, com os EUA, coordenado com a maior atividade da contraofensiva ucraniana que foi desencadeada, ontem, em diversas direções, e que foi repelida, não foi coincidência. Foi, talvez, o maior movimento de contraofensiva, desde o início da guerra, e coordenada com o início de uma rebelião que marcharia sobre Moscou para desestabilizar toda a linha de comando, e que causaria uma derrota fundamental e estratégica”, descreve ele.
Fragilidade ucraniana
“Eu diria que, ontem, a Rússia escapou de uma derrota estratégica e pode avançar para uma vitória total, a partir deste momento, se o Putin conseguir estabilizar totalmente a situação”, apostou.
Em sua opinião, a Ucrânia demonstrou uma grande fragilidade militar ao não conseguir vitória na sua contraofensiva, mesmo diante de uma crise política interna séria de Putin, com rebelião armada. “Nem assim a Ucrânia conseguiu avançar nos movimentos que fez. Isso revela, por outro lado, que a grande maioria do comando das Forças Armadas russas é leal a Putin”, afirma.
A fracassada rebelião revela também, de acordo com o analista, que existe uma grande unidade no campo político em torno de Putin.
“Prigojin só não seguiu adiante em seu plano, porque viu que ia ser derrotado. Existem informações de que unidades da Wagner se recusaram a participar”, informa o jornalista, que acompanhou intensamente os desdobramentos do noticiário internacional no sábado.
Wevergton também destaca que em meio a toda esta crise, Putin repeliu uma maciça invasão anunciada pelo próprio Ministério da Defesa ucraniana, que disse que estava iniciando o maior movimento de tropas ucranianas, desde o início da guerra. Como depois não se falou mais no assunto, o silêncio ensurdecedor demonstra o fracasso da operação.
“Esse capital do Putin, junto com as vitórias que conseguiu ontem, demonstram o fracasso de Zelensky”, observa. O analista diz isso, apesar de toda a imprensa americana tentar minimizar o desastre, focando numa suposta perda de autoridade e prestígio de Putin com a rebelião Wagner.
Golpe de estado contra Putin
Na opinião do dirigente da Cebrapaz, muitos detalhes do que aconteceu ainda devem ser revelados nos próximos dias. Especialmente sobre os destinos do grupo Wagner, e seus 20 mil combatentes, que podem vir a se submeter ao comando do Ministério da Defesa russo, algo que sempre recusaram, ou desmantelar-se com o exílio do seu fundador.
“Mas já fica claro que, ao tomar as instalações militares de Rostov-do-Don sem resistência, como as próprias agências russas noticiaram, o grupo Wagner expôs que existe algum problema nas Forças Armadas russas em relação a Putin”, admite ele.
Segundo ele, existem setores das Forças Armadas russas que concordam com as críticas de Prigojin ao alto comando. “Mas estas críticas foram claramente um pretexto para dar um golpe de estado e infringir uma derrota estratégica na Rússia”, avalia. “Então, foi tudo muito bem coordenado com os serviços ocidentais de inteligência”.
Para Wevergton, fica claro que Prigojin é, hoje, um agente dos serviços da Otan. “Passou para o outro lado”. “Os EUA foram informados pelo próprio grupo Wagner desta ação cronometrada, que não teria ocorrido no calor de um ataque aéreo a suas colunas, como ele alega que sofreu da aviação russa. Foi uma coisa coordenada junto com a contraofensiva ucraniana para infringir uma derrota estratégica”, pontua.
(por Cezar Xavier)