Putin reunido com a missão de paz africana em Moscou | Vídeo

“Aqui está! Existe!”, disse o presidente Vladimir Putin ao recepcionar os líderes africanos que viajaram até Kiev e Moscou em busca de abrir um caminho de negociações que encerre o conflito em curso na Ucrânia. Aos presentes, Putin mostrou no sábado (17), pela primeira vez, o documento rubricado e assinado por um representante ucraniano em Istambul em março do ano passado, que foi depois, como o líder russo lembrou, jogado “na lata de lixo da história” pelo regime Zelensky, por ordem de Washington e Londres.

“E é chamado de acordo – Tratado de Neutralidade Permanente e Garantias de Segurança para a Ucrânia. Exatamente sobre garantias. Dezoito artigos”, enfatizou Putin.

A missão africana incluía o presidente atual da União Africana, Azali Assoumani, das Comores; o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa; o presidente do Senegal, Macky Sall; o primeiro-ministro do Egito, Mostafa Madbouly; o presidente da Zâmbia, Hakainde Hichilema; e representantes especiais dos presidentes da República do Congo e de Uganda, Floran Nsiba e Ruhakana Rugunda.

A eles Putin disse que a Rússia aplaude “a abordagem equilibrada dos amigos africanos em relação à crise ucraniana” e o interesse mostrado em encontrar formas de resolver o conflito.

“Quero enfatizar novamente que estamos abertos a um diálogo construtivo com todos que desejam estabelecer a paz com base nos princípios da justiça e levando em consideração os interesses legítimos das partes”, salientou Putin.

Em Kiev, onde estiveram antes da ida a Moscou, os líderes africanos ouviram do próprio presidente ucraniano Volodymyr Zelensky que não há nada a negociar com a Rússia, só a rendição de Moscou na guerra por procuração da Otan. Negativa, aliás, que Zelensky expressara recentemente ao enviado do Papa Francisco.

Nesse roteiro africano para a paz, o presidente Ramaphosa salientou a expectativa de “ver a desescalada do conflito”. “Desescalada em ambos os lados. Porque a escalada não conduz às negociações de paz. Portanto, estaríamos interessados na desescalada do conflito para que possamos encontrar um caminho para a paz.”

O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, assinalou a convergencia entre a proposta africana e a apresentada anteriormente pela China. “Em primeiro lugar, [os Estados africanos] destacaram os conhecidos 12 pontos da posição chinesa, apresentados vários meses antes, e destacaram as partes […] que lhes são próximas e que estipulam que não deve haver duplos padrões; que todos os princípios da Carta das Nações Unidas sejam respeitados e implementados; que não deve haver sanções unilaterais; que ninguém deve tentar garantir sua própria segurança à custa da segurança dos outros; e que a segurança continua indivisível em escala global”, disse o chefe da diplomacia russa, sinalizando o apoio da Rússia a essa abordagem.

ISTAMBUL

Como apontou o presidente russo, o acordo esboçado em Istambul – que encerraria a guerra em março do ano passado ao restaurar a neutralidade da Ucrânia – especificava tudo, “desde o tamanho das forças armadas até unidades de equipamento militar e pessoal”. Na parte das garantias, estabelecia como garantidores do acordo de neutralidade os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, mais as vizinhas Turquia e Bielorrussia.

“Mas depois que retiramos as tropas de Kiev, como prometemos, as autoridades de Kiev, como costumam fazer seus mestres, jogaram tudo na lata de lixo da história”, acrescentou.

Putin também lembrou à delegação africana que foi após o sangrento golpe de 2014, apoiado por Washington e Bruxelas, que a violência engolfou a Ucrânia. “Todos os problemas na Ucrânia começaram depois do golpe de Estado, inconstitucional, armado e sangrento de 2014. E esse golpe foi apoiado por patrocinadores ocidentais. Eles, aliás, não hesitam em falar sobre isso”, enfatizou.

Putin destacou que a Rússia apoiou o povo de Donbass após o “golpe sangrento” na Ucrânia e tentou resolver a situação pacificamente por um longo tempo. “Foi o regime de Kiev que começou essa guerra em 2014, e tínhamos o direito de fornecer [ao povo do Donbass] ajuda, de acordo com o Artigo 51 da Carta das Nações Unidas, citando a cláusula sobre autodefesa”, enfatizou.

A Rússia, por laços históricos, culturais e linguísticos, viu-se obrigada a apoiar a população da Ucrânia, que se recusou a submeter-se ao governo surgido após o golpe, ele destacou.

“Tínhamos o direito de reconhecer a independência desses territórios? Em total conformidade com a Carta da ONU, tínhamos o direito de fazê-lo porque, de acordo com os artigos relevantes da Carta da ONU, esses territórios tinham o direito de declarar sua independência. Portanto, tínhamos o direito de reconhecê-los. E o fizemos”, disse Putin.

Putin destacou que o lado russo nunca rejeitou negociações com a Ucrânia. Foi a Ucrânia que declarou sua falta de vontade, o que foi confirmado em decreto por Zelensky.

No início do encontro, Putin destacou que o desenvolvimento abrangente dos laços com os países africanos é uma prioridade da política externa da Rússia. “Defendemos consistentemente o fortalecimento das relações tradicionalmente amigáveis com os Estados africanos e a principal associação regional – a União Africana – com base nos princípios de igualdade, respeito mútuo e não interferência nos assuntos internos”, disse o presidente russo.

“Viemos para ouvir você e, através de você, ouvir a voz do povo russo. Gostaríamos de motivá-lo a entrar em negociações com a Ucrânia para resolver este problema complexo”, observou Assoumani, enquanto o presidente do Senegal reiterou que a África deseja a paz entre a Rússia e a Ucrânia, o que só é possível com base “no diálogo e no compromisso”.

O presidente sul-africano Ramaphosa reafirmou a disposição da África de se tornar mediadora na busca da paz e apresentou um plano de 10 pontos para sua conquista. O plano pede que se ouçam as posições de ambos os países; iniciar a desescalada em ambos os lados; garantir a soberania dos Estados e dos povos de acordo com a Carta das Nações Unidas; garantir a segurança de todos os países; garantir o transporte de grãos e fertilizantes de ambos os países; apoio humanitário às pessoas afetadas pela guerra; resolução da questão da troca de prisioneiros e repatriação de crianças; reconstrução pós-guerra e ajuda às pessoas afetadas pela guerra; cooperação mais estreita com os Estados africanos.

Putin informou ainda à delegação africana que a Rússia está disposta a continuar o processo de troca de prisioneiros de guerra com a Ucrânia. “Muito está sendo feito para isso, tanto pela Arábia Saudita, pelos Emirados Árabes Unidos quanto por nossos outros parceiros e amigos. E estamos prontos para apoiar esse processo”.

Ele disse ainda que a Rússia sempre acolheu legalmente as crianças da Ucrânia e não colocou obstáculos à sua reunificação com os seus familiares. “Sobre as crianças: as crianças são algo sagrado. Nós as tiramos da zona de conflito, salvando suas vidas e sua saúde. Ninguém iria separar as crianças de suas famílias. Tiramos orfanatos inteiros, de forma absolutamente legal, porque os diretores desses orfanatos eram representantes legais”.

ACORDO DE GRÃOS SABOTADO

O chefe de Estado russo declarou que os países necessitados “não devem sofrer” e que a Rússia fez todo o possível para garantir o fornecimento de grãos aos países africanos. “Concordamos com as propostas do Sr. [Secretário-Geral da ONU] Guterres e fizemos todo o possível para assegurar o abastecimento de cereais ucranianos, principalmente aos países mais pobres de África”.

No entanto, apesar de 31,7 milhões de toneladas de produtos agrícolas terem saído dos portos da Ucrânia, apenas 96 mil toneladas (3,1%) foram embarcadas para países carentes da África. “Essas autoridades neocoloniais – europeias e, essencialmente, norte-americanas – mais uma vez enganaram a comunidade internacional e os países africanos necessitados”.

O pacote de acordo também incluiu um memorando de entendimento entre a Rússia e as Nações Unidas para desbloquear as exportações russas de grãos e fertilizantes através do Mar Negro. Enquanto a Rússia manteve sua parte do acordo, o outro lado minou o acordo e as exportações russas, o que acabará por inviabilizar sua extensão.

Fonte: Papiro