Entregadores farão greve em meio a debate sobre regulamentação
Em meio aos debates que ocorrem no grupo de trabalho criado pelo governo Lula para discutir a regulamentação das atividades por aplicativos, movimentos de entregadores organizam uma paralisação nos dias 1º e 2 de julho, como forma de chamar atenção para as necessidades da categoria.
Além de parar o trabalho em pontos diferentes do Brasil nesses dias, ao menos uma manifestação está sendo chamada para o próximo sábado (1º), em frente ao estádio do Pacaembu, São Paulo, cidade onde atua boa parte dos entregadores.
A Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) é uma das entidades que está na mobilização, chamada pelo grupo Entregadores Unidos pela Base. “A CTB está convocando sua militância sindical para prestar todo o apoio possível, seja material, na divulgação, seja humano”, diz Carlos Rogério Nunes, dirigente da central que tem acompanhado a luta dessa categoria e o trabalho do GT do governo. “Sindicatos fundados como sindicato de mototaxistas, filiados à CTB, também estão na mobilização para essa paralisação dos trabalhadores em aplicativos”, completa.
Nunes avalia com otimismo a mobilização. “É fundamental porque é uma categoria que sofre as maiores aberrações do ponto de vista de contratação, de condições de trabalho, de precarização, comparável até às jornadas do século 19, quando operários trabalhavam 14, 16 horas. São trabalhadores que sofrem uma exploração muito grande. É salutar que tomem essa iniciativa. Esperamos que tenha uma boa adesão e que seus direitos sejam reconhecidos”.
Para Daniel Freitas, entregador que utiliza a bicicleta para trabalhar e atua há 12 anos no segmento em São Paulo, “a falta de regra para o negócio existir cria péssimos comportamentos”, que acabam afetando tanto o rendimento no trabalho quanto a qualidade de vida dos trabalhadores. Ele ressalta que há uma “exploração desnecessária” e falta garantir os direitos básicos de quem atua no setor.
Na chamada à paralisação — cujo mote é “Unificar a luta contra a exploração”— o movimento pede, entre outros itens, a taxa mínima de R$ 10 por entrega, um piso mínimo de remuneração para a categoria, o fim dos bloqueios sem justificativa, idade reduzida para aposentadoria e um limite para a jornada de trabalho, com pagamento de horas extras. De acordo com os organizadores, as mobilizações estão confirmadas ao menos nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás, Piauí, Maranhão e Rio Grande do Sul.
Ao site Brasil de Fato, o entregador Ângel Rosseti, de Porto Alegre, disse que “o iFood começou a dar promoção para desmobilizar nosso movimento. Mas a gente está construindo o breque, mostrando que é só artimanha como o iFood sempre faz”.
GT do governo
Em consonância com essas reivindicações, no âmbito governamental os setores envolvidos estão debatendo um regramento que melhore a situação da categoria. A paralisação acontece às vésperas da próxima reunião do Grupo de Trabalho criado pelo governo, que foi anunciada para acontecer entre os dias 4 e 5 de julho.
O Grupo de Trabalho foi criado por decreto publicado no dia 1º de maio, com prazo de 150 dias prorrogáveis, e instalado no dia 5 de junho. É composto por representantes das empresas de serviços, dos trabalhadores do setor e do governo, entre os quais os ministérios do Trabalho e Emprego, da Previdência e da Fazenda.
Na mais recente reunião, ocorrida no dia 21, segundo noticiou o MTE, o subgrupo de transporte de mercadorias definiu as pautas de remuneração mínima e saúde do trabalhador como as duas prioridades iniciais para a discussão. Em comum acordo, tanto os representantes da categoria quanto as empresas classificaram o encontro como um avanço importante rumo a um consenso.
“Ambas as questões são cruciais e precisam ser definidas. Vamos discutir a remuneração, vamos discutir as condições de trabalho, as condições de saúde do trabalhador e depois entra a jornada mínima, transparência. Passo a passo a gente vai conseguir ter uma regulamentação da atividade no Brasil”, disse o secretário-executivo do MTE, Francisco Macena.
Nas discussões, os entregadores pedem uma remuneração mínima mensal, bem como regras que garantam valor mínimo por corrida e serviço, paradas extras, taxas para cancelamento realizados pelos usuários dos serviços e a atualização anual do salário realizada por meio de negociação coletiva. Para o item saúde, a categoria pede condições garantidas conforme a atividade efetivamente realizada, seguindo “as regulamentações já existentes pertinentes a cada atividade e respectivos acordos e convenções”.
Na avaliação de Carlos Rogério Nunes, da CTB, “a tendência é que o trabalho seja regulamentado, para que haja o reconhecimento do vínculo de trabalho; esses trabalhadores não são prestadores de serviço, nem empreendedores. Eles têm uma jornada, meta de produtividade, têm que fazer um determinado número de entregas, têm que cumprir um determinado horário. Então, isso é caracterizado como contrato de trabalho. Contrato de trabalho tem que ter a sua regulamentação legal pela Consolidação das Leis de Trabalho. Não é fácil, mas nós estamos aos poucos evoluindo nesse sentido”.
Daniel Freitas também vê o cenário e o trabalho do governo de forma positiva. “Hoje a gente está vivendo um momento em que a regulamentação vai acontecer. Vejo isso com um pouco mais de confiança devido à pluralidade e a capacitação das pessoas que estão ali querendo debater”.
Para ele, “com certeza sai coisa boa quando você abre a mesa para todo mundo. Não tenho dúvida nenhuma disso, para a gente aplicar bem a democracia, é preciso pluralidade”.