Região próxima ao Donbass vira cemitério de Bradleys e Leopards dos EUA e da Alemanha | Foto: Reuters

O fiasco da “contraofensiva ucraniana” em curso chegou afinal à mídia da Otan, que começa a retratar que a artilharia russa tem moído as tropas do regime Zelensky, enquanto os Leopards e os Bradley ardem, e praticamente não há recuperação de terreno – sequer na zona de ninguém. Ao invés de vitória iminente, a contraofensiva estaria precisando de uma pausa para “reavaliação de estratégias”, segundo essa mídia.

Com a cúpula da Otan prestes a acontecer de 10 a 12 de julho em Vilnius, capital da Lituânia, o próprio Zelensky admitiu em entrevista à BBC na quarta-feira (21) que a “contraofensiva não está indo bem” e que “não é como em filme de Hollywood”.

Depois de sucessivamente adiada por meses, a contraofensiva do regime de Kiev começou em 4 de junho, ao longo dos setores de Donetsk e Zaporozhia da linha de frente, com ondas de ataques seguidas por recuos, com os russos destruindo em escala industrial blindados e armas fornecidos pelo Ocidente e com milhares de baixas ucranianas, conforme revelado por Moscou e pelos vídeos nas redes sociais.

As tropas ucranianas armadas e treinadas pela Otan sequer conseguiram penetrar na primeira – e considerada a mais fácil – das três linhas defensivas russas, que constituem um labirinto de trincheiras, obstáculos contra tanques, arame farpado, campos minados e fortificações, com a equipada artilharia, mais o controle russo sobre o espaço aéreo, tudo junto executando in loco na prática a desmilitarização da Ucrânia.

O comando ucraniano fala em “113 quilômetros quadrados recuperados”, o que é contestado pelas autoridades russas. O próprio Zelensky disse à BBC que os supostos avanços foram “mais lentos do que o desejado”.

Segundo a vice-ministra da Defesa ucraniana, Hanna Maliar, seriam outros os critérios para avaliar a eficácia das operações militares, e “não os povoados e quilômetros percorridos”. “O grande golpe [da contraofensiva] ainda está por vir”, prometeu. Não sem reconhecer que em Kupiansk, na região de Kharkov, e Liman, em Donetsk, “o inimigo avança e nós estamos na defensiva”.

ARTILHARIA RUSSA

Na semana passada, o Kremlin já havia anunciado que o regime de Kiev perdeu 30% dos tanques e blindados recém fornecidos pelo Ocidente e também 7.500 combatentes nessa contraofensiva.

Em outro aspecto do conflito, a Rússia continua metodicamente bombardeando com mísseis e drones a infraestrutura de guerra – de centros de comando a arsenais e depósitos de combustível, de instalações de defesa antiaérea a centros logísticos.

Em Moscou, em entrevista ao canal de TV Rossiya24, o presidente russo Vladimir Putin registrou “certa calmaria” na linha de frente. Para o líder russo, aparentemente as forças armadas ucranianas estão engajadas na restauração da capacidade de combate, reunindo novas unidades de brigadas que sofreram graves perdas ao tentar romper as defesas russas.

Sobre os tanques e blindados destruídos, entre eles Leopards alemães, blindados franceses sobre rodas e Bradleys norte-americanos, Putin assinalou que “estão queimando”.

A “pausa” também foi referida pelo think tank baseado em Washington Instituto pelo Estudo da Guerra (ISW, na sigla em inglês), que no domingo apontou que as forças ucranianas podem estar temporariamente interrompendo as operações de contraofensiva para “reavaliar suas táticas para operações futuras”. A Ucrânia ainda não lançou seu esforço principal, acrescentou o ISW.

EVITANDO VIRAR “MONTE DE CINZAS”

Situação que explica relato da revista alemã Der Spiegel (pró-Otan) de que as tripulações ucranianas de tanques fornecidos por Berlim “fingem danos para evitar lutar contra os russos”.

Algumas tripulações de tanques ucranianos têm fingido avarias em seus tanques para justificar não entrar em combate contra as forças russas, disseram à revista Spiegel colegas soldados que operam Leopardos alemães.

A revista conversou com três soldados ucranianos treinados pelos alemães que estavam entre a tripulação de dois tanques Leopard 2A6 fornecidos à Ucrânia pelo Bundeswehr. Um deles disse não culpar aqueles que estão se recusando. “Se eles atingirem a torre, você será um monte de cinzas”, disse um homem identificado como Misha à Spiegel.

Outro soldado, apelidado de Gutsik, disse que esquivar-se completamente de um confronto era melhor do que entrar em combate apenas para desistir após o primeiro tiro, explicando por que não sentiu má vontade com o estratagema. Admissões que coincidem com os vídeos nas redes sociais que mostram os blindados forçados pelo fogo de artilharia russo a entrarem nos campos minados e explodirem.

Der Spiegel esclareceu que os soldados entrevistados eram todos veteranos e estavam entre os operadores de tanques mais experientes da Ucrânia. Todos viajaram para a Alemanha para fazer um curso de cinco semanas sobre como operar os Leopards.

Por sua vez o Bild, também pró-Otan, com base em seu correspondente militar, Yulian Repke, reconheceu que na região de Zaporozhya, em uma semana, na cidade de Orekhov, os ucranianos perderam pelo menos sete tanques Leopard 2 e 12 veículos de combate de infantaria Bradley.

TRINCAS NO APOIO

São fatos assim que levaram o Washington Post a alertar que “o apoio bipartidário à Ucrânia está rachando”, enquanto Político disse que a reputação de Biden e a eleição do próximo ano estavam em jogo na Ucrânia.

Por sua vez, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, disse na terça-feira que as tropas de Kiev estão enfrentando forças russas bem preparadas, confirmando que a contraofensiva ainda não produziu nenhum resultado significativo.

“Sabemos que os ucranianos enfrentam um terreno difícil, eles enfrentam resistência russa arraigada”, disse Stoltenberg durante uma entrevista conjunta com o ministro da Defesa da Alemanha, Boris Pistorius, na cidade de Flensburg.

As tropas russas conseguiram “estabelecer linhas de defesa estáticas e bem preparadas com campos minados, com dentes de dragão, com trincheiras de tanques”, admitiu o chefe da OTAN. Ele prometeu que o bloco militar enviaria equipamentos de desminagem adicionais, incluindo veículos blindados pesados para tentar resolver o problema.

No domingo, em entrevista ao Welt am Sonntag, Stoltenberg declarou que “a paz não pode significar congelar o conflito e aceitar um acordo ditado pela Rússia”, acrescentando que teria de ser sob as condições ucranianas.

GUERRA HÍBRIDA

“Se a Otan, pela boca de Stoltenberg, mais uma vez declara que é contra o congelamento, como dizem, do conflito na Ucrânia, então eles querem lutar”, disse Lavrov em entrevista coletiva. “Bem, deixe-os lutar, estamos prontos para isso, há muito entendemos os objetivos da Otan na situação em torno da Ucrânia, que foram formados durante muitos anos.”

Os contínuos envios de armas do Ocidente para Kiev mostram que o Ocidente é “um participante direto na guerra híbrida declarada contra a Rússia e, de fato, a guerra quente”, acrescentou.

Na semana passada, duas manifestações, uma em Roma e outra na capital búlgara, rechaçaram o envio de armas ao regime de Kiev.

Enquanto a mídia da Otan diz que se trata de uma “guerra não provocada”, segundo a Rússia a guerra começou em 2014, com o golpe de Estado com apoio da CIA que derrubou o presidente legítimo, instalou em Kiev um regime cheio de neonazistas e se dedicou a perseguir a população de ascendência russa, o que levou aos levantes no Donbass e na Crimeia.

A Rússia buscou por oito anos uma solução pacifica através dos Acordos de Minsk que, hoje se sabe, foram desvirtuados para rearmar o regime de Kiev, como confessaram ngela Merkel e François Hollande. A Rússia reconheceu as repúblicas do Donbass quando Kiev estava prestes a lançar uma operação de limpeza étnica contra os falantes de russo, e de acordo com o artigo 51 da Carta da ONU – direito de autodefesa – impediu o genocídio e expulsão dos habitantes do Donbass de suas próprias terras.

Mas a causa mais profunda da guerra está na decisão de sucessivos governos norte-americanos de violar a promessa aos russos de jamais estender a Otan “1 polegada” para leste, feita quando da reunificação alemã. Bastaria a Ucrânia manter a neutralidade, e não haveria confronto.

Como disse um orador no protesto em Roma, Moni Ovadia, “muitos expoentes da política americana na época avisaram que a expansão da Otan seria uma catástrofe”. Eis a catástrofe – sublinhou -, “querem arrastar-nos a todos para uma guerra, para quê? Para os EUA reafirmarem sua supremacia mundial”.

“Esta catástrofe está destruindo a Europa, serva dos Estados Unidos, que não levantou a voz contra o que está acontecendo. Eles querem destruir a Federação Russa e fragmentá-la em muitas pequenas repúblicas e depois se concentrar na China”, acrescentou Ovandia.

“Chegou a hora de levantar a voz para obrigar as armas ao silêncio e iniciar negociações sem condições prévias”, enfatizou o escritor.

PELA PAZ

Por sua vez o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou que a postura intransigente de Kiev não deixa abertura para negociações de paz com a Rússia, reiterando a posição de longa data de Moscou sobre o assunto.

“[O presidente russo] Putin está aberto a contatos. Houve um intercâmbio muito produtivo com uma delegação africana no sábado e este diálogo vai continuar”, disse o porta-voz aos jornalistas na terça-feira. Ele lembrou que Putin mostrou aos líderes africanos o acordo, com o qual os ucranianos concordaram em princípio, que poria fim a guerra em troca da manutenção da neutralidade e do reconhecimento da soberania das repúblicas do Donbass, com garantias a Ucrânia dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, mais as vizinhas Turquia e Bielorrússia. Acordo que foi vetado por Washington e Londres, trabalhando pela continuação da guerra.

No entanto, “considerando a posição atual do regime ucraniano, não se pode dizer que haja bases estáveis para eventuais negociações”, acrescentou. Além da delegação da União Africana, já se pronunciaram a favor da mediação de paz a China, Brasil e o Papa Francisco.

Fonte: Papiro