Carro popular entra no radar do governo como forma de aquecer indústria
Em meio ao debate sobre a reindustrialização do Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem sinalizado com a possibilidade de incentivar a produção de carros populares com valores mais acessíveis, o que ajudaria no aquecimento do setor e da economia e na geração de empregos. A próxima quinta-feira (25), quando se celebra o Dia da Indústria, tem sido apontada como data em que poderão ser anunciadas medidas para o setor automotivo.
No começo do mês, Lula criticou o valor dos carros populares, que os tornariam acessíveis, no máximo, à classe média. Hoje, um dos mais baratos gira em torno de R$ 70 mil.
Na semana passada, o vice-presidente e ministro da Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, se reuniu com representantes das montadoras. Na ocasião, os executivos teriam apontado que as empresas dispõem de pouca margem de lucro nos carros populares e que, por isso, seria difícil reduzir os preços nas fábricas.
Também esteve em pauta a possibilidade de redução tributária. No entanto, o Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) já é reduzido para carros populares, ou seja, uma diminuição nessa frente recairia sobre o ICMS, que também já tem redução para carros de passeio e que impactaria sobre os estados, levando à necessidade de compensações pela União.
Cenário adverso e alternativas
A aposta no carro popular seria uma das alternativas para buscar enfrentar o cenário atual. Nos últimos anos, a inação do governo de Jair Bolsonaro frente à crise que se aprofundou com a pandemia e a política de juros altos mantida pelo Banco Central prejudicaram a economia como um todo e a indústria em particular.
No caso do setor automobilístico, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), a produção aumentou 8% no primeiro trimestre do ano em comparação com o mesmo período de 2022. Mas, é preciso considerar que o primeiro trimestre do ano passado teve o pior resultado dessa indústria desde 2004. E em abril, a queda foi de 19,4%, refletindo o cenário acalentado nos últimos anos.
Buscando contribuir para reaquecer o setor, manter e gerar empregos, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e a subseção do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) na entidade elaboraram um estudo sobre o tema, entregue a Lula, no qual também listam diretrizes e sugestões para o governo.
Quanto às diretrizes, foram elencadas a criação de um fórum tripartite do setor automotivo; a busca para transformar o Brasil em referência em mobilidade sustentável; a ampliação do conteúdo nacional de partes, peças e componentes; linhas de crédito para renovação da frota e preservação e criação de empregos.
No que diz respeito às propostas, a entidade sugere promover o lançamento imediato de modelos populares, com linhas de crédito de longo prazo; incentivar a produção de veículos que considerem grau de nacionalização e quantidade mínima de etapas do processo de fabricação no país; ampliar o programa de estímulo à renovação das frotas de táxis; constituir programa especial de estímulo à renovação dos automóveis operando em aplicativos de transporte; transição do mix de veículos rumo à descarbonização ao longo dos próximos 12 anos e revisar alíquotas de importação de veículos elétricos alinhada à existência de projetos de fabricação nacional.
O professor Creso de Franco Peixoto, da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp, acredita na viabilidade de se investir em carros mais acessíveis, mas defende que seja implantado um sistema de troca dos velhos pelos novos. Isso contribuiria para não haver um aumento muito grande no número de carros em circulação e para reduzir a emissão de poluentes. “A porcentagem desses veículos mais antigos na frota gira em torno de 50%. Pensando na sustentabilidade, o carro colocado no mercado antes dos anos 2000 e que hoje tem 23 anos polui mais que o carro de hoje”, explica.
Outro ponto que defende como forma de viabilizar o carro popular é baratear a produção no acabamento, deixando o veículo mais simples, mas mantendo itens de segurança.
Do ponto de vista do impacto da entrada de mais carros na mobilidade urbana, Peixoto diz que é preciso haver investimento em diferentes modais de transporte coletivo — como metrôs, trens e ônibus — integrados com outros como a bicicleta, que demanda boas ciclovias, além do estímulo ao trabalho em casa para profissões em que essa modalidade seja possível. Da mesma forma, ressalta a importância de haver reeducação para o uso mais consciente dos carros.
A somatória desses e outros aspectos levaria à redução do uso do automóvel no dia a dia das grandes cidades e à consequente melhora na fluidez do trânsito, na questão ambiental e na saúde pública. “É preciso também pensar nesses degraus, que vão sendo alcançados, para que a gente tenha um ambiente melhor, com menos veículos na rua e com mais limpeza no ar”, conclui.