Trump deve se apresentar a tribunal de Nova Iorque na terça-feira (4) | Foto: AFP

O ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump não será algemado quando se entregar na próxima semana em Nova York, afirmou na sexta-feira (31) seu advogado de defesa, Joe Tacopina. Acionado pela Promotoria de Manhattan, ele irá se apresentar ao juiz na próxima terça-feira.

Segundo seu advogado, a defesa de Trump e a Promotoria firmaram um acerto quanto a isso. Espera-se que Trump seja indiciado na tarde de terça-feira no tribunal de Manhattan, confirmou o porta-voz do tribunal, Lucian Chalfen.

Tacopina acrescentou que Trump não aceitaria um acordo judicial e iria a julgamento. É a primeira vez em a história dos EUA que um ex-presidente se torna réu e Trump se diz “vítima de perseguição política”. Inclusive ameaçou com distúrbios caso fosse preso.

Ele acusou os democratas de “usar nosso sistema de justiça para punir um oponente político, que por acaso é o ex-presidente dos Estados Unidos e, de longe, o principal candidato republicano à presidência”.

O caso, no entender do promotor Andy Braggs, que se elegeu em 2021 disputando com outros sete democratas, envolve o pagamento de um cala-boca, às vésperas das eleições de 2016, a uma atriz pornô, com quem supostamente o bilionário teria tido um affair dez anos antes.

Além de fazer postagens com letras maiúsculas sobre a “perseguição” em seu site Truth Social, Trump aproveitou para enviar aos correligionários mensagem de arrecadação de fundos.

NAÇÃO DIVIDIDA, DIZ NYT

Enquanto a mídia ligada aos republicanos abomina o indiciamento, mesmo parte da imprensa contrária ao ex-presidente – como o New York Times – adverte que “o caso é um momento sem precedentes na política dos EUA, que anuncia uma situação tumultuada para uma nação profundamente dividida”.

Pelas normas da Justiça dos EUA, os réus saem algemados ao se apresentarem para indiciamento em uma Corte, mas, conforme Tacopina, isso não acontecerá. O juiz pode vir a considerar que não há risco de fuga de Trump e permitir que o ex-presidente se vá, pagando uma fiança, avaliaram as agências de notícias.

O governador republicano da Flórida, Ron DeSantis, disse que não deixará Trump ser extraditado do Estado, caso a corte estadual de NY confirme a prisão. Potencial candidato à presidência em 2024, ele classificou Bragg como um “promotor financiado por Soros”, referindo-se aos pagamentos indiretos que este recebeu do bilionário George Soros, o maior contribuinte do Partido Democrata.

Por outro lado, o presidente da Câmara dos Deputados, o republicano Kevin McCarthy, anunciou ter instruído os comitês da Câmara “a investigar imediatamente se fundos federais estão sendo usados ​​para subverter nossa democracia, com processos politicamente motivados”.

ESCÂNDALOS EXTRACONJUGAIS

Não é a primeira vez que, na política dos EUA, se faz o uso de escândalos extraconjugais para obter benefícios políticos. O que, inclusive, os republicanos, que agora estão reclamando dos democratas, fizeram sem dó em relação às escapadelas no Salão Oval do então presidente Bill Clinton.

A acusação a Trump foi de que o silêncio da atriz pornô Stormy Daniels custou US$ 130.000 – dinheiro de pinga, para os padrões do bilionário -, nas semanas prévias à eleição em que ele derrotou Hillary Clinton.

O que tornaria isso crime seria o fato do pagamento ter sido computado como honorários advocatícios de Michael Cohen, então o ajeita-tudo de Trump, com recursos de campanha. Caracterizando “falsificação de registro comercial” e tentativa de “esconder” dos eleitores a pulada de cerca, jamais admitida pelo bilionário.

Com tantos crimes sinistros de que acusar Trump ao longo de sua presidência, não deixa de haver um tom de farsa nesse esforço dos democratas para atingi-lo a partir de um escândalo sexual.

A começar pelo crime mais grave, a tentativa de fraudar o resultado das eleições presidenciais com a invasão do Congresso pelas hordas trumpistas e as pressões para mudar resultados.

Ainda, a separação de centenas de filhos de imigrantes dos pais nos centros de detenção na fronteira. A matança de civis em terras alheias com mísseis e drones norte-americanos. O massacre de norte-americanos por seu negacionismo contra a pandemia de Covid. As inúmeras manifestações de racismo e xenofobia. Sua notória aversão a pagar impostos.

REEMBOLSO

A atriz pornô já havia em outras ocasiões buscado obter uma ‘recompensa’ de Trump, bem como vender sua história a vários meios de comunicação, sem sucesso. Mas as famosas fitas que vieram a público em outubro de 2016, em que Trump se gaba de agressões grosseiras a mulheres, levaram Daniels e seu advogado a insistirem no assunto, até Cohen fazer o pagamento, usando seus próprios fundos. Ele foi depois reembolsado pela Trump Organization como “despesas legais”.

Recebeu US$ 420.000 em parcelas de US$ 35.000, o que incluía a despesa com Daniels, um bônus de US$ 60.000 e impostos.

Trump, segundo Cohen, autorizou o pagamento para evitar publicidade desfavorável na última semana da campanha eleitoral.

Posteriormente processado por violar as leis de financiamento de campanha, Cohen se declarou culpado, cumpriu três anos de prisão e se tornou a principal testemunha de acusação contra Trump.

Segundo a CNN, o ex-presidente foi pego desprevenido pela decisão do grande júri de Manhattan de acusá-lo formalmente, de acordo com uma pessoa que falou com Trump na semana passada. O bilionário acreditava que poderia “levar semanas” – ou mais.

“Será que isso é um choque hoje? É claro que sim”, pontuou a fonte, falando sob a condição de anonimato.

Logo após ser acusado, Trump afirmou que “essa caças às bruxas vai ricochetear fortemente em Joe Biden [atual presidente dos EUA]”.

Ele convocou os republicanos e demais trumpistas a “derrotarem Alvin Bragg” e, depois, “Joe Biden”, para “tornar a América Grande Novamente!!”

De acordo com o portal wsws, “a principal fraqueza legal no caso é que tanto a Comissão Eleitoral Federal quanto o procurador dos EUA se recusaram a processar Trump pelas acusações federais, e o estatuto de limitações expirou há muito tempo em uma acusação estadual de arquivar registros comerciais falsos, o que é uma contravenção”.

“Para contornar isso, a promotoria acusou Trump de se envolver na contravenção estadual, apresentando um relatório falso, em prol de um segundo crime, violando as leis federais de financiamento de campanha. Nenhum caso jamais foi processado no Estado de Nova York com base em tal teoria legal”.

Fonte: Papiro