O Metrô de São Paulo decidiu mudar o nome de uma futura estação da linha 2-verde de Paulo Freire para Fernão Dias, num contraste tipicamente bolsonarista. A decisão foi tomada por dirigentes da empresa controlada pelo Governo de São Paulo, em janeiro deste ano, após Tarcísio de Freitas (Republicanos) assumir como governador.

Um dos educadores mais importantes do mundo, Freire (1921-1997) foi ideologicamente atacado por desinformação vinda do governo Bolsonaro. Fernão Dias (1608-1681), por sua vez, é celebrado por adentrar o sertão paulista, fundando povoados, mas às custas do extermínio e escravização dos povos indígenas para impor a mineração e colonização. 

A história busca equilibrar o imaginário do bandeirantismo desde movimento heróico, em contraste com a demonização estabelecida a partir dos anos 1930. Concretamente, as imagens associadas aos bandeirantes e seus protagonistas estão em homenagens pelas vias públicas e monumentos do estado. Foram forjados como mitos do avanço paulista, desde a metade do século XIX, quando as elites paulistas buscaram se impor ao Rio de Janeiro e à monarquia.

A futura estação está prevista para ser construída em um ponto da avenida Educador Paulo Freire, na capital paulista, próximo à rodovia Fernão Dias. À colunista da Folha de S. Paulo, Mônica Bergamo, o Metrô afirmou que a mudança já foi oficializada e que a estação será inaugurada em breve.

Bolsonarismo governante

Embora o Metrô justifique a medida afirmando que ela se deu após uma pesquisa de opinião ser feita com moradores de regiões próximas da futura estação em 2022, a decisão coincide com a posse do novo governador, ex-ministro de Jair Bolsonaro.

O nome Fernão Dias teria tido 57% das preferências, ante 29% de Paulo Freire e 14% de Parque Novo Mundo, segundo a pesquisa.

A mudança, que pretere o educador em detrimento do bandeirante paulista, surpreendeu funcionários da empresa que tomaram conhecimento da alteração.

Basta de Paulo Freire

Sob o governo de Jair Bolsonaro (PL), o intelectual se tornou alvo dos ataques da famigerada “guerra cultural” do então presidente e de seus apoiadores, por meio das tentativas de implantar o programa Escola Sem Partido, um padrão de censura a certos autores nas escolas. 

Ainda durante a campanha à Presidência, Bolsonaro afirmou que pretendia excluir os métodos de Freire das escolas, ignorante sequer da baixa inserção da pedagogia do oprimido na educação pública brasileira. A perseguição a Paulo Freire na época da ditadura não apenas o expulsou ao exílio, mas também do sistema de ensino do país, impondo um autoritarismo e associando a educação ao chamado tecnicismo pedagógico, que a afasta de qualquer caráter social. Esse tecnicismo de baixa qualidade continua hegemônica na educação brasileira.

Na verdade, a influência de Freire vai muito além da educação, tendo sido importante principalmente para a formação de movimentos sociais como o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Manifestações bolsonaristas contra o petismo sempre enfatizaram o ódio ao educador, associado a uma suposta “doutrinação marxista”.

Em 2021, a Justiça Federal do Rio chegou a proibir o governo federal de tomar qualquer atitude que atentasse contra a dignidade de Freire.

Orgulho nacional

Patrono da educação brasileira, Paulo Freire é considerado um dos principais educadores do mundo. Seu principal livro, “Pedagogia do Oprimido”, figura entre as cem obras mais citadas em língua inglesa, de acordo com o Google Scholar, plataforma voltada à produção científica.

Já segundo a Open Syllabus –projeto que reúne informações do mundo acadêmico– o livro é a única obra brasileira a aparecer na lista dos cem mais pedidos pelas universidades de língua inglesa.

Políticos e movimentos sociais reagiram lamentando a decisão do governo sobre a mudança de nome:

(por Cezar Xavier)