Lula com as mãos sujas de petróleo cru em 2006. Créditos: Ricardo Stuckert/PR

A Federação Única dos Petroleiros (FUP) e o Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) estão alinhados na defesa da implementação do imposto de exportação de óleo cru. Segundo as entidades, que já vinham defendendo a medida, este é um instrumento utilizado por diversos países para manter o equilíbrio sobre os reajustes de preços dos combustíveis para o usuário final. Especialmente, quando há oscilações internacionais como a que há, hoje, com a guerra da Ucrânia.

A reportagem conversou com o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar, que explicou porque concorda com o governo Lula nesta medida. “Isso ajuda a ter um colchão de amortecimento dos preços diante de impactos conjunturais muito grandes”. 

Mas não apenas para isso, diz ele. “Esse imposto cria uma riqueza para ser utilizada, sim, na ampliação da capacidade de refino aqui no Brasil, término das obras de refinarias, e construção da refinaria que precisamos para sermos auto-suficientes no refino, e não apenas produção do petróleo, que já somos”.

Oposição

Ele também comentou as pressões contrárias à propostas da nova direção da companhia.

Diversas companhias nacionais e internacionais tentam reverter a taxação de 9,2% sobre as exportações de óleo bruto nos meses de março a junho, feito pelo Ministério da Fazenda como medida para conter a perda de arrecadação com a desoneração de combustíveis.

A Shell Brasil, Equinor, Petrogal, Repsol Sinopec e TotalEnergies ajuizaram na quarta-feira (8) um pedido de liminar contra a tributação na Justiça Federal. A Prio (#PRIO3) também tentou derrubar o imposto com dois mandados de segurança, por questões concorrenciais, que foram negados pela justiça.

O Partido Liberal (PL), de Jair Bolsonaro, também entrou com Ação Direta de Inconstitucionalidade. A sigla alega que o Executivo quer “desvirtuar a essência do Imposto de Exportação, estabelecendo uma finalidade arrecadatória”.

Bacelar rebate queixas de que o imposto de exportação vai gerar insegurança jurídica, afetar competitividade ou inibir investimentos. 

“Insegurança jurídica não é definida apenas por este elemento. Não prejudica competitividade porque a alíquota incide sobre todos os players que operam no mercado nacional e, dado que as margens de lucro de empresas foram excepcionais, em função dos altos preços, nada mais justo que exigir uma compensação para a garantia de menores preços no mercado interno. Tampouco vai desestimular investimentos, pois planejamentos estratégicos estão definidos, são decisões de longo prazo e, em princípio, a taxação será temporária, por quatro meses”, ressalta o dirigente da FUP. 

Equilíbrio de preços

Em função dos preços recordes, em 2022, os lucros das empresas de petróleo no mundo aumentaram US$ 2 trilhões em relação a 2021, segundo Agência Internacional de Energia dos Estados Unidos (IEA). No Brasil, este foi um dos principais vetores de inflação sobre toda a cadeia produtiva.

“Os agentes do mercado se acostumaram a trabalhar nos últimos anos de gestão da Petrobras como se a estatal fosse deles; ela é majoritariamente da União e, nessa condição, tem o direito de reavaliar o processo de privatização e defender a implementação de medidas, como o imposto de exportação sobre petróleo bruto”, afirma Bacelar. 

A FUP, como o novo governo, apoia a paralisação de venda de ativos da estatal por considerar a medida correta, “e por entender que as privatizações foram feitas sem transparência, de forma açodada,” ressalta. Bacelar disse que Lula ainda não tomou o controle sobre a Petrobras, o que só ocorrerá com a constituição do novo conselho em 27 de abril. Por isso, pede a suspensão de medidas até que tenha tomado pé da situação e possa decidir.

O diretor técnico do Ineep, Mahatma dos Santos, defende que impostos sobre exportação de petróleo cru são instrumentos tributários comuns a países exportadores líquidos de petróleo bruto ou produtos refinados de petróleo, pois são comumente utilizados para financiar a manutenção de preços internos nacionais em patamares mais baixos que os praticados nos mercados internacionais. 

Questão estratégica

A experiência histórica internacional sobre o assunto mostra que os Estados Unidos, por razões de segurança nacional, durante muitos anos proibiram a exportação de óleo cru. Há também o caso da Argentina, que entre 2006 e 2012 taxou as exportações do produto.

A experiência da Rússia chama a atenção por trabalhar com três tipos de preços de exportações de óleo cru, como principal instrumento de política econômica. O Ineep mostra que, lá, existem três sistemas de preços: um para o mercado europeu, outro para Comunidade de Estados Independetes (CIS), e outro ainda para o mercado interno. Os dois primeiros, que são preços de exportação, têm valores mais altos e taxações para subsidiar os preços internos no mercado russo. 

O Ineep considera que, pelas práticas internacionais e por ser o Brasil um exportador líquido de petróleo, a alíquota de 9,2 %, adotada por quatro meses, sobre a exportação de petróleo cru, é uma decisão positiva, sobretudo na atual conjuntura de alta nos preços das commodities energéticas no mundo. 

Ao contrário do que alega o PL, eles defendem que o imposto não tem caráter arrecadatório. É voltado, principalmente, para a captura de parte da renda petroleira gerada por esses exportadores de petróleo. Nos últimos dois anos, o aumento dos preços do petróleo no mercado internacional contribuiu diretamente para a ampliação extraordinária dos lucros das petroleiras, tanto as que operam no Brasil quanto no mercado global. 

Segundo justificativa do Ineep, baseada nestes dados de lucratividade, essa medida de tributação faz sentido porque é opção de taxação sobre a renda extraordinária gerada nos últimos anos e porque visa compensar uma receita renunciada anteriormente pelo governo e tem por objetivo amenizar o impacto no mercado interno brasileiro da volatilidade do aumento dos preços internacionais dos derivados. 

Segundo o coordenador-geral da FUP, a reoneração parcial de combustíveis, compensada por essa alíquota, é uma forma de o Estado exigir uma contribuição das empresas de petróleo que operam no Brasil para a redução dos impactos do aumento desses preços sobre a população mais vulnerável. 

Em relação à suspensão das privatizações, o advogado Ângelo Remédio, do Garcez Advogados, que representa a FUP, destaca a falta de transparência dos decretos números 9188, que regula vendas de refinarias, e 9355, que regulamenta a venda de campos petrolíferos – ambos criados no governo Temer. 

“É absolutamente legítimo para o governo que está assumindo pedir paralisação do processo para analisar e entender como proceder a partir daí. Noventa dias parece algo razoável para verificar se a nova política energética vai manter essas privatizações”, diz ele. 

(por Cezar Xavier)