Para Nobel de Economia Joseph Stiglitz, Selic a 13,75% “é pena de morte”
O vencedor do prêmio Nobel de Economia em 2001 e professor da Universidade de Columbia (EUA), Joseph Stiglitz, definiu a taxa básica de juros no Brasil, hoje de 13,75%, como “chocante”. “É tipo de taxa de juros que vai matar qualquer economia”, declarou o economista durante seminário internacional Estratégias de Desenvolvimento Sustentável para o Século XXI, promovido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
“A taxa de juros de vocês é de fato chocante. Os números que vocês estão falando é de 13,75%, ou 8% (de juros) real, é tipo de taxa de juros que vai matar qualquer economia. Eu acho impressionante que o Brasil tenha sobrevivido, o que seria de fato uma pena de morte. Eu acho que vocês têm conseguido sobreviver a esse tipo de alta taxa de juros é porque vocês têm bancos de desenvolvimento estatais. Porque o BNDES historicamente tem feito muito com essas altas taxas de juros, tem oferecidos fundos as empresas produtivas, para investimentos de longo prazo com baixos juros. Historicamente vocês tiveram taxas de juros mais altas do que os outros países, que deram a vocês uma desvantagem competitiva que vocês têm que superar com muito empreendedorismo e inovação e outras coisas. Mas, talvez a pergunta que vocês deviam ter feito é onde a gente estaria se a gente tivesse uma política monetária mais razoável? Eu diria que se vocês estivessem uma política monetária mais razoável, vocês estariam num crescimento econômico muito maior. Esse foi um dos fatores que levou vocês a uma performance fraca ao longo do tempo e a pergunta na verdade é: há alguma justificação para essas altas taxas de juros?, questionou Stiglitz, que acrescentou.
“É claro que essas taxas desencorajam os investimentos. O investimento é necessário para aumentar a produtividade no Brasil… É por isso que vocês têm tanta flutuação no crescimento econômico. Vocês dependem de commodities. Vocês claramente precisam de investimentos não só na indústria, mas para o setor de serviços, nas exportações… Essas altas taxas de juros fazem com que esse investimento seja muito difícil. Então, o efeito negativo desta alta taxa é óbvio. E a única pergunta é: há justificativa?, voltou a questionar o Nobel de economia.
Joseph Stiglitz afirmou que juros altos “não vão resolver o problema da inflação e vão levar a mais inflação”.
“A justificativas para as altas taxas de juros e tudo fica por conta da inflação, mas mesmo nos Estados Unidos, em que as taxas de juros são muito mais baixas que as de vocês, há uma grande discussão dessas altas taxas de juros não serem justificadas pela inflação que estamos vivendo. Na verdade, essas altas taxas de juros são contraprodutivas. Elas, na verdade, estão exacerbando a inflação. Se a gente analisar os dados dos Estados Unidos e de outros países no mundo, a demanda agregada não é tanto quanto as demandas de fornecimento. A gente calcula com muito cuidado nos Estados Unidos essa demanda agregada: Consumo real, demanda, investimento real, gastos governamentais e exportações líquidas. E se a gente conta tudo isso, a gente vê que tudo está substancialmente abaixo do resultado substancial. Nós vemos uma curva que sobe depois desce de novo”, ressaltou o economista.
“Então, com a inflação que nós temos nos Estados Unidos, nós vemos que isso não é causado por uma demanda excessiva. Nós temos alguns papéis de suporte que estão ali com outras fraquezas do nosso país e a gente tem taxas que estão decrescendo e que não são sinais do mercado de trabalho. E qual é a fonte da inflação? Tem sido a pandemia e os suplementos relacionados à guerra, e as assimetrias nos ajustes de preço para essas mudanças. O problema é que nós precisamos responder a esses choques com mais investimentos e a taxa de juros crescente impede esses investimentos. Eu vou dar alguns exemplos. Mais cedo nos Estados Unidos o aumento da inflação era relacionado a uma diminuição de chips para os carros e muito da inflação tinha a ver com isso. Outra fonte importante de inflação apareceu e tinha uma variedade de erupções que era na cadeia de suprimento global, era a indústria de óleo e gás e de alimentos. Outra fonte de inflação tem sido a habitação. Mas as taxas de juros crescentes não resolvem nenhum desses problemas. Deixa-os piores na verdade. Pega o caso da habitação. O crescimento das taxas de juros diminui os investimentos em habitação. Então, como que é possível nesse mundo, que se a gente quer resolver o problema da inflação com pouca habitação, e a gente vai responder a isso dizendo não vamos mais construir casas, que é o que o Federal Reserve quer fazer hoje em dia nos Estados Unidos, e isso faz com que o problema piore”, avaliou Stiglitz.
“Todo mundo que olha para os Estados Unidos vê grandes lucros, uma taxa de retorno com o capital de propriedade crescendo, mas os investimentos estão diminuindo. Normalmente, quando os retornos crescem, a gente faz mais investimentos. E por que os investimentos então estão tão baixos? por causa do poder do monopólio… Os grandes lucros estão centrados em áreas onde há muito poder de mercado”, ressaltou o economista, acrescentando que quando há este tipo de poder “nos mercados consumidores e taxas de juros crescentes e incerteza crescente também, isso leva mais a inflação. As empresas decidem se aproveitar desses preços que estão crescendo, descontando os efeitos negativos no futuro. Então, quando você aumenta a taxa de juros você desconta mais no futuro. Na verdade, isso mostra que altas taxas de juros são contra produtivas. Elas não vão resolver o problema da inflação e vão levar a mais inflação. O ponto que estou enfatizando aqui, é que pelo menos nos Estados Unidos, mas também em muitos outros países do mundo, você não pode justificar uma alta taxa de juros como uma resposta adequada à inflação”.
O economista lembra ainda, que do lado fiscal, “aumentar as taxas de juros é contra produtivo, porque isso custa para o governo. Quando a gente aumenta as taxas de juros para esses níveis, a gente faz com que os custos do serviço da dívida sejam maiores. E a gente passa por aí pelo problema do desenvolvimento sustentável de longo prazo. Porque a gente está diminuindo o dinheiro disponível no governo e a gente não está tendo investimentos mais produtivos em educação, tecnologia, todas as coisas que aumentam o crescimento econômico”, explicou.
“Nesse sentido, de novo, mesmo se a gente pensar num problema fiscal, aumentar as taxas de juros também vai ser contra produtivo. A estratégia de aumentar as taxas de juro simplesmente não pode ser defendida nessas bases, disse Stiglitz ressaltando que “as altas taxas de juros representam uma redistribuição. O dinheiro vai dos pobres para os ricos, na média, exacerbando um dos problemas mais longos do Brasil, que é essa diferença de qualidade de vida. Então, em cada uma dessas áreas, a inflação, a estabilidade fiscal e desigualdades, vão sofrer com as altas taxas de juros, que são contraprodutivas para uma boa política econômica”, disse o Nobel de economia.
Stiglitz disse que “não há crise fiscal no Brasil” e alertou que “altas taxas de juros e austeridade são políticas que exacerbam o problema fiscal e taxas baixas de juros e baixas estratégias de investimento podem na verdade aumentar a resiliência fiscal”, comentou.
Fonte: Página 8