A dita síndrome deixou afetados logo os espiões da CIA, depois os militares, os médicos etc. | Foto: Exército dos EUA/EPA

A CIA e mais quatro agências de inteligência dos EUA concluíram em 1º de março que a “Síndrome de Havana” – a “misteriosa doença” supostamente afetando agentes no exterior e diplomatas com estranhas e dolorosas sensações acústicas – “não resultou das ações de um adversário estrangeiro” ou de uma “arma de energia”, registrou o Washington Post, informando o fim de uma “revisão” em curso “há anos” em que foram reexaminados cerca de 1000 casos, em 90 países.

Em suma, queiram ou não assumir publicamente, a ‘síndrome’ não passa de histeria ou psicose. “Não havia nada”, disse ao Post uma fonte.

Os analistas examinaram grupos de casos relatados, inclusive nas embaixadas dos EUA, mas não encontraram nenhum padrão ou conjunto comum de condições que pudessem vincular casos individuais.

Eles também não encontraram evidências que sugerissem que um adversário havia usado uma forma de energia direcionada, como ondas de rádio ou feixes ultrassônicos. Em alguns casos, não havia “linha de visão direta” para o pessoal afetado que trabalhava nas instalações dos EUA.

Também não havia informações de que líderes estrangeiros, inclusive na Rússia, tivessem conhecimento ou tivessem autorizado um ataque ao pessoal dos EUA que pudesse explicar os sintomas.

A “síndrome” agora oficialmente desmentida serviu de pretexto para o governo Trump intensificar as sanções contra Cuba e desencadeou uma enxurrada de elocubrações em Washington sobre “armas de energia”, rapidamente atribuídas aos “russos malvados” e, quem sabe, aos chineses. Serviu, ainda, para acirrar a russofobia que já grassava nos EUA.

Segundo a mídia, até mesmo a hipótese de envolvimento de “representantes de uma civilização extraterrestre” chegou a ser aventada, mas acabou descartada.

Um estudo realizado por especialistas cubanas já havia apontado como causa possível das “misteriosas sensações” o som de um tipo de cigarra, comum na ilha.

A notícia foi recebida com ironia na Rússia. “A história da “síndrome de Havana” começou nos Estados Unidos como uma poderosa histeria anti-russa e terminou quase imperceptivelmente. O governo Trump acusou Moscou de orquestrar “ataques acústicos” contra diplomatas americanos em Havana. Agora a equipe de Biden relata anonimamente: a investigação acabou, a Rússia não tem culpa”, destacou o jornal Vzglyad. “Então, o que aconteceu com os funcionários das missões diplomáticas dos EUA?”, indagou.

Por sua vez, a porta-voz da chancelaria russa, Maria Zakharova, respondendo a um jornalista, observou de forma zombateira: “então, nossa imagem do “império do mal” está desmoronando diante de nossos olhos?”.

“Deixe-me lembrá-lo de que, por vários anos, a mesma comunidade de inteligência dos EUA e a liderança da CIA, bem como a mídia americana, afirmaram que diplomatas credenciados foram torturados, causando-lhes alucinações e náuseas. Supostamente, os serviços especiais dos países do “eixo do mal”, principalmente a Rússia, estavam por trás disso”, ela acrescentou.

Durante uma visita à Rússia em 2021, o diretor da CIA Burns havia falado em “consequências” para Moscou na agora descartada acusação.

O americanista Dmitry Drobnitsky assinalou como as “investigações” norte-americanas entraram em um impasse quando, depois de Havana, Moscou e Pequim, a “síndrome” se manifestou em Paris.

ATAQUES DE PÂNICO?

“O que Havana tem em comum com Paris do ponto de vista político? Havia uma versão de que esses fenômenos são causados por fatores puramente naturais e naturais. Mas também aqui Cuba e França não têm nada em comum. Então surgiu uma versão “psicossomática” mais convincente. Ou seja, estamos falando de ataques de pânico banais, de uma neurose que se espalhou pelo corpo diplomático dos EUA e agentes adjacentes e assim por diante”, lembra o especialista.

Para Drobnitsky, psiquiatras profissionais deveriam participar de tal avaliação. “Se uma investigação confirmar tal hipótese, pessoalmente não ficarei surpreso. A perspectiva da política externa dos EUA é extremamente neurótica, e é por isso que os diplomatas americanos desenvolvem um senso de identidade neurótico e doloroso. “Nós” somos pelo bem, todos os outros são pelo mal, ou Deus sabe pelo quê. Nessa situação, a sobrecarga psicológica é inevitável. Você pode facilmente começar a sentir sabe-se lá o quê”, observou o acadêmico.

Segundo Drobnitsky, é uma situação estranha”, onde não podem ser descartados a priori casos de simulação, já as autoridades começaram a pagar o dinheiro do seguro às vítimas, e muito dinheiro.

Em um comunicado, o diretor da CIA, William J. Burns, disse que os analistas conduziram “uma das maiores e mais intensivas investigações da história da Agência. Eu e minha equipe de liderança apoiamos firmemente o trabalho realizado e as descobertas.”

“Quero ser absolutamente claro: essas descobertas não questionam as experiências e problemas reais de saúde que o pessoal do governo dos EUA e seus familiares – incluindo os próprios oficiais da CIA – relataram enquanto serviam nosso país”, disse Burns.

Declaração que parece indicar propensão em considerar a histeria como causa fundamental do que vinha sendo impropriamente chamado de “síndrome de Havana”.

“Continuaremos alertas a quaisquer riscos à saúde e ao bem-estar dos funcionários da Agência, para garantir o acesso aos cuidados e oferecer aos funcionários a compaixão e o respeito que eles merecem”, asseverou Burns.

A porta-voz da Casa Branca enfatizou que as conclusões da CIA não terão interferência na assistência médica e financeira às “vítimas da síndrome”.

Fonte: Papiro