Carta enviada a sauditas revela mentira sobre destino das joias
No atual regime de informação, proliferam documentos sobre o labirinto burocrático pelo qual as joias, que Jair e Michelle Bolsonaro prefeririam que ninguém soubesse que existiam, trafegaram. São recibos, cartas, ofícios, depoimentos, e até vídeos, comprovando que tudo que Bolsonaro disse sobre o assunto foi um festival de mentiras e versões distorcidas dos fatos. Como foi habitual durante seu governo.
Segundo informação do Estadão, uma carta revela que o governo Bolsonaro mentiu aos sauditas sobre o destino das joias que foram dadas como presente pelo país à ex-primeira-dama Michelle.
De acordo com a reportagem, o então ministro Bento Albuquerque informou em carta à Arábia Saudita que as joias foram incorporadas à “coleção oficial brasileira” conforme determinam “a legislação nacional e o código de conduta da administração pública”, quando, na verdade, elas estavam apreendidas num cofre da Receita Federal. A carta não menciona o incidente no aeroporto de Guarulhos.
A carta foi enviada em 22 de novembro de 2021, quase um mês depois da apreensão das joias, foi endereçada a Abdulaziz bin Salman Al Saud, ministro de Minas e Energia da Árabia Saudita. No texto, Albuquerque também agradeceu a recepção que a comitiva brasileira teve durante a passagem pelo país naquele outubro.
Por um ano, auditores da Receita Federal sofreram pressão da chefia do órgão feita por Julio Cesar Gomes, e passaram a ter receio de acessar os sistemas ligados ao assunto ou falar sobre o tema. Além da pressão para que as joias fossem liberadas extraoficialmente, auditores perceberam que os itens destinados a Michelle foram “esquecidos”, ao ponto de ser emitido um auto de infração com declarou da “pena de perdimento aos bens por abandono”. Como não houve manifestação, o “abandono” foi registrado em 25 de julho de 2022.
Na Receita, a atitude foi vista como protelatória devido ao período eleitoral, já que a urgência sobre o caso só seria retomada após a derrota de Bolsonaro nas urnas.
O ex-presidente recebeu pessoalmente e se apropriou de um segundo pacote de joias dado pelo governo da Arábia Saudita. Ele mesmo confessou a apropriação. O pacote também foi trazido de forma ilegal ao país.
Fuzil do príncipe árabe
Outro tema para apuração pelo Tribunal de Contas da União (TCU) foi a decisão de Bolsonaro de ficar com fuzil e pistola que ganhou nos Emirados Árabes em 2019. A informação foi divulgada pelo colunista Guilherme Amado, do Metrópoles, a partir de relatos de integrantes da comitiva que foi ao Oriente Médio com Bolsonaro.
O TCU está preparando uma auditoria sobre todos os itens recebidos por autoridades de 2019 a 2022, incluindo o fuzil e a pistola. A tendência é que Bolsonaro seja obrigado a devolver os presentes de que tenha se apoderado para que sejam incorporados ao patrimônio da União. Outra questão a ser avaliada é se o uso de avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para transporte desse tipo de objeto não seria contrabando.
Em outubro de 2019, o ex-presidente voltou ao Brasil de uma viagem à região com uma pistola e um fuzil, este último customizado com seu nome. As armas também são avaliadas a preços que ultrapassam o decoro ético do funcionalismo público. O fuzil de calibre 5,56 mm e a pistola, 9 mm podem custar quase R$ 60 mil, a depender da procedência.
Presentes de um príncipe de família real dos Emirados Árabes, o fuzil foi entregue a um terceiro, que repassou o bem a Bolsonaro dentro do avião da Força Aérea Brasileira (FAB). Na mesma viagem, membros da comitiva receberam relógios de luxo que foram obrigados a devolver por violarem as regras do Tribunal de Contas da União (TCU). Os relógios custavam até R$ 53 mil.
“O recebimento de presentes de uso pessoal com elevado valor comercial por agente público em missão diplomática extrapola os limites de razoabilidade”, registrou o TCU em acórdão de 1º de março.
Devem ser destinados ao patrimônio da União todos os presentes recebidos em audiências de autoridades com outros chefes de Estado ou de governo. A exceção são apenas “itens de natureza personalíssima (medalhas personalizadas e grã-colar) ou de consumo direto (bonés, camisetas, gravata, chinelo, perfumes, entre outros)”, segundo o tribunal.
Pessoas que presenciaram o recebimento do fuzil e da pistola dizem que os bens teriam sido registrados pelo Exército, como demanda a legislação brasileira no caso de importação de armas. Os assessores do presidente confirmaram à imprensa que as duas armas foram comunicadas ao Fisco e ao Exército, para que fossem registradas.
(por Cezar Xavier)