BCE eleva juros e ações do Deutsche Bank desabam
As ações do Deutsche Bank – o maior banco alemão e um dos 30 no mundo considerados capazes de ser um risco sistêmico – caíram acentuadamente na sexta-feira (24), derrubando outros grandes bancos europeus, reacendendo os temores de uma crise cada vez maior no setor bancário e gerando pânico na cúpula trimestral da União Europeia em realização em Bruxelas.
Nos dois últimos fins de semana, sucessivamente colapsaram os bancos Silicon Valley e Signature nos EUA e o Credit Suisse na Suíça. No dia 16, o BCE decidiu aumentar os juros em 50 pontos-base apesar da turbulência em curso, enquanto o Fed elevou os juros em 25 pontos-base na quarta-feira (22).
As ações do Deutsche chegaram a cair mais de 14% na Bolsa de Frankfurt, mas reduziram as perdas para fechar com queda de 8,6%, para 8,43 euros por ação. Foi o terceiro recuo consecutivo, com as ações perdendo mais de um quinto de seu valor até agora neste mês.
Analistas atribuíram ao súbito repique nos swaps de inadimplência de crédito – uma forma de seguro para os detentores de títulos de uma empresa contra sua inadimplência – para 173 pontos-base na noite de quinta-feira, de 142 pontos-base no dia anterior.
Também caíram acentuadamente os títulos de nível um (AT1) do Deutsche Bank – a mesma classe de ativos cuja baixa contábil no acordo de resgate do Credit Suisse causou perda de 17 bilhões de euros a seus detentores. Os custos crescentes do seguro de dívida foram um prelúdio para o resgate do Credit pelo UBS.
As perdas nas bolsas se estenderam a outros bancos europeus, como o Commerzbank, UBS, Société Génerale, Barclays, BNP Paribas e Raiffaisen. “O sentimento subjacente ainda é cauteloso e, neste ambiente, ninguém quer arriscar no fim de semana”, disse o analista-chefe da Nordea, Jan von Gerich, citado pela Reuters.
Na véspera, a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, afirmara, diante das dificuldades vividas pelo First Republic Bank e outros bancos regionais, que as ações de emergência usadas para apoiar os clientes do SVB e do Signature poderiam ser implantadas novamente. De acordo com a Bloomberg, ela convocou uma reunião de emergência com os reguladores bancários dos EUA e com o Fed. Mais um domingo de emoções fortes?
TURBULÊNCIA
Em Bruxelas, líderes da UE tentavam acalmar os ânimos, com o primeiro-ministro alemão Olaf Scholz, ao ser perguntado por repórteres se o Deutsche Bank poderia ser o próximo Credit Suisse, asseverou que “não há motivo para preocupação”.
Por sua vez, a presidente do BCE, Christine Lagarde, repetiu, como fizera na semana anterior, que o sistema financeiro europeu era “resiliente” e que o BCE estava “totalmente equipado” para fornecer “liquidez” se necessário. O presidente francês Emmanuel Macron, cuja renúncia é pedida quase diariamente nas ruas da França, garantiu os “fundamentos sólidos” dos bancos europeus.
O Deutsche Bank disse na sexta-feira que resgataria antecipadamente US$ 1,5 bilhão em títulos de nível 2, na tentativa de reduzir a turbulência. No ano passado, o Deutsche Banco registrou seu maior lucro anual desde 2007.
Em 2008, o Deutsche Bank foi fortemente atingido pelo colapso financeiro global e precisou de executar uma dura reestruturação, que envolveu milhares de corte e o recuo da investida sobre a especulação nos EUA para voltar a ter foco na Europa. No período 2011-13, nova crise abalroou os bancos europeus.
Segundo a cnbc, autoridades europeias expressaram sua frustração com a falta de controles regulatórios nos EUA, onde surgiu a recente turbulência bancária. “Eles estão nervosos com o potencial contágio de seu próprio setor bancário, principalmente porque não faz muito tempo que os bancos europeus estavam no auge da crise financeira global”.
Mas – acrescenta – a UE ainda é vulnerável a choques, uma vez que possui uma união monetária dentro da zona do euro, onde 20 nações compartilham o euro, mas carece de uma união fiscal.
“ESTRESSE PODE SE ESPALHAR”
Analisando o quadro, a agência de classificação de risco Moody’s advertiu que “quanto mais tempo as condições financeiras permanecerem apertadas, maior o risco de que ‘o estresse se espalhe para além do setor bancário, desencadeando maiores danos financeiros e econômicos’”.
De acordo com o portal Zero Hedge, que cita uma avaliação da Goldman Sachs, “a dor nos bancos europeus” é decorrente de operadores tentando se desvencilhar de papéis alavancados e opacos após o colapso do Credit Suisse.
O ZH advertiu ainda que, segundo um relatório do Fed, foi observado “um aumento sem precedentes no Repo oficial estrangeiro ($60 bilhões) sob a nova facilidade de repo FIMA do Fed”. O que significa que “a corrida offshore por dólares está viva e bem, e alguém realmente precisou de acesso para dólares”. Repo é o chamado mercado de recompra (overnight), por meio do qual as empresas financeiras emprestam umas às outras todos os dias.
A suposição – acrescenta o portal- era de que se tratava do Credit Suisse (ou UBS) suprindo alguns déficits, mas, com a ação dos últimos dias, “outros estão preocupados com o fato de que há mais em andamento no sistema bancário da UE”.
Na semana passada, o Fed e o BCE – mais o Banco Nacional Suiço, o Banco do Canadá, o Banco da Inglaterra e o Banco do Japão – anunciaram uma ação coordenada para aumentar o fornecimento de liquidez por meio de linhas de swap de liquidez em dólares americanos, cuja frequência passará de semanal para uma diária nervosa, o que irá pelo menos até o final de abril.
Fonte: Papiro