Presidente boliviano, Luis Arce | Foto: Arquivo

O presidente Luis Arce defendeu nesta segunda-feira (20) a soberania da Bolívia sobre o lítio, reafirmou a importância estratégica da industrialização de “um dos metais mais preciosos do mundo” e repudiou a ameaça lançada pelos Estados Unidos contra as parcerias que o país vem concretizando para desenvolver.

“Recebemos mensagens dos Estados Unidos em que a chefe do Comando Sul (Laura Richardson) disse estar ‘preocupada’ com o fato de a Bolívia já ter assinado um contrato com uma empresa chinesa, que é a número um do mundo em industrializar nosso lítio”, declarou Arce, refutando a intromissão dela durante fala aos deputados norte-americanos.

Conforme o presidente, “a Bolívia, fiel à proteção da soberania e de seus recursos naturais, assinou um contrato para industrializar nosso lítio, tanto nas regiões de Oruro (oeste) como em Potosí (sudoeste)”. Com esses investimentos – chamados por Richardson de “atividade maligna” – explicou Arce, “sairão mais de 42 indústrias que vão gerar empregos para os bolivianos e isso preocupa alguns países que estão de olho no lítio”.

O Comando Sul ficou célebre por estar envolvido desde a sua criação, quando da ocupação do Panamá em 1903, até hoje com políticas de terrorismo de Estado, organização de golpes, assassinatos, torturas e desaparecimentos na região. A preocupação expressa pela sua chefe é que a parceria com potências como a China e a Rússia possibilitem a libertação de países até então submetidos aos ditames de Washington e atrelados a sua economia e dominação.

“Acho que por muito tempo ignoramos nosso próprio quintal e permitimos que a Rússia, a China e o Irã, adversários dos Estados Unidos, fizessem grandes incursões em nossa região”, vociferou o legislador gusano-americano Carlos Giménez, conclamando a Câmara de Representantes dos EUA a agir.

Em janeiro deste ano, a Yacimientos de Litio Bolivianos (YLB) assinou um acordo com o consórcio chinês o consórcio CATL BRUNP & CMOC (CBC) para a construção de duas plantas de produção de carbonato de lítio com tecnologia EDL (Direct Extraction of Lithium) para baterias, cada uma com capacidade de até 25 mil toneladas por ano, em Uyuni e Coipasa, uma em Potosí e outra em Oruro.

Mas, apesar das queixas da general quatro estrelas, a demanda global pelo recurso natural não renovável não para de crescer, não só pelo aumento vertiginoso da produção de baterias para veículos elétricos, mas também por suas inumeráveis aplicações nas áreas de energia solar e eólica, entre outras.

Ocupando um lugar cada vez mais central na geopolítica global, o chamado “Triângulo do lítio” (Bolívia, Argentina e China) ostentam 68% das reservas mundiais do cobiçado minério. Segundo o relatório Lítio na América do Sul, divulgado em 2022 pelo Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Clacso) e pelo Instituto de Estudos Latino-Americanos e do Caribe (IEALC), a Bolívia conta com mais de 21 milhões de toneladas; a Argentina, 14,8 milhões; e o Chile, 8,3 milhões.

Durante o Congresso da Confederação Nacional das Mulheres Camponesas Indígenas da Bolívia Bartolina Sisa, em Tarija (sul), o presidente alertou que de posse de tamanhas riquezas, o país voltou a ser o centro de disputa das forças do retrocesso.

“A direita internacional e nacional está voltando seus olhos para a Bolívia e a direita nacional está começando a levantar a cabeça também em nosso país”, assinalou Arce, frisando que o país vive “um momento histórico muito importante” devido à transição rumo a industrialização de seus recursos naturais em benefício do povo boliviano.

Por isso, destacou a importância de congressos que reúnam movimentos sociais para debater e definir critérios sobre temas tão relevantes, como o recente ataque da direita internacional, que quer mais uma vez se beneficiar de recursos que não lhe pertencem.

O ministro de Hidrocarbonetos da Bolivia, Franklin Molina, se uniu ao presidente Arce nas críticas às declarações de Laura Richardson.

Molina lamentou que Richardson e seu entorno “desconheçam a realidade da América Latina, utilizando termos tão agressivos como ‘quintal’”.

“Nós não admitimos a ingerência de nenhum Estado. A Bolívia tem sua definição quanto à industrialização de seus recursos naturais. E aqui não há consulta ao FMI nem ao Banco Mundial, nem a nenhum país do norte para desenvolvermos nosso próprio destino. Portanto, como país soberano temos decidido trabalhar com aquele que traga as melhores condições ao país”, declarou Molina.

Estas declarações “demonstram pouca capacidade de análise, mas ao mesmo tempo, pouco respeito aos países do triângulo do lítio. É um total desconhecimento da importância do nosso continente no desenvolvimento estratégico em escala mundial quanto à geopolítica energética”, acrescentou.

PRESIDENTE DA CÂMARA

O presidente da Câmara de Deputados da Bolívia, Jerges Mercado, também denunciou a intromissão dos EUA devido a suas reservas de lítio e de água doce.

“Nossa posição é clara, queremos denunciar a contínua ingerência de Estados e potências externas que colocam em risco a paz mundial”, disse ainda Jerges Mercado

“Estes atores violam a Carta das Nações Unidas e atuam em função de seus próprios interesses, chegando inclusive a dar golpes de Estado, já sejam os conhecidos ‘golpes brandos’, assim como golpes tradicionais. Esta é uma questão lamentável que deve ser abordada com urgência”, alertou Mercado.

O deputado alertou para a atenção das potências ao triângulo do lítio, do qual a Bolívia é detentora da maior reserva mundial: “Faço um chamado aos países do mundo para trabalhar juntos e defender a paz mundial, evitando a exploração dos recursos naturais e estratégicos e destacou a necessidade de que sejam “tomadas medidas concretas para preservar estes recursos e garantir que estejam disponíveis para as gerações futuras” e destacou a “importância de levantar a voz e denunciar a ingerência externa na Bolívia e no mundo”.

O presidente do Movimento Ao Socialismo (MAS), Evo Morales, reforçou a denúncia: “Para o Comando Sul dos EUA, a China é uma influência ‘maligna’ em nossa região. Mas para os povos livres, a China é um aliado estratégico que oferece cooperação sem condições”.

Fonte: Papiro