Tel Aviv foi palco da maior manifestação contra o golpe fascista em curso | Foto: Jack Guez/AFP

Quatrocentos mil israelenses tomaram as ruas de Tel Aviv, Haifa, Jerusalém, Beer Sheva, Ashdod, Herzlia e Netania – ao todo uma centena de localidades -, neste sábado, dia 5, para exigir a retirada do parlamento israelense, o Knesset, do projeto que anula a Corte Suprema em seu poder independente em defesa dos direitos cidadãos expressos na chamada Lei Básica e mesmo na Declaração de Independência do Estado de Israel.

Pelo projeto que avança a toque de caixa sob o comando do governo fascista de Natanyahu, Smotrish e Gvir, a Corte Suprema não pode determinar em conflito com a Lei Básica aprovada pelo Knesset, a não ser por voto unânime da Corte e, mesmo assim, uma lei contestada por esta corte pode ser anulada pelo mesmo Knesset bastando para isso 61 votos em um total de 120 deputados.

A supressão do Poder Judiciário já é gravíssima em qualquer país, tornando-se mais danoso em um Estado que mantém sob ocupação militar milhões de palestinos, lhes subtrai os direitos cidadãos há mais de 50 anos e financia o assalto sistemático a suas terras.

MOBILIZAÇÃO EM DEFESA DA DEMOCRACIA

A verdadeira sublevação social que ocorre em Israel, demonstra uma consciência cidadã, que parecia adormecida e que traz esperança na vitória sobre o fascismo que tenta açambarcar o poder e implantar uma ditadura com agravante da característica de apartheid sobre a população palestina.

A mobilização de centenas de milhares ocorreu pela nona semana consecutiva, incluindo agora, protestos massivos também no meio das últimas semanas. Os organizadores do protesto já chamaram uma nova mobilização “Dia de Perturbação” para a próxima quarta-feira, dia 9, onde prometem cerco ao Knesset pela multidão e bloqueio de estradas.

No final da manifestação em Tel Aviv houve confronto entre a polícia e os manifestantes que tentavam ocupar a Avenida Kaplan, uma das artérias centrais de Tel Aviv que foi bloqueada pelos policiais. No confronto, a polícia israelense usou cavalaria, brucutus com canhões de água e granadas de gás lacrimogênio e de percussão. A ação policial foi resultado do incitamento por parte do atual ministro da Seguança Nacional, Itamar Ben Gvir que tem chamado a polícia a intervir contra o que chama de “anarquistas”.

Um fato novo foi a presença da ex-ministra do Likud, Limor Livnat, do partido de Netanyahu, no comécio de Tel Aviv. Ela chamou os deputados do seu partido a se posicionarem contra o golpe do premiê contra o Judiciário: “Vocês estão ouvindo, vocês estão vendo tudo isso aqui. Vocês sabem e entendem, aonde o golpe está nos levando. Por que se mantêm em silêncio?”.

O renomado historiador israelense Yuval Noah Harari, também falou no ato em Tel Aviv. “Esse governo não sabe com quem está se metendo”, proclamou. “Estamos diante de um teste histórico para os israelenses, e não há retorno”.

Yuval chamou os professores a, durante este período de lutas, transformarem todas as instituições educacionais em centros de debate exclusivamente sobre democracia e direitos humanos”.

“Democracia”, acrescentou o historiador, “é um acordo onde os cidadãos respeitam as decisões do governo – na condição de que este governo mantenha as liberdades básicas dos cidadãos. Quando um dos lados quebra o acordo, o outro lado não está mais obrigado a ele”.

O ex-premiê Yair Lapid respondeu às declarações de Givr, chamando os manifestantes de anarquistas: “O perigoso palhaço de Tik-Tok continua incitando e encorajando a violência. Nunca tivemos um ministro de governo que, abertamente semeou para criar confrontos violentos entre policiais e cidadãos”.

Na cidade de Ashdod, reduto do partido Israel Beiteinu, (Israel Nossa Casa) o líder Avigdor Liberman, que foi a um protesto pela primeira vez, deixou claro que “este governo levou todo o país ao caos e a uma crise constitucional sem precedentes”.

Liberman conclamou o presidente Isaac Herzog “a se colocar de pé diante de todos os cidadãos israelenses e dizer claramente que todas as instituições nacionais e seus líderes devem aderir em primeiro lugar às determinações legais da Suprema Corte”.

Na pequena cidade de Modiín, ao sul do país, milhares se manifestaram diante da casa do ministro da Justiça, Yariv Levin, que é o formulador da lei golpista.

A ex-ministra do Avodá, o partido trabalhista, Yuli Tamir, encabeçou o protesto em Jerusalém que se concentrou diante da residência do presidente Herzog e a líder do seu partido, Merav Michaeli falou no ato em Haifa, ao lado da ex-juíza da Corte Suprema Ayala Procaccia e da ex-deputada do Meretz, Gabi Lasky.

Michaeli, criticou a proposta do presidente israelense de que a oposição sente para negociar com o grupo fascista de Netanyahu e criticou a adesão de Lapid e Ganz à ideia, deixando claro que “a conduta da coalizão prova, sem dúvida, que eles não têm desejo de dialogar. Eu, novamente, conclamo Lapid e Gantz a informar ao presidente que, apesar de suas boas intenções, não vamos ter nenhuma conversa com este grupo de predadores”.

“O objetivo declarado é tramar contra a democracia, enquanto isso, eles aprontam armadilhas e nos sinalizam na forma de ‘dialogo’. Chegou a hora de parar de cair em suas armadilhas e nos unirmos à luta determinada de centenas de milhares de cidadãos israelenses que tomam as ruas semana após semana e assim deter este golpe com seus corpos. É o único caminho para a vitória”, finalizou Michaeli.

Shomo Artzi, um dos cantores e compositores mais populares de Israel, falou durante uma apresentação a uma multidão em Tel Aviv: “Há semanas tenho sido cobrado, questionado se tenho medo de me fazer ouvir. Eu sempre pensei que minhas opiniões estivessem profundamente expressas em minhas canções, mas estamos em uma situação em que eu realmente tenho medo do que vai ser de nós, ainda mais na velocidade com que isto está se dando.

Em meio à avalanche de manifestações, o público israelense tomou conhecimento de que a quase unanimidade dos reservistas (37 de um total de 40) que integram o Esquadrão 69, de pilotos especializados em caças F-15, se recusa a se apresentar quando chamados a treinar ou a entrar em combate enquanto estiver em pauta o projeto de extinção do judiciário.

Assim como estes pilotos, milhares de reservistas de todas as forças já se declararam em recusa.

A declaração do Esquadrão 69 provocou uma crise no interior da força armada israelense pois é uma equipe de elite na Força Aérea, a principal formação de combate israelense. Em Israel o reservista entra em treinamento e mesmo em combate todos os anos após o serviço regular até atingir a idade de 60 anos.

Assim como reservistas desse agrupamento, ex-chefes do Estado Maior já se posicionaram e participam das manifestações, o que no caso israelense mostra o grau de mobilização da sociedade israelense.

Fonte: Papiro