Território Yanomami está sendo severamente atingido pelo garimpo ilegal, incentivado pelo governo Bolsonaro | Foto: Christian Braga

Levantamento divulgado pela Hutukara Associação Yanomami (HAY) mostra que o garimpo ilegal cresceu 54% em 2022, último ano do governo Jair Bolsonaro. No período, 5.053 hectares da Terra Indígena (TI) Yanomami foram desmatados, consequência da atividade criminosa no território.

O estudo, realizado pelo Map Biomas em parceria com a HAY, foi iniciado em 2018 e identificou uma alta exponencial do desmatamento pela ação do garimpo. De acordo com os dados, no primeiro ano foram devastados 1.236 hectares, o que representa uma alta de 309% em relação ao ano passado.

O sistema de Monitoramento do Garimpo Ilegal é feito pela Hutukara a partir de imagens da Constelação Planet, satélites de alta resolução espacial. Os equipamentos conseguem detectar com precisão e mais frequência de vigilância áreas muitas vezes não capturadas por outros satélites. Com o monitoramento manual, as atualizações são registradas duas vezes por mês.

Os dados mostram o desmatamento na área que é preservada, mas que é alvo da atividade garimpeira.

Os focos de destruição foram identificados nos rios Uraricoera, ao Norte da Terra Indígena Yanomami, e Mucajaí, região central. A região de Waikás, no Uraricoera, responde por 40% do desmatamento, com cerca de 2 mil hectares devastados. O rio Magalhães, afluente do Mucajaí, tem 20% do impacto, com cerca de mil hectares. A terceira região mais afetada é a de Homoxi, na cabeceira do Mucajaí, com 15% da destruição, que equivale a cerca de 760 hectares.

DESTRUIÇÃO

Estevão Benfica, geográfico do ISA, diz que os efeitos do garimpo vão além do que é observado através do satélite, que é focado no desmatamento. “Eles também afetam as disseminações de doenças, deterioração no quadro de saúde das comunidades, produção de conflitos intercomunitários, aumento de casos de violência e diminuição da qualidade de água da população com destruição dos corpos hídricos”, explica. “Tudo isso somado compromete a capacidade de viver nas comunidades”, completa Benfica.

Ele aponta ainda outra consequência da presença do garimpo na terra indígena. Ao se deslocarem de uma área para outra, os garimpeiros colaboram para a proliferação de doenças. Os invasores chegam a levar novas cepas de malária de uma região para outra, por exemplo.

Segundo o Sivep Malária, sistema de monitoramento do Ministério da Saúde, entre 2020 e 2021, mais de 40 mil ocorrências de malária foram detectadas na Terra Indígena Yanomami. A disparada de casos da doença coincide com o aumento da área devastada.

Só em 2021, 21.883 pessoas contraíram a doença, o maior registro desde 2003. O monitoramento do Mapbiomas, que utiliza o satélite Landsat, aponta saltos sucessivos no desmatamento pelo garimpo desde 2016.

Antes, em 2020, houve 19.828 registros e em 2019, 18.187. Nestes anos a incidência de casos de malária bateu recorde. Os anos de 2003 e 2004 tiveram os registros mais baixos, com 246 e 783 casos, respectivamente.

Ainda conforme o monitoramento, em 2007 houve 5.460 registros da doença. Nos anos seguintes, 2008 e 2009, houve uma redução nos novos casos: 4.966 e 4.188. Em 2010 são contabilizados 6.745 e nos anos seguintes os números voltam a recuar até atingir um novo recorde em 2017 com 7.891. Nos anos posteriores, a doença seguiu, atingindo novos picos.

SITUAÇÃO DE DESASTRE

A Terra Indígena Yanomami é a maior reserva indígena do país, com mais de 10 milhões de hectares. O número corresponde à extensão aproximada do estado do Pernambuco, onde vivem pouco mais de 30 mil indígenas.

A área, que deveria, por lei, ser preservada, tem sofrido com a investida do garimpo ilegal. A HAY estima que em 20 mil o número de garimpeiros atuando no local. Nos anos 90, houve a desintrusão (desocupação e expulsão) do garimpo da terra indígena e o número de invasões caiu significativamente.

Em 2016, porém, passou-se a registrar um aumento da presença desses invasores na terra Yanomami, com tendência de crescimento nos anos seguintes. Com a ascensão de Bolsonaro à presidência da República em 2018, o número de garimpeiros na TY ganhou impulso. Com o Ibama e a Funai aparelhados, aliado ao enfraquecimento da legislação ambiental pelo (des) governo–e alterações na legislação para facilitar a atuação dos criminosos, – o garimpo atingiu patamares de indústria, conforme relata a repórter da TV Globo Sonia Bridi.

“Máquinas! Uma bomba de garimpo custa R$ 250 mil. São centenas de bombas (de água) lá dentro. Mais de 100 mil helicópteros e aviões dentro da Terra Indígena Yanomami, apreendidos pela polícia ou em operação”, denuncia a jornalista. Ela acompanhou a comitiva do presidente Lula a Roraima há cerca de duas para acompanhar de perto a situação de caos na Terra Yanomami.

“Isso tudo onde vivem as comunidades”, completou Bridi, que permaneceu por 24 horas no território, e visitou algumas aldeias para realizar a reportagem veiculada pelo Fantástico no último domingo (29), denunciando a crise humanitária que atinge os yanomamis em consequência da ação do garimpo na região.

Fonte: Página 8