Lula diz não à adesão do país à “Guerra Fria”, como queria Nuland, ligada aos nazis de Kiev
Uma semana depois de o presidente Lula haver dito pessoalmente ao presidente Biden durante a visita oficial aos EUA que o Brasil “não quer participar da Guerra Fria de ninguém” em relação ao conflito na Ucrânia, a subsecretária do Departamento de Estado, Victoria Nuland, voltou à carga na quinta-feira (16), dizendo que o Brasil tem de “calçar os sapatos da Ucrânia”.
Não foram exatamente “sapatos” que foram colocados pelos maníacos de guerra de Washington na Ucrânia desde que, em 2008, o então presidente W. Bush anunciou seu plano de anexação da Ucrânia e Georgia à Otan, e em 2014 foi consumado o golpe de Estado promovido pela CIA, usando os nazistas como tropa de choque.
Madame Nuland é aquela senhora que viralizou em 2014, ao nomear “Yats” (Arseniy Yatsenyuk) como primeiro-ministro do regime saído do golpe, durante telefonema com o embaixador norte-americano em Kiev, acrescentando a imprecação “f***-se a União Europeia”. No mesmo telefonema, ela incriminou o então vice Biden nas “operações” em curso.
Antes da vitória do golpe, ela estivera pessoalmente na praça Maidan distribuindo rosquinhas – e, dizem, notas de 100 dólares –, confraternizando com os neonazistas e arruaceiros ali acampados, com o senador republicano John McCain a tiracolo. Aliás, McCain foi fotografado ali, confabulando alegremente com o mais notório nazista ucraniano até então, Oleh Tyahnybok.
Agora foi a mesma Victoria Nuland que sapateou em cima da soberania do povo ucraniano para jogar o país na divisão e no conflito, quem veio – com quase inacreditável cara de pau, no encontro nos Estados Unidos, querer dar a Lula lições sobre “soberania” da Ucrânia ou de qualquer país.
Dez dias antes do encontro na Casa Branca, ao receber a visita do primeiro-ministro alemão Olaf Scholz, o presidente Lula recusou o pedido de Berlim de munição para os tanques Leopard 1 prometidos a Kiev, salientando que “o Brasil não tem interesse em passar as munições para que elas sejam utilizadas na guerra”.
“O Brasil é um país de paz”, frisou o presidente Lula, por isso, “não quer ter qualquer participação mesmo que indireta” nesta guerra. “Até agora a palavra paz é muito pouco utilizada”, disse, afirmando que “quando um não quer, dois não brigam”.
Para o Brasil, o central é conseguir com que as partes negociem a paz, com a ajuda de países não envolvidos na guerra. Posição que reflete no essencial o sentimento da América Latina. “A Argentina e a América Latina não vão, não pretendem enviar armas nem para a Ucrânia nem para qualquer outra zona de conflito”, disse o mandatário Alberto Fernández.
EXTENSA FICHA
É extensa a carreira de intervencionismo de Victoria Nuland. De 2003 a 2005, durante a invasão que causou a guerra do Iraque, foi a vice-conselheira de política externa do vice-presidente Cheney. Antes, sob o presidente Clinton, foi vice-diretora de assuntos da ex-União Soviética de 1993 a 1996, justo no período da primeira guerra da Chechênia.
De 2005 a 2008, atuou como embaixadora dos EUA na Otan, quando concentrou-se na mobilização dos europeus na ocupação do Afeganistão.
No telefonema de 2014 que vazou, Nuland enunciou como co-partipantes no golpe, além do já citado Biden, Jake Sulivan e Antony Blinken, os dois com vínculos com a diáspora ucraniana nos EUA, integrada por colaboracionistas do nazismo fugidos após a II Guerra e cevada pela CIA.
Subsecretária de Estado de Biden, coube a Nuland ir a Kiev em novembro de 2021 para nomear o fascista Dmitro Yarosh como “conselheiro” político do chefe do exército ucraniano, general Valery Zaluzhnyi.
Em março de 2022, em depoimento ao Congresso dos EUA, Nuland admitiu a existência na Ucrânia de uma rede de laboratórios biológicos ligados ao Pentágono, dizendo temer que os russos tomassem tais instalações de ‘pesquisa’.
Nuland é casada com o notório neocon Robert Kagan, associado ao Brookings Institution, e cofundador do Projeto para o Novo Século Americano, criado para perpetuar o mundo unipolar sob Washington, inspirador da invasão de sete países árabes em cinco anos, e que tinha como plano impedir que qualquer país viesse a competir com os EUA no domínio do planeta por pelo menos um século.
DO GOLPE DE 2014 À GUERRA POR PROCURAÇÃO
Sem o golpe de estado de 2014 e o plano de W. Bush de 2008 de anexar a Ucrânia à Otan não existiria o atual conflito. As áreas historicamente de predomínio dos russos étnicos se revoltaram contra o golpe da CIA e o fascismo, à medida em que a perseguição aos de fala russa crescia.
A solução pacífica, com o Donbass permanecendo dentro da Ucrânia, com autonomia e direito ao uso do idioma russo, previstos nos acordos de Minsk, mediados pela França e Alemanha, foi sabotada pelo regime de Kiev, que depois se declarou desobrigado do acordo. O mesmo regime insistiu na anexação pela Otan e, na Conferência de Segurança de Munique de 2021, o próprio Zelensky anunciou a intenção de ter armas nucleares. Ao longo de oito anos, foram 14 mil mortos no Donbass, além de bombardeios ucranianos quase diários contra alvos civis.
Em dezembro de 2021, a Rússia apresentou aos EUA uma proposta de solução negociada, mas o novo regime desencadeou a “desrussificação” e a “descomunização”, e lançou as milícias fascistas contra os opositores.
A Rússia tentou durante oito anos uma saída à Otan, com a proposta de manutenção da neutralidade da Ucrânia e de restauração na Europa do princípio da segurança coletiva e indivisível, com o retorno das forças da Otan às linhas vigentes em 1999, ano de assinatura do Ato Fundador Rússia-Otan, sob garantias juridicamente vinculantes. Quando da reunificação alemã, os EUA e a Otan se comprometeram a não avançar um centímetro para leste da fronteira alemã. EUA e Otan se recusaram a cumprir o compromisso.
CONFISSÕES
Em dezembro passado, a ex-primeira-ministra Angela Merkel e o ex-presidente francês François Hollande confessaram que, ao invés da pacificação, o objetivo dos Acordos de Minsk foi ganhar tempo para a Otan rearmar a Ucrânia.
Em fevereiro, com a Ucrânia passando a quintuplicar em uma semana os bombardeios ao Donbass, e diante da presença de metade do exército ucraniano na linha de separação de forças, fortificada por Kiev por oito anos seguidos, ameaçando uma ofensiva contra forças antifascistas menores, a Rússia renunciou aos acordos de Minsk, reconheceu as duas repúblicas populares e, sob o artigo 51 da Carta da ONU, o direito à autodefesa, desencadeou sua operação militar especial para “desnazificar” e “desmilitarizar” a Ucrânia.
Era voz corrente que o regime de Kiev planejava repetir no Donbass a limpeza étnica cometida contra os sérvios da Krajina, centenas de milhares expulsos das terras em que viviam há séculos, pela Croácia, sob direção da Otan, no processo de esquartejamento da Iugoslávia nos anos 1990.
BORIS JOHNSON EM KIEV CONTRA ACORDO DE PAZ
Como é público e notório, a tentativa da Rússia de chegar em março a um acordo de paz com Kiev em Istambul foi inviabilizada pela intervenção direta do então primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, com respaldo de Biden.
Além disso, o plano para impor o ucraniano – ou outra língua qualquer – em um país em que um terço da população fala o russo faz tanto sentido quanto na bilíngue Bélgica a parte que fala o francês pretender que a outra região, de língua holandesa, passe ‘a falar o francês’, ‘ou se mudem para a Holanda”.
Então, não passa de cinismo à enésima potência as preleções ao Brasil sobre ‘Carta da ONU’ de Madame Nuland – cujas digitais estão em tantas guerras e golpes sangrentos cometidos por Washington nas últimas décadas.
Fonte: Papiro