Começam os cortes nas Americanas; trabalhadores vão à Justiça e às ruas
Em meio à maior crise de sua história e em pleno processo de recuperação judicial, as Lojas Americanas deram início, nesta terça-feira (31), às demissões de trabalhadores. Os cortes começaram na área de Tecnologia da Informação em São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, com o desligamento de 50 prestadores de serviços.
Em nota, a rede varejista tentou dissociar as dispensas da crise. Conforme o texto, “a companhia apenas interrompeu alguns contratos de empresas fornecedoras de serviços terceirizados”. A justificativa não convenceu o movimento sindical, que mantém a agenda de lutas em defesa dos 44 mil trabalhadores das Americanas. Segundo o Estadão, “o número chega 100 mil quando considerados funcionários diretos e indiretos da empresa”.
No último dia 24, em reunião virtual com 280 sindicalistas de todo o Brasil, um executivo das Americanas – Lúcio Marques, gerente de Relações Sindicais – admitiu que demissões não estavam descartadas. A Lei N. 14.112/2020, conhecida como Lei de Recuperação Judicial, obriga a empresa aderente a “manter os salários e benefícios dos (as) empregados (as) que ainda se encontram ativos (as) na empresa”, mas não proíbe cortes.
Além disso, há 17 mil ações trabalhistas em curso contra as Americanas, que, juntas, cobram uma dívida total de R$ 1,53 bilhão. A recuperação judicial bloqueia os recursos da empresa, que fica livre, temporariamente, de execuções financeiras.
Foi com essa preocupação que, na quarta-feira (25), oito entidades sindicais moveram uma ação civil pública junto à 8ª Vara do Trabalho de Brasília. Assinada por seis centrais e duas confederações de trabalhadores do comércio, a ação pede o bloqueio dos bens dos três acionistas de referência da empresa – os bilionários Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles.
Na segunda (31), representantes das entidades se reuniram com o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, e cobraram apoio aos trabalhadores. “Se os indícios de fraude forem provados, os culpados devem ser punidos, mas a empresa e os empregos precisam ser preservados”, apontou, em nota, o movimento sindical. Para as entidades, é necessário que a gestão Lula (PT) “participe diretamente do processo com o objetivo de estabelecer diálogo tripartite e total transparência”.
Marinho demonstrou solidariedade com a causa dos sindicalistas. “É possível que os controladores das Americanas se locupletaram no caso, mas os minoritários, possivelmente, estão na mesma situação dos trabalhadores”, especulou o ministro. “Não posso afirmar que houve fraude, mas que tem cheiro, tem cheiro.”
Além de recorrerem à Justiça e ao governo, as centrais chamam os trabalhadores às ruas para denunciar a ameaça de demissões, perda de direitos e calote. Uma manifestação nacional unificada foi convocada para sexta-feira (3), às 10 horas, em frente à loja das Americanas na Cinelândia, no centro do Rio.
A escolha do local se deve ao “DNA” do grupo, que iniciou suas operações no estado, em 1929. Por isso, o Sindicato dos Comerciários do Rio de Janeiro, filiado à CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), será o anfitrião do ato.
“Precisamos preservar os empregos e garantir os direitos desses trabalhadores e trabalhadoras. São milhares de pais e mães de famílias apreensivos pela situação”, diz Márcio Ayer, presidente do Sindicato. Nos últimos dias, dirigentes da entidade foram a unidades das Americanas para dialogar com os funcionários.
Central sindical com maior base comerciária do País, a UGT (União Geral dos Trabalhadores) também participa da mobilização. “Logo após o ato (no Rio), vamos até a sede da empresa”, afirma Ricardo Patah, presidente da UGT e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo. “Queremos saber o que aconteceu e estamos atentos com os direitos dos trabalhadores.”
As centrais defendem que, em caso de comprovação de fraude corporativa, a conta da crise não seja paga pelos funcionários. “Caso seja constatada a fraude, é preciso punir os principais acionistas, mas garantindo a continuidade da empresa e dos empregos”, resume Márcio Ayer.
À 4ª Vara Empresarial do Rio, as Americanas declaram ter 7.967 credores e dívida de R$ 41,2 bilhões. Fontes do mercado ouvidos pela Folha de S.Paulo afirmam que o grupo deve fechar pelo menos 30% de suas lojas. As Americanas têm hoje 3.601 pontos de venda, sendo 1.017 lojas tradicionais e 783 das unidades da Americanas Express.