Multidão ocupa o centro da cidade peruana Juliaca (Reprodução)

Cerca de cem mil peruanos tomaram as ruas de Juliaca, nesta quarta-feira (11), para dar o último adeus aos 19 mortos pela repressão quando se manifestavam nas imediações do aeroporto da cidade contra os atropelos à democracia e por uma Assembleia Constituinte para barrar as privatizações/desnacionalizações.

Diante da tragédia, que contabilizou mais de 70 feridos na capital da província de San Román – muitos com gravidade – o Conselho Diretivo da Assembleia Nacional de Governos Regionais (ANGR 2023) se pronunciou exigindo da presidente diálogo e eleições imediatas como única forma do país virar a página de dor.

A continuidade das execuções, sempre à bala, na cidade de Cusco no dia seguinte, bem como as declarações provocativas do primeiro-ministro Alberto Otárola, alegando que os protestos tinham “financiamento ilegal”, demonstra que Dina e seus seguidores insistem em outro caminho.

RUAS TOMADAS NA DESPEDIDA

Sobre a comovente passeata de Juliaca, o jornal La República descreveu que “logo que seus familiares recolheram o corpo das vítimas, passearam em seus respectivos ataúdes pelas ruas da cidade. Um mar de gente acompanhou os féretros ao longo de 30 quadras”. “O público que observava a procissão desde suas casas não podia conter as lágrimas ao ver passar amigos, familiares e parentes das vítimas. Os juliaquenhos anunciaram que se somarão à marcha até Lima”, acrescentou a reportagem.

Entre os assassinados de Juliaca se encontrava a universitária Yamileth Nataly, de 17 anos, que havia saído para comprar comida com seus familiares. Como a cidade havia se somado à paralisação desde o dia 4 de janeiro, a casa estava completamente desabastecida. Moradores próximos ao aeroporto, saíram até o mercado, quando ela recebeu o tiro fatal. Também foi morto na chacina o jovem médico estagiário Marco Antonio Samillán Sanga, que socorria as vítimas das balas expansivas.

“Os crimes da ditadura não podem ser encobertos pelos gritos desaforados do senhor Otárola na televisão, nem pela força das armas como ameaçou este aprendiz de valentão”, reagiu Gerónimo López, líder da Central Geral dos Trabalhadores do Peru (CGTP), frisando que é “hora de deter a carniceira”. Como esclareceu o secretário-geral da CGTP, “a forme e a miséria que se impôs na nossa pátria tem origem nos atos políticos e econômicos dos governos de direita que têm sua sustentação na Constituição Política de 1993, de Alberto Fujimori”.

Para barrar o descaminho da violência e do neoliberalismo, os movimentos sociais e partidos de oposição estão convocando uma grande manifestação na capital do país, reiterando a necessidade da “destituição de Dina e da mesa diretora do Congresso, bem como a abertura de um processo Constituinte”. A data ainda não foi confirmada.

Com o agravamento da situação, da perda de dezenas de vidas – grande parte com balas “dum dum”, que se abrem estraçalhando órgãos internos – e centenas de feridos, a Assembleia Nacional de Governos Regionais reiterou sua posição “para que o adiantamento das eleições gerais em nível presidencial e parlamentar se realize de imediato, como uma solução efetiva à crise política”.

A ANGR condenou as mortes que vêm se multiplicando por todo o país desde que Dina assumiu o poder, somando mais de 40, “produto do protesto social e da ação de seu governo, fatos que devem ser investigados e punidos no marco da atual legislação peruana”. Os governadores conclamaram a população “a se manter vigilante e a se manifestar pacificamente, sem cair em provocações”.

Entre os mortos e feridos de Cusco, no dia posterior, se encontrava Remo Candia Guevara, presidente da Comunidade camponesa de Uninsaya Coyana da província de Anta, de 50 anos, assassinado com um tiro no tórax. “A vítima faleceu por ferida de projétil de arma de fogo… São muitos os feridos que chegaram ao hospital por impacto de bala. Lamentavelmente este cidadão foi atendido, passou à Unidade de Terapia Intensiva (UTI), mas não resistiu por sua gravidade”, declarou o gerente regional de Saúde, Abel Paucarmayta.

Papiro (BL)