Protestos contra aumento de idade da aposentadoria ocorreram em 200 cidades francesas (Prensa Latina)

O Conselho de Ministros formalizou em Paris, na segunda-feira (23), a tramitação da famigerada ‘reforma da previdência’ de Macron, repudiada por dois milhões nas ruas na semana passada e com nova data de jornada nacional contra o esbulho já convocada para o dia 31, na semana que vem, convocada por unanimidade das oito centrais sindicais.

“64 anos é não!”, este o brado que ecoa nas ruas, nas pesquisas de opinião e que é apoiado por um leque de forças políticas que vai do França Insubmissa, comunistas, socialistas, ambientalistas, até a Reunião Nacional de Marine Le Pen. Além de dois anos a mais, a reforma Macron estica o tempo de contribuição para 43 anos.

Assim, o regime Macron segue em frente com sua afronta à população francesa, sob o mentiroso pretexto de “reequilibrar o sistema”, como alegou a primeira-ministra Élisabeth Borne. No dia 6 de fevereiro, o ataque de Macron à previdência começará a ser apreciado na Assembleia Nacional.

Partidos de oposição têm exigido que Macron submeta sua reforma a um plebiscito. No dia 19, no protesto em Marselha, Mélenchon havia ironizado que eles não sabem o que vai acontecer “amanhã”, mas dizem saber o que vai acontecer com a Previdência “daqui a 10 anos”.

A reforma previdenciária “canaliza todo o descontentamento” da França, afirmou Philipe Martinez, secretário-geral da CGT. Uma reforma “brutal”, que penaliza mais os trabalhadores precários, disse o líder da CFTD, Laurent Berger.

A reforma da previdência “é rejeitada por uma maioria muito grande dos franceses e por quase todos os trabalhadores” e deve ser “pura e simplesmente cancelada”, afirmou Le Pen, no Twitter. Ela instou Macron a “mudar de opinião, nunca é tarde para ouvir a vontade dos franceses”.

Após ter perdido a maioria parlamentar na Assembleia Nacional na eleição passada, a esperança de Macron é obter votos dos conservadores do Les Republicains, que estão divididos sobre a reforma.

Em 1995, na primeira tentativa de atacar a previdência no governo de Jacques Chirac, a revolta popular que parou a França acabou enterrando a medida e o então primeiro-ministro Allain Juppé. Em 2010, o então presidente Nicolas Sarkozy enfiou goela abaixo dos franceses a ampliação da idade mínima de 60 para 62 anos, mas não conseguiu se reeleger. Em março de 2020, Macron retirou uma versão anterior do projeto de reforma previdenciária após o início da crise da Covid-19 e uma onda de protestos liderada pelas centrais sindicais.

O “esquenta” para o dia 31 já está em marcha. No sábado, manifestação do partido França Insubmissa, com a presença de Jean-Luc Mélenchon contra a malsinada reforma, levou dezenas de milhares às ruas de Paris. Greves setoriais estão sendo discutidas nas bases.

No dia 19, além das massivas manifestações, inclusive nas cidades menores, também ocorreram paralisações em muitos setores da vida francesa, de trabalhadores de refinarias e usinas elétricas a ferroviários, portuários e controladores de voo, mais professores e outras categorias de servidores públicos. Os protestos ocorreram em 200 cidades, sendo os maiores Paris, com 400 mil pessoas, e Marselha, com 150 mil.

Em audiência na Assembleia Nacional do dia 19, o presidente do Conselho de Orientação da Previdência (COR), Pierre-Louis Bras, rebateu as afirmações do regime Macron sobre a situação e reiterou que “a despesa com aposentadoria tem se estabilizado de forma geral e, mesmo no longuíssimo prazo, diminui em três das quatro hipóteses”, de acordo com o último relatório anual do órgão, que projeta quatro cenários econômicos. Para Bras, o governo Macron “fez uma escolha”.

Segundo Macron, é imprescindível equiparar os franceses a outros europeus mais arrochados no terreno da previdência, por uma questão de “justiça”.

PREVIDÊNCIA É VIÁVEL, REBATE A CGT

Também a CGT, a principal central sindical francesa, contestou as alegações de Macron sobre a suposta necessidade da ‘reforma’. “Para financiar pensões e aposentadorias melhores aos 60 anos, existem soluções. Aumentar salários, criar empregos, tributar dividendos, garantir igualdade salarial, jornada de 32 horas. O governo se recusa a debatê-lo”, enfatizou o documento.

“Mesmo que se comprovasse o cenário de déficit de 12 bilhões de euros em 2027 adotado pelo governo, bastaria um aumento de 0,8% de contribuição para preenchê-lo”.

Metade do suposto déficit seria coberto caso se acabe com a diferença salarial de 28% entre mulheres e homens [salário igual para trabalho igual].

A CGT afirmou que não há problema orçamentário de curto prazo para financiar as aposentadorias. “O sistema como um todo tem 200 bilhões de euros em reservas. E existem as alavancas de ação para financiar a reforma aos 60 anos (55 para trabalhos difíceis), e para garantir uma pensão mínima de 2.000 euros”.

A CGT destacou ainda que ao “aumentar os salários, automaticamente aumentam as contribuições para a segurança social para financiar as pensões e se garante melhores direitos à pensão”.

Como exemplo disso, a CGT lembrou que no setor privado, um aumento salarial de 5% rendeu 9 bilhões de euros em contribuições: “metade do que o governo espera economizar com sua injusta reforma”.

A CGT assinalou ainda que as isenções fiscais concedidas às empresas, que totalizam 157 bilhões de euros anuais, “são 13 vezes” o déficit previdenciário anunciado.

A principal central sindical do país também convocou a eliminar as isenções aos dividendos das empresas e rendimentos financeiros. “Há muito o que fazer: em 2022 os acionistas das empresas CAC 40 [índice da Bolsa de Paris]receberam 80 bilhões de euros”.

A entidade também propôs “integrar gratificações, participações e participações nos lucros dos funcionários públicos nas contribuições previdenciárias”. Ainda, “aumentar as contribuições em 0,8 pontos: ou seja, € 8,25 por mês nas contribuições do empregado e € 8,25 nas contribuições do empregador para um salário mínimo de € 2.000”.

“Ao recrutar os 400.000 funcionários necessários para o serviço público hospitalar, seriam arrecadados mais 5 bilhões de euros para a previdência”. Por fim, o número de empregos que poderiam ser criados com a passagem para 32 horas no setor privado é estimado em cerca de 1,7 milhões, “ou seja, € 13,6 bilhões em contribuições adicionais para pensões”.

Papiro (BL)