Contra repressão do governo Dina, peruanos convocam nova marcha nacional
O novo banho de sangue ocorrido neste sábado (28) nas ruas de Lima cobrou a vida de mais dois manifestantes e deixou inúmeros feridos, ampliando a pressão popular por todo o Peru pela renúncia da presidente Dina Boluarte e fortalecendo a convocação da Marcha Nacional da próxima terça-feira (31) no centro da capital.
Reivindicando “o fim da repressão criminosa, a saída do Congresso vende-pátria e nova Constituição”, a Assembleia Nacional dos Povos (ANP), que congrega centrais sindicais, organizações de trabalhadores agrícolas, estudantis, de mulheres e partidos progressistas, conseguiu isolar o governo.
Desde que assumiu em 7 de dezembro, com o afastamento do ex-presidente Pedro Castillo, as diferentes pesquisas de opinião apontam que a rejeição à política sanguinária de Dina e do parlamento é próxima ou superior aos 80%, com denúncias dos “crimes de genocídio” alcançando até o Tribunal Penal Internacional (TPI).
A questão econômica central que se esconde por detrás da violação à democracia peruana é a luta da extrema-direita em manter a Constituição herdada do governo de Alberto Fujimori-Montesinos (1990-2000) que entregou aos cartéis transnacionais o filé do patrimônio público. “Sem a mudança na Constituição não podemos alterar os chamados contratos de lei, que são sacrossantos, com o Estado sem nenhuma soberania diante dos interesses estrangeiros”, explicou o secretário-geral adjunto da Confederação Geral dos Trabalhadores do Peru (CGTP), Gustavo Minaya, em entrevista ao HP.
De acordo com o sindicalista, tudo fica restrito a uma condição de “ganha-ganha” para quem privatizou/desnacionalizou as estatais, “levando para fora do país o julgamento de cláusulas quando for para melhorar suas condições de exploração e de lucro”. “Com validade de 20 a 30 anos, temos vários destes contratos vencendo agora, em 2023 e 2024, o que move tamanha violência. Vale lembrar que são mais de 60 mortes, a grande maioria por execuções extrajudiciais, com disparos no corpo e na cabeça de manifestantes, muitos que estavam em retirada, sendo alvejados pelas costas”, assinalou.
Para Gustavo Minaya, “Dina sempre agiu como aliada da extrema-direita, desde que traiu seus companheiros e chegou ao governo negando todos os compromissos assumidos com o povo peruano na campanha”.
Ao longo da semana o Núncio Apostólico do Peru, monsenhor Paolo Rocco Gualtieri, conclamou a presidente a “refletir profundamente sobre as causas que nos conduziram a esta situação”, “nunca com a lei da força”.
“Quando uma parte da sociedade pretende desfrutar do mundo como se os pobres não existissem, há consequências. Ignorar a existência e os direitos dos demais, cedo ou tarde provoca uma forma de violência inesperada, como estamos sendo testemunhas nestes dias”, acrescentou.
Rocco ressaltou que “os manifestantes são, principalmente, moradores das regiões rurais, urbanas-populares e amazônicas que por anos foram invisibilizados, marginalizados ou deixados para depois, desconhecendo-se seus direitos cidadãos”.
ONU CONTRA “ESTIGIMATIZAÇÃO DE VÍTIMAS”
Diante do crescente número de mortos e lesionados, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, defendeu que as autoridades peruanas realizem “investigações rápidas, efetivas e imparciais”.
A mensagem de Guterres pediu “que se evite a estigmatização das vítimas” – qualificadas pelo governo como terroristas, baderneiros e incendiários – além de reiterar sua “grande preocupação” pela gravidade da situação em que o país se vê mergulhado e pela crescente multiplicação de mortes.
O secretário das Nações Unidas também solicitou, especificamente, que as autoridades “cumpram com os seus compromissos internacionais em matéria de direitos humanos”, uma vez que a implementação do Estado de emergência em várias localidades tem impedido reuniões pacíficas e permitido a violação dos lares.
Papiro
(BL)