Prêmio Melhores da Globo é marcado por deboche e celebrações contra Bolsonaro
A cerimônia de entrega do prêmio Melhores do Ano, exibida anualmente pela Rede Globo, como celebração e retrospectiva de suas próprias realizações, foi marcada pelo deboche insistente pela despedida difícil de Jair Bolsonaro e seus apoiadores do Palácio do Planalto. Mas também contou com discursos solenes e comoventes celebrando o fim do atual governo e a volta do Ministério da Cultura.
O “Domingão do Huck” foi a festa de confraternização da corporação midiática que fez oposição velada ao governo Bolsonaro. Relembrar com louros sua produção jornalística, dramatúrgica e de entretenimento acabou soando como um pretexto para piadas rasgadas ridicularizando o presidente derrotado e sua trupe de lunáticos nas portas de quartéis.
Os humoristas Paulo Vieira, Fábio Porchat e Tatá Werneck e o apresentador Luciano Huck se esbaldaram em gargalhadas a cada menção à desgraça bolsonarista, apesar de Bolsonaro ter se dignado a renovar a concessão da Rede Globo, na mesma semana. Paulo Vieira, que esteve em evento de artistas da campanha de Lula, foi quem mais se deliciou alfinetando o adversário e causando risos.
“Se eu não ganhar hoje [como melhor humorista], eu vou pedir voto impresso. Vou pra porta de quartel. Eu vou queimar carrinho do Projac pedindo a volta do Faustão”, disse, quase derrubando de susto Luciano Huck, que substituiu o antigo apresentador, que foi para TV Bandeirantes. Vários comentários na internet afirmaram que Vieira “brinca com o perigo” ao rir da própria emissora.
Ele ainda fez piada vetada na edição, envolvendo a atriz Cássia Kis, que, aos 64 anos, se tornou um símbolo do bolsonarismo, ao aparecer em protestos golpistas e pedir a intervenção das Forças Armadas. “Já avisei o Luciano Huck que se eu não ganhar minha categoria vou juntar com a Cássia Beijos e pedir a volta do Faustão lá na frente do quartel!”
Solenidade e crítica
Outro momento que causou frisson nas redes foi o discurso do ator Osmar Prado, que venceu na categoria de ator coadjuvante pela atuação como o Velho do Rio, na novela “Pantanal”. “Quero dividir [o prêmio] com a reação do povo nas ruas. Conseguimos com a novela dar um pouco de alegria ao nosso povo que foi muito destratado e desrespeitado, nos últimos quatro anos. Que em 1º de janeiro consigamos reconstruir tudo”, disse.
O “Melhores do Ano” também homenageou lideranças sociais como Edson Leite, criador do programa Gastronomia Periférica, em São Paulo, que emocionou o público dizendo: “A gente veio aqui para comemorar. A gente veio aqui pra falar que a gente tá vivo, tá ligado? Mais livros, menos armas!”, afirmou, referindo-se ao principal símbolo do bolsonarismo, a liberação de armas.
Também foram homenageadas Neidinha e Txai Suruí, que falaram sobre o histórico de luta pela Amazônia. “Queria dedicar essa homenagem a todos os povos indígenas desse país que muito antes, há mais de 500 anos, estão lutando pelos nossos territórios, para que a gente continue vivo e pela vida de todos nós. É isso que significa floresta em pé”, disse Txai. Outras lideranças sociais também discursaram.
William Bonner, premiado como jornalista, fez menção a categoria de jornalistas que passou maus bocados durante o governo Bolsonaro: “A Renata [Lo Prete], o Cesar [Tralli] e eu representamos uma categoria inteira, não apenas de colegas nossos da Globo, que nos últimos anos tem se dedicado enormemente a levar luz para as pessoas, levar informação. E é muito prazeroso estar aqui agora, vendo, como disse, Lulu Santos, em parceria com Nelson Motta: tudo passa, tudo sempre passará”. Antes, Paulo Vieira havia feito piada com o fato de Bonner ter “aguentado” o padre bolsonarista Kelmon, durante debate.
O cineasta Andrucha Waddington, diretor da premiada série “Sob Pressão”, falou: “Quero dedicar esse prêmio a todos os profissionais da cultura. Eu acho que a partir de janeiro vamos ter o setor ativo”. Sua série também é um libelo em defesa do Sistema Único de Saúde ao contar a história de médicos num hospital público de periferia. “Eu quero repetir Viva o Sus, viva os profissionais da saúde”, disse Júlio Andrade, ator que venceu pela série.
Luciano Huck fez questão de celebrar a indicação da cantora Margareth Menezes para o Ministério da Cultura: “Agora que nós temos, finalmente, o Ministério da Cultura de volta. E nós temos o ministro da Cultura de volta. Olha que coisa maravilhosa. Uma ministra da Cultura agora!” Paulo Vieira emendou: “Viva Margareth Menezes”.
Huck encerrou o programa fazendo menção ao clima de ódio e divisão social provocada pelo bolsonarismo: “A você em casa, um Feliz Natal. Que seja um ano de muita saúde, de muita paz, de muito amor. Que seja o começo de um ciclo, que a gente recolha os cacos desse país, que a gente cure as feridas abertas. Nós somos um povo único, unido, de ponta a ponta, que tem que vestir a mesma camisa”.
(por Cezar Xavier)