Pela primeira vez, lista dos cem melhores filmes tem uma cineasta no topo
Como a ressoar as vozes que vêm clamando por maior diversidade em nível global, a lista dos cem melhores filmes da história de 2022, da revista britânica Sight & Sound, editada pelo Instituto de Cinema Britânico, trouxe pela primeira vez um filme de uma diretora mulher no topo da lista: “Jeanne Dielman” (1975), da belga Chantal Akerman, morta em 2015.
O história mostra três dias da vida da protagonista que dá nome à obra. Viúva, Jeanne cuida sozinha de seu filho adolescente e se prostitui três vezes por semana. Mulher de hábitos metódicos, ela passa a experimentar uma quebra em seu equilíbrio e rotina cotidianos.
“Eu acredito que seja um filme feminista porque dá espaço a coisas que nunca, ou quase nunca, foram mostradas dessa forma, como os gestos diários de uma mulher”, declarou, outrora, a cineasta sobre o seu filme.
O ranking, divulgado na quinta-feira (1º), é publicado a cada dez anos e é feito desde 1952 a partir dos votos de críticos, acadêmicos, programadores, distribuidores, curadores e arquivistas — neste ano foram ao todo 1.639 votantes.
Desde a lista de 2012 para cá, a obra de Akerman saltou 34 posições. O oitavo da relação, “Bom trabalho”, também foi dirigido por uma mulher, a francesa Claire Denis. A cineasta belga também figura na 52ª posição, com “Notícias de Casa”.
A relação deste ano também foi a que teve mais mulheres entre as cineastas com sua obra reconhecida entre as maiores, nove, contra apenas duas na lista anterior. Além da belga e da francesa, figuram agora na relação Agnès Vardas, com “Cléo das 5 às 7” (14º) e “Os Catadores e Eu” (67º); Maya Deren, com “Tramas do Entardecer” (16º); Vera Chytilová, com “As Pequenas Margaridas” (28º); Céline Sciamma, com “Retrato de uma Jovem em Chamas” (30º); Barbara Loden, com “Wanda” (48º); Jane Campion, com “O Piano” (50º), e Julie Dash, com “Filhas do Pó” (60º).
A diversidade também esteve estampada na escolha de diretores negros. Há uma década, figurava no ranking apenas “Touki Bouki”, do senegalês Djibril Diop Mambéty. Agora, entre os o sete diretores negros, estão Spike Lee, com “Faça a coisa Certa”; Charles Burnett, com “Killer of sheep” e Julie Dash, com “Daughters of the dust”.
Segundo Jason Wood, executivo do Instituto de Cinema Britânico, em entrevista à Hollywood Reporter, “um dos elementos mais importantes desta lista é que ela chacoalha a ordem estabelecida. Cânones devem ser desafiados e questionados e, sendo parte do objetivo do BFI não apenas revisitar o cinema, mas também reformular sua história, é muito satisfatório ver uma lista que parece tão radical em termos de diversidade e inclusão”.
Conforme escreveu Amir Labaki, diretor do É Tudo Verdade – Festival Internacional dos Documentário, no jornal Valor Econômico, “esse ‘aggiornamento’ é consequência da maior diversidade e da quase duplicação do número de votantes, para cerca de 1.600 profissionais de cinema. Um segundo fator foi destacado pelo editor da revista, Mike Williams, em entrevista ao New York Times: ‘O streaming e a comunicação digital criaram oportunidades para amplificar vozes e filmes que antes eram menos vistos’”.
Por outro lado, Labaki aponta que ainda há espaço para ampliar o leque da diversidade — por exemplo, as produções latino-americanas não figuram na lista, embora haja filmes bons de sobra por aqui.
Veja abaixo a lista dos dez mais votados em 2022:
1) “Jeanne Dielman” (1975), Chantal Akerma;
2) “Um Corpo que Cai” (1958), de Alfred Hitchcock;
3) “Cidadão Kane” (1941), de Orson Welles;
4) “Era Uma Vez em Tóquio” (1953), de Yasujiro Ozu;
5) “Amor à Flor da Pele” (2000), de Wong Kar-wai;
6) “2001: Uma Odisseia no Espaço” (1968), de Stanley Kubrick;
7) “Bom Trabalho” (1998), de Claire Denis
8) “Cidade dos Sonhos” (2001), de David Lynch;
9) “Um Homem com uma Câmera” (1929), de Dziga Viértov
10) “Cantando na chuva”(1952), de Stanley Donen
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(PL)