Retomada da política habitacional será desafio após abandono de Bolsonaro
A falta de moradia e a habitação precária são dois problemas crônicos do país que só pioraram durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). Num cenário de crise e desemprego, o presidente escolheu cortar de quem tem menos até nas políticas dessa área, deixando na mão milhões de pessoas que esperavam poder realizar o sonho de ter um teto digno. Retomar os rumos da política habitacional e avançar na garantia desse direito básico é um dos desafios de Lula.
Hoje, estima-se que no Brasil mais de 17 milhões de pessoas vivem em situação de déficit habitacional, morando em locais precários, improvisados ou tendo de direcionar a maior parte de sua renda ao aluguel. Nesse universo, cerca de 88% das famílias recebem até três salários mínimos. E entre março de 2020 e outubro de 2022, o despejo atingiu quase um milhão de pessoas. As informações foram trazidas pela revista piauí, segundo dados do IBGE e da Fundação João Pinheiro.
Ainda segundo a publicação, em 37 anos, a área ocupada por favelas cresceu o equivalente a 102 mil campos de futebol e hoje o país tem cerca de 9,5 milhões de pessoas vivendo em áreas de risco, o que corresponde à população do Pará. Vale destacar que segundo pesquisa Datafolha divulgada em fevereiro deste ano, ter um lar para morar é o sonho de 87% dos brasileiros.
Moradia à míngua
Para atender a esse público que tem necessidade urgente de ter onde viver, a equipe de transição estuda maneiras de ampliar o valor destinado às políticas de moradia, que foram deixados à míngua por Bolsonaro, e apostar em diferentes propostas.
Ao jornal Valor Econômico, a ex-secretária de Habitação do Ministério das Cidades, Inês Magalhães, que compõe o grupo de trabalho de transição dedicado ao tema, destacou sobre o atual governo: “Não tem programa de investimentos para urbanização de favelas e para melhoria de situação precária em assentamentos. Isso é inaceitável”.
Ao orçamento de 2023, Bolsonaro direcionou apenas R$ 2,2 bilhões para o Ministério do Desenvolvimento Regional, montante bastante baixo diante das atuais necessidades. O Casa Verde Amarela — substituto mambembe ao Minha Casa Minha Vida, que Bolsonaro renomeou como forma de tentar desvincular o programa das gestões Lula e Dilma Rousseff — teve cortes de 95%.
Somente para o MCMV, seria preciso cerca de R$ 1 bilhão, segundo dados da equipe de transição — e o Orçamento do próximo ano destina apenas R$ 34,2 milhões para o Fundo de Arrendamento Residencial. O valor também é ínfimo no que diz respeito aos investimentos em áreas de risco: R$ 20 milhões.
“Nossa proposta de retomada do programa Minha Casa, Minha Vida além de voltar a atender as famílias de baixa renda, cujo atendimento foi abandonado desde 2016, prevê também aperfeiçoar o programa com soluções e modalidades apropriadas à diversidade urbana e regional do país”, declarou à Folha de S.Paulo a ex-ministra do Planejamento Miriam Belchior, que faz parte da equipe de transição nos debates que envolvem essa questão.
Iniciativas para a retomada
Para enfrentar o atual cenário de penúria desta área, o governo Lula quer recriar o Ministério das Cidades e retomar programas como o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) Favelas, reconstruir o MCMV para famílias de baixa renda e viabilizar financiamentos habitacionais focados nesse mesmo público.
No Minha Casa, a retomada deve ter início para a faixa 1, formada por famílias com renda bruta de até R$ 1,8 mil. E estuda-se, inclusive, o uso de imóveis vazios pelo programa em regiões centrais das cidades, o que aproxima a população mais pobre dos locais com mais infraestrutura e emprego e ajuda na melhoria de áreas degradadas.
Outra frente à qual o novo governo vai se dedicar para sanar a falta de moradia é o aluguel social, a ser viabilizado por meio de parceria com estados e municípios. Além disso, os recursos do FGTS deverão ser direcionados para a concessão de financiamentos a famílias que ganhem até R$ 3 mil e poderá haver um fundo garantidor de crédito para a parcela da população formada por trabalhadores informais, que em geral têm dificuldade de adquirir sua casa por não dispor de comprovação de renda.
A definição sobre recursos a serem aportados e os programas prioritários dependerá da aprovação da PEC da Transição, que busca corrigir a baixa dotação orçamentária definida por Bolsonaro que engessa o desenvolvimento de áreas importantes, sobretudo para as parcelas mais vulneráveis.
Uma vez seguindo este caminho, o novo governo espera, de um lado, garantir moradia para quem mais precisa e, de outro, estimular a atividade econômica principalmente na área da construção civil, gerando emprego e renda.