Política armamentista de Bolsonaro beneficiou 178 empresas do agronegócio
A política de liberação de armas de fogo promovida pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) beneficiou uma série de grupos econômicos e sociais diretamente interessados no uso da força para fazer valer seus interesses. Um desses grupos é composto por empresas do agronegócio que, em maior ou menor grau, estão relacionadas a conflitos agrários. Ou seja, a política armamentista do atual presidente contribui tanto para o aumento da violência na cidade como no campo, em benefício daqueles que lucram com essa situação.
Segundo o dossiê “Oligarquias Armadas”, do observatório do agronegócio De Olho nos Ruralistas, que tem como base inédita dados do Departamento de Polícia Federal, 1.051 pessoas jurídicas conseguiram, nos últimos quatro anos, autorização para exercer a chamada “segurança orgânica” de seu patrimônio — ou seja, empresas que têm seus próprios seguranças armadas e não terceirizam o serviço para empresas de vigilância. Dessas, 178 são do ramo agropecuário e de mineração, setores que figuram entre alguns dos mais envolvidos em conflitos no campo.
Entre essas, diz o dossiê, “estão 14 das 100 maiores empresas do agronegócio brasileiro, segundo relação da Forbes: os frigoríficos JBS, Marfrig e Minerva; as sucroenergéticas Cosan, Raízen e Usina São Martinho; a fabricante de agrotóxicos Bayer, as indústrias de celulose Klabin e Eldorado, as de alimentos M. Dias Branco e São Salvador; e as cooperativas Coamo, Copacol e Cotrijal”.
Ainda de acordo com o levantamento, São Paulo concentra o maior número desses empreendimentos rurais com autorização para compra de armamentos, com 43 empresas, seguido por Goiás, com 19; Alagoas e Paraná, com 14 cada; e Rio Grande do Sul, com nove.
A apresentação do relatório destaca que foi identificado “um cenário de clandestinidade e falta de controle por parte do DPF em relação à forma que este arsenal chega ao campo e seu potencial de deflagrar conflitos fundiários”. Em diversos casos, completa o entidade, “as mesmas empresas autorizadas a realizarem a própria segurança armada possuem histórico de violações de direitos de comunidades indígenas, quilombolas e camponesas”.
Conflitos x permissões
O dossiê explica ainda que essas permissões de uso de armas, por parte da PF, ignoram casos notórios de conflito. Um exemplo citado no documento é o Massacre de Caarapó (MS), em 2016, quando um indígena foi morto e outras seis pessoas, inclusive uma criança, ficaram feridas pelas mãos de pistoleiros. “O caso rendeu uma denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra funcionários da Coamo (cooperativa agroindustrial), obtida na íntegra pelo observatório em 2019. Segundo o MPF, sete funcionários da cooperativa prestaram falso testemunho sobre sua participação no massacre”, diz o dossiê, que aponta ainda que a mais recente renovação concedida à Coamo data de setembro de 2021.
Outro caso citado pelo levantamento diz respeito à madeireira Araupel, em Quedas do Iguaçu (PR), que obteve autorização e renovação recente para o porte e uso de armas pela PF “mesmo travando uma violenta disputa por cerca de 25 mil hectares de terras ocupados por famílias ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) desde a década de 1990”.
O documento afirma, ainda, que “em 2018, a PF havia permitido que a madeireira vendesse parte das armas de fogo de sua unidade em Quedas do Iguaçu – ao todo, oito revólveres calibre 38 e uma espingarda calibre 12 – a um centro de formação de vigilantes, Delta Star, sediado em Cascavel (PR). As permissões não levam em conta as recorrentes acusações de uso de seguranças privados em ataques contra membros do MST. Em 2016, por exemplo, dois trabalhadores sem-terra foram assassinados a tiros no entorno da área em disputa com a Araupel. À época, o MST acusou um grupo de ‘seguranças, jagunços e policiais’ de atirarem, sem motivo aparente”.
Esse padrão no mínimo controverso de renovação das autorizações, diz a entidade, vem sendo seguido à risca durante o governo Bolsonaro. “Entre as 178 empresas monitoradas durante a pesquisa, poucos foram os casos em que houve negativa à renovação. Quando ela ocorre, como no caso da planta do frigorífico Marfrig em Bataguassu (MS), os motivos não são divulgados”.
Cabe salientar, por fim, que a política armamentista de Bolsonaro, além de já ter mostrado o quanto é prejudicial no meio urbano, também demonstra seus primeiros sintomas no meio rural. “Segundo levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2021 os assassinatos no campo registraram seu maior número desde 2017 – ano dos massacres de Colniza (MT) e Pau D’Arco (PA). Ao todo, a organização contabilizou 35 mortes ligadas a conflitos fundiários, sendo 28 na Amazônia Legal. O índice é o dobro do registrado em 2020”, aponta o dossiê.
Para ler a íntegra do dossiê, clique aqui.
(PL)