O termo é recente. Foi na década passada que um e outro policial passaram a se qualificar como “antifascistas”. Mal desconfiavam que, em 2019, um presidente de extrema-direita ascenderia ao poder no Brasil. Mas foi no contraponto ao governo autoritário de Jair Bolsonaro (PL) que o movimento mais cresceu. “Éramos 200 em 2016. Hoje, somos mais de 5 mil, graças à mobilização”, diz o policial penal Abdael Ambruster, de São Paulo.

Conforme reportagem de Edison Veiga para a DW, “o movimento, batizado de Policiais Antifascismo, nasceu em 2016 em cidades do Nordeste, foi oficializado em evento realizado no Rio de Janeiro em 2017 e, a partir de 2018, espalhou-se pelo Brasil”. A prioridade do grupo, durante a gestão bolsonarista, foi “demonstrar que o apoio às pautas de extrema direita não é consenso absoluto dentro das forças de segurança”. Ao se posicionar assim, o movimento atraiu oficiais da ativa e aposentados, de diversas forças de segurança.

Este é o caso de Abdael Ambruster, policial há 28 anos com pós-graduação em segurança pública e direitos humanos. “A gente só está seguindo os preceitos constitucionais de nosso país e os preceitos internacionais, apenas isso. Estamos trabalhando o óbvio”, diz. “Nossa profissão, nossa razão de ser, é defender os direitos – e nosso sonho é trabalhar por um Brasil melhor e um mundo melhor”.

Além de participar dos Policiais Antifascismo, Abdael é membro de organizações de defesa dos direitos LGBT e de direitos humanos. Uma de suas frases preferidas é a sentença do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas): “Um policial é, antes de tudo, um defensor dos direitos humanos”.

Na visão de Abdael, é necessário “rever muito a segurança pública” no Brasil. “Um dos conceitos fadados ao fracasso é a ideia de ‘guerra às drogas’. Isso resulta apenas na morte da população pobre, preta e periférica”, analisa. “Mas levantar a bandeira dos direitos humanos dentro das instituições policiais, ainda mais com o avanço do bolsonarismo, é ser a voz dissonante – a voz que tentam abafar.”

O coordenador nacional do Policiais Antifascismo é Luciano Antonio Silva, coronel aposentado da Polícia Militar de Alagoas (PM-AL). De acordo com ele, trata-se de um “movimento progressista suprapartidário”. A seu ver, “ser policial antifascismo é lutar contra o fascismo que existe na nossa sociedade, no Estado brasileiro e principalmente nas forças de segurança pública do Brasil. É valorizar os direitos fundamentais, os direitos sociais previstos na Constituição e em todo o ordenamento jurídico do país. É não aceitar ações fascistas por parte de integrantes das forças de segurança pública”.

Por defender uma segurança pública “mais democrática, mais comunitária e de aproximação junto ao cidadão”, Luciano não poupa críticas a Bolsonaro. “Não concordamos com a frase errada e fora de lugar que tem sido propagada pelo atual presidente da República, que diz que ‘bandido bom é bandido morto”, afirma. “Em nosso país, não existe pena de morte e todas as pessoas, sejam quais forem, devem ser submetidos à legislação, ao que prevê o Estado de Direito.”

Para Edison Veiga, o manifesto do movimento pode ser sintetizado em cinco pontos. Os policiais antifascistas:

– “defendem a desmilitarização da segurança pública, acreditando que todo policial deveria ter formação civil”;

– “pedem a reestruturação das forças policiais, com unificação de carreiras e revisão das hierarquias”;

– “são contra a narrativa de que há uma ‘guerra’ contra o crime, por entenderem que isso não resolve o problema da violência – mas, sim, incentiva”;

– “argumentam que a criminalização das drogas é uma política de encarceramento em massa que vitima principalmente jovens negros”; – “querem que policiais tenham direitos compatíveis com os de outros trabalhadores, como direito de greve e de livre associação”.