Forças de Kiev bombardearam a estação de trem de Kromatorsk deixando 50 civis mortos. (Padel/AFP)

A legislação já em vigor nas regiões recém incorporadas à Rússia por decisão de referendo – Donbass, Kherson e Zaporozhia -, foi decretada pelo presidente Vladimir Putin amplia o escopo da proteção dessas regiões e suas populações e para fazer frente “aos métodos abertamente terroristas” usados pelo regime Zelensky sob orientação dos generais da Otan, que incluem atentados, assassinatos e o bombardeio de áreas civis.

A decisão foi tomada após uma sucessão de ataques terroristas, como a explosão na ponte da Crimeia, a tentativa de sabotar o Turkish Stream no Mar Negro, o atentado que matou a filha do filósofo Dugin e os repetidos bombardeios à central nuclear de Zaporozhia, ameaçando provocar uma catástrofe. Em paralelo, a destruição de três gasodutos Nord Stream, no Mar Báltico.

Também a ameaça que paira sobre a cidade de Kherson – alvo de uma tentativa de ofensiva ucraniana -, com os constantes bombardeios à central hidrelétrica de Kakhovkaya podendo provocar o rompimento da represa, o que provocaria uma inundação que destruiria a cidade. O que levou à decisão de imediata evacuação da população civil para outra área em que estará a salvo.

Para a ex-analista do Pentágono e tenente-coronel aposentada da Força Aérea dos EUA Karen Kwiatkowski, a surpresa é que a lei marcial não haja sido implantada há mais tempo. “Não estava em vigor durante os referendos, que era o que eu esperava, dada a cobertura da mídia ocidental”, nem logo após “os ataques aos oleodutos e à Ponte para a Crimeia”.

Para Kwiatkowski, entre os fatores que estimulam o regime de Kiev a recorrer ao terrorismo estão a diminuição do apoio à Ucrânia entre o público nos EUA e na Europa, as iminentes eleições de meio de mandato dos EUA, que podem resultar na desaceleração da ajuda dos EUA a Kiev, e a retórica pública cada vez mais “agressiva” e “fanática” vinda de Zelensky após os ataques russos à infraestrutura.

No que diz respeito ao Donbass, ela não acredita que essas medidas signifiquem uma mudança significativa na vida dos civis. “As pessoas de lá foram bombardeadas e atacadas pelo exército ucraniano por quase uma década, e as milícias estão acostumadas a conflitos de baixa intensidade e bem experientes”, disse Kwiatkowski.

A mesma surpresa pela demora na decretação da lei marcial foi manifestada pelo ex-inspetor de armas e ex-oficial da inteligência dos marines, Scott Ritter, que assinalou que “a maioria dos analistas militares, inclusive eu”, estava coçando a cabeça se perguntando “‘o que está acontecendo? Por que a Rússia não está funcionando da maneira que foi projetada para funcionar?”.

“É como se a Rússia permitisse que o Ocidente coletivo funcionasse com 100% da capacidade, limitando-se a 40% da capacidade. E acho que agora o que veremos é que a Rússia fará tudo para degradar a capacidade da Ucrânia e do Ocidente coletivo de atuar no campo de batalha, ao mesmo tempo em que eleva o nível de competência e desempenho russos para tão perto de 100% quanto pode conseguir”, disse Ritter ao portal Sputnik.

Ele acrescentou que Putin “está simplesmente pondo em ação os mecanismos necessários para defender a Rússia da forma apropriada”.

O secretário-geral do Fundo de Desenvolvimento da Crimeia, Vasfi Sel, por sua vez, disse ao Sputnik que, em sua opinião, a lei marcial foi declarada em Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporozhye para evitar uma possível catástrofe nessas quatro áreas, criando órgãos de coordenação especiais lá.

“O Ocidente coletivo exige que a Ucrânia ataque esses territórios”, observou Sel, citando Sergei Surovikin, comandante das forças russas que participam da operação especial na Ucrânia, dizendo que a Rússia obteve informações de inteligência de que o regime de Kiev pode recorrer a métodos de guerra proibidos ao atacar as áreas.

“Há especulações de que o regime de Kiev está preparando um ataque à barragem de Kakhovka em um futuro próximo. Ao olhar para o mapa, fica claro que, se a barragem for atingida, essas quatro regiões, especialmente Kherson, ficarão sob as águas do rio Dnieper. É por isso que as autoridades locais anunciaram a evacuação de civis e o fortalecimento das unidades militares”, disse Sel.

A introdução da lei marcial nas quatro áreas é necessária para que a Rússia proteja seus próprios cidadãos, inclusive com a ajuda de ferramentas militares, diz o especialista militar iraniano Mohammad-Hassan Sangtarash.

Ele apontou que vários países ocidentais estão tentando “de todas as formas possíveis criar tensão e divisão na sociedade, inclusive nos territórios que se tornaram parte da Rússia”.

“Este é o seu instrumento de pressão sobre as autoridades russas. Para evitar quaisquer provocações militares em meio a relatos de que [Kherson] está enfrentando uma ameaça de destruição em larga escala durante o ataque iminente dos militares ucranianos, a Rússia deu um passo preventivo ao declarar lei marcial para salvar seus cidadãos [nas quatro áreas]”, destacou o especialista.

NEBENZIA

Sobre essa ameaça terrorista, o representante permanente da Rússia na ONU, Vasily Nebenzia, pediu ao Conselho de Segurança que impeça a destruição da barragem da usina hidrelétrica de Kakhovskaya pelo regime de Kiev, o que denunciou como uma “monstruosa provocação”, segundo a agência TASS.

O embaixador russo acusou o regime Zelensky de atacar consistentemente a infraestrutura civil dos antigos territórios da Ucrânia sob a indulgência dos curadores ocidentais de Kiev por quaisquer atos criminosos.

Ele denunciou que as tropas ucranianas estão bombardeando a cidade de Novaya Kakhovka, na região de Kherson, há cinco meses. Até 120 mísseis chegam por dia, a maioria dos quais são HIMARS americanos, e os ucranianos os apontam especificamente para a barragem de Kakhovka para rompê-la e, assim, causar um aumento no nível da água, o que levará a inundações de territórios próximos e a morte de milhares de civis, advertiu. Na véspera, forças ucranianas atacaram com foguetes a usina hidrelétrica de Kakhovskaya.

O general sérvio da reserva, Mitar Kovac, que agora atua como professor na Academia Militar de Belgrado, disse ao Sputnik que a Rússia está defendendo seus territórios com base legal. “Isso é bastante lógico e está de acordo com o estado atual das coisas após a decisão sobre as quatro regiões se tornarem parte da Rússia. É uma zona que está constantemente sob fogo de armas de longo alcance das Forças Armadas da Ucrânia. Esta é a área onde Kiev realizou e provavelmente continuará realizando vários ataques terroristas contra autoridades públicas, indivíduos e instituições”, disse Kovac.

Para o analista internacional Eduardo Luque, a lei marcial é também a percepção “de que o regime Zelensky atua como um estado terrorista que não hesitará por um segundo sequer em por em perigo centenas ou milhões de vidas se for no interesse das gangues fascistas que parecem ter tomado controle do governo de Kiev”.

PRONTIDÃO

Além da lei marcial em Lugansk, Donetsk, Kherson e Zaporozhia, Putin também apertou a segurança em toda a Rússia, introduzindo três níveis de segurança diferentes. Nas regiões próximas à fronteira com a Ucrânia, como Belgorod, Bryansk, Krasnodar, Rostov e Crimeia, foi declarado um “nível médio de resposta”: as medidas incluem o reforço da segurança e da ordem pública, restrições à circulação do trânsito e à entrada e saída dessas regiões.

Foi também determinado o nível de segurança de “prontidão aumentada”, que se aplica às regiões central e sul da Rússia, incluindo Moscou. O decreto presidencial menciona “revistas de veículos e restrições ao trânsito”, bem como uma “ordem pública mais dura”. O nível de segurança mais baixo se aplica ao resto do país. Para cumprir o decreto do presidente Putin, todos os governadores receberam ordens para estabelecer “quartéis-generais operacionais”, que incluirão dirigentes de cada região e representantes dos militares e da polícia.

Apesar da mídia pró-OTAN dizer que o conflito na Ucrânia é “não provocado” e “culpa do Putin”, na realidade o golpe da CIA em 2014, que derrubou o governo legítimo, instalou no lugar um regime que tem como patronos colaboracionistas nazistas na II Guerra e como meta a anexação à OTAN contra a Rússia.

Regime que baniu os comunistas e perseguiu os russos em geral, há centenas de anos vivendo nas regiões sul e leste, e decidiu proibir a língua russa, o que causou um levante no Donbass e o plebiscito na Crimeia pela reunificação com a Rússia.

Durante oito anos Moscou tentou obter de Kiev a aplicação dos protocolos de Minsk, que permitiriam uma solução dentro da estrutura estatal ucraniana, desde que com autonomia e direito à língua russa inscritos na constituição.

A Rússia só reconheceu a independência das duas repúblicas do Donbass, após Kiev ter explicitado que não ia cumprir os acordos de Minsk, anunciar que ia renunciar ao estatuto de neutralidade e ingressar na Otan, que pretendia ter armas nucleares e, ainda, após bombardear em toda a linha de frente -deixando claro que ia deflagrar o esmagamento militar da rebelião antifascista.

Grupelhos nazistas, como assinalou recentemente Putin, existem em muitos países, a diferença é que na Ucrânia são eles que dão as cartas, exibindo suásticas e com procissões de tochas.

Querer ‘ucranizar’ de forma discriminatória uma nação multiétnica, como a Ucrânia, constituída por ucranianos, russos, húngaros e poloneses, e tentar vetar suas línguas maternas, é tão absurdo quanto achar que a Bélgica – uma nação bilíngüe – poderia subsistir sob só um dos componentes, o francês ou o holandês. Ou que o Canadá sobreviveria sob uma lei proibindo o francês em Quebec.

Como têm afirmado os diplomatas russos, a operação especial de desnazificação e desmilitarização da Ucrânia não começou o conflito, mas irá encerrá-lo depois de oito anos de continuada tentativa do regime de Kiev de promover uma limpeza étnica do Donbass a Odessa.

Papiro

(BL)