Cartazes da multidão: "Taxem os ricos", "Não ao aumento na energia" e "Não pagaremos pela crise" (PA)

O governo da primeira-ministra Liz Truss deu meia-volta na segunda-feira (3) depois das manifestações em 50 cidades no fim de semana e anunciou que vai retirar do seu pacotaço a medida mais escandalosa, o corte de impostos para os mais ricos, em meio à indignação contra a carestia, a onda de greve e, até mesmo, a derrubada nos títulos ingleses, precisando o Banco da Inglaterra intervir para deter o colapso da libra esterlina, assim que o mal chamado ‘miniorçamento’ foi apresentado.

Até a bancada conservadora ficou contra, após as pesquisas mostrarem o afundamento do partido nas próximas eleições e o incômodo da City londrina, e os mais afoitos inclusive começaram a pleitear a volta do ministro das Finanças de Boris Johnson, Rishi Sunak.

Nas manifestações em Londres, Plymouth, Liverpool, Aberdeen, Birmingham, Brighton, Bradford e outras cidades, os cidadãos queimaram extorsivas contas de eletricidade, que quase dobraram em relação ao ano passado, aos gritos de “não temos como pagar, não pagaremos, não pagamos”. Também, “congelem os lucros, não as pessoas” – esta, uma referência à recusa em taxar os lucros extraordinários dos monopólios que estão fazendo a festa com a especulação com o gás e petróleo, efeito colateral das sanções contra a Rússia.

A manutenção do corte dos impostos dos ricos havia sido defendida publicamente por Truss horas antes do cavalo de pau. Na verdade, a medida era meio o bode na sala de jantar, correspondendo a £ 2 bilhões por ano de um pacote de £ 45 bilhões. “Um erro de arredondamento”, ironizou o diretor do Instituto de Estudos Fiscais, Paul Johnson.

Com uma inflação que já passa de 10% e ameaça chegar a 18% até o fim do ano, o chanceler do Tesouro (ministro das finanças), Kwasi Kwarteng, anunciou que os orçamentos do governo não serão atualizados para contabilizar a inflação – o que equivale a um corte de £ 18 bilhões. Pelo mesmo artifício, há um corte de £ 10 bilhões em termos reais nos benefícios sociais.

Como assinalou Jeromy Corbyn, o ex-líder dos trabalhistas, nos protestos, “em que mundo vivemos? No quinto país mais rico do mundo, em que temos o maior fosso entre os ricos e os pobres, o governo está ampliando este fosso”.

Por sua vez, o atual líder do partido, o blairista Keir Starmer, já mostrando, nas entrevistas, o gostinho de vir a ser o próximo gerente de massa falida, disse ao Telegraph que “os mercados não acreditam na economia da fantasia de empréstimos sem restrições e cortes de impostos sem financiamento”.

Ele apelou aos “muitos parlamentares conservadores decentes que sabem disso”, asseverando que os trabalhistas trabalharão “com qualquer um” para garantir que “alguma aparência de sanidade econômica seja restaurada”. Nos últimos dias, disse o blairista, “os conservadores perderam qualquer reivindicação de cuidadosa administração das finanças da nação”. Esse papel agora é do Partido Trabalhista, “o partido do dinheiro sólido”.

O recuo do governo Tory é uma “vitória parcial” contra o pacote anunciado, registrou o jornal Morning Star, que apontou que no seu núcleo – o corte em valor real dos gastos com programas sociais e arrocho salarial aos servidores públicos – o ‘miniorçamento’ permanece intocado. A publicação saudou também as centenas de milhares de trabalhadores que estão em greve contra a carestia e a perda de poder aquisitivo.

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