Perseguição a cristãos não-bolsonaristas acontece dentro da própria igreja 
O bolsonarismo inaugurou uma nova era de profundas cisões e contradições nas mais diversas áreas da vida brasileira. Não que diferenças e discórdia não existissem antes, mas desde que Jair Bolsonaro (PL) chegou ao poder, houve um claro estímulo e um forte acirramento de tensões que atiçam atos de violência subjetiva e objetiva. Uma das mais simbólicas dessas fragmentações está no seio das igrejas, sobretudo evangélicas. Ao contrário do que se pode imaginar, essas violências ocorrem, inclusive, dentro dos próprios tempos, contra aqueles que divergem da linha política pregada por pastores e lideranças ou que simplesmente ousam questionar o uso político da religião.
Claramente, as eleições de 2022 foram as que mais tiveram a presença de questões religiosas no debate público político. Bolsonaro tem investido fortemente no discurso da intolerância, seja ela ligada propriamente aos diferentes credos, seja aquela relativa aos costumes e diferentes orientações sexuais que, na concepção reacionária do presidente e seus apoiadores, atentam contra a “tradicional família brasileira” e os “cidadãos de bem”, o que flerta com setores religiosos mais conservadores.
Em meio a esta cruzada reacionária, os bolsonaristas não poupam sequer a igreja católica, tradicional e majoritária no país, como mostraram os Episódios recentes ocorridos no Santuário de Aparecida e no Círio de Nazaré. Segundo pesquisa Datafolha, em 2020 católicos eram 50%; 31%, eram evangélicos e 10% não tinham religião; o Censo de 2010 indicava a existência de 65% do primeiro grupo, 22% do segundo e 8% do terceiro.
Mas, nesse cenário de tantos embates e radicalismos, até mesmo os evangélicos sofrem com atitudes obtusas de seus próprios irmãos de fé. Conforme mostrou reportagem da BBC Brasil, têm se tornado comuns relatos de cristãos que sofrem intimidações por furarem a bolha de sua própria comunidade religiosa.
“Diziam que Bolsonaro é o único candidato que defende a liberdade religiosa, o único que vai manter igrejas abertas. E que, se Lula for eleito, ele vai fechar as igrejas, queimar as igrejas”, relatou um dos entrevistados pela BBC Brasil, Alisson Santos, que disse ter sido expulso, assim como sua esposa, de uma igreja evangélica em Aracaju (SE). De acordo com a reportagem, “ele conta que viu frequentadores da igreja sendo expostos no altar por discordarem dos candidatos apoiados pela igreja”.
Após relatar o que levou à expulsão do casal — o fato de o rapaz compartilhar conteúdos em um grupo de Whats App da igreja que mostravam contradições envolvendo o atual presidente — Alisson concluiu: “É muito triste. Minha esposa só chora desde o ocorrido. Ela só chora porque é o lugar que sempre nos acolheu”. E completou: “A perseguição contra os cristãos já começou no Brasil. Só que dentro da própria igreja.”
Outra entrevistada, de outra igreja, chamada Marta, declarou: “Você passa a ser perseguido dentro do próprio templo pelos irmãos, na fé e pelos próprios pastores. Porque, se você não obedece, se você não segue aquele político que eles escolheram para votar, você não é cristão. A sua fé, ela está sendo colocada à prova”.