Os 5 mandamentos da campanha de Lula para vencer Bolsonaro no 2º turno
Após conquistar um recorde de 57,2 milhões de votos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se prepara para “ir a campo” e impulsionar sua campanha no segundo turno. O embate inicial nas urnas, neste domingo (2), terminou com uma vantagem de 6,1 milhões de votos de Lula sobre o presidente Jair Bolsonaro (PL). É a primeira vez que um candidato a reeleição ao Planalto termina o turno inicial em segundo lugar.
Apesar da desvantagem, Bolsonaro parece desconfortável com a urgência de pleitear adesões à sua candidatura. Ainda no domingo, em bate-papo com apoiadores no cercadinho do Palácio da Alvorada, ele destratou as presidenciáveis Simone Tebet (MDB) e Soraya Thronicke (União Brasil) com apelidos pejorativos. À imprensa, minutos depois, o presidente sublinhou que a prioridade é ter o apoio do governador reeleito de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo).
A campanha de Lula, ao contrário, não restringiu as conversas a uma ou outra liderança política e partidária que possa declarar apoio ao ex-presidente. Outra preocupação é manter o ânimo da militância que idealizava a vitória já no primeiro turno. No primeiro discurso após a votação, Lula frisou o segundo turno é “uma prorrogação” na qual sua campanha saía na dianteira, mas que demandava a contribuição de todos.
De tudo que foi traçado pela campanha lulista, ao menos cinco mandamentos parecem claros para o enfrentamento a Bolsonaro. São cinco diretrizes a serem efetivadas nestes 28 dias que separam o primeiro do segundo turno, marcado para 30 de outubro. Confira.
1) Acelerar a retomada da campanha
Lula usa como referência dois exemplos – um positivo, outro negativo – de participação da esquerda no segundo turno. O positivo é o de 2006, quando o petista venceu o então tucano Geraldo Alckmin e se reelegeu presidente. A vitória no primeiro turno havia escapado por apenas 1,39% dos votos válidos. Mas, antes que o desânimo tomasse conta dos apoiadores, Lula procurou reiniciar a agenda de campanha rapidamente. Um de seus primeiros trunfos foi conquistar o apoio de Sérgio Cabral, candidato que viria a se eleger governador do Rio de Janeiro com 68% dos votos válidos. O mantra da campanha era anunciar logo apoios de “fora da bolha”, como o do economista Delfim Netto. Lula praticamente pautou todo o segundo turno e venceu sem dificuldades.
O exemplo negativo é o de 2018. Uma onda antiestablishment e antipetista tomou conta do País e por pouco não deu a vitória a Bolsonaro já no primeiro turno. O petista Fernando Haddad chegou a passar para o turno final, mas a primeira semana subsequente foi considerada perdida, já que o foco na busca de apoios específicos foi em vão. As atividades de rua eram mornas. Para piorar, Bolsonaro não participava de encontros com Haddad nem de sabatinas mais duras, o que levou a grande mídia a cancelar debates e entrevistas com presidenciáveis. Quando a campanha engatou, com movimentos como o “Vira, Voto”, liderado por artistas da Globo, já era tarde.
“Nós somos especialistas em ganhar eleição no segundo turno”, disse Lula, nesta segunda, em coletiva à imprensa, lembrando que “foi assim” em 2002, 2006, 2010 e 2014. “Quase (foi) assim em 2018, (mas) houve problemas sérios na campanha”, frisou o ex-presidente, que reafirmou a orientação de pôr a campanha novamente nas ruas a partir desta terça-feira (4). “Cada um se prepare porque, daqui para frente, é menos conversa entre nós e mais conversa com outras pessoas que nós precisamos convencer.”
2) Atrair apoios de peso
Simone Tebet e Ciro Gomes (PDT) somaram 8,5 milhões de votos no domingo (2). Seja por meio dos próprios candidatos, seja por meio de seus partidos, os acenos entre Lula e a “terceira via” já foram feitos. Ciro – que se reuniu nesta segunda com o senador eleito Camilo Santana (PT-CE) – comunicou à direção do PDT que tende a seguir a orientação partidária de apoio a Lula. Tebet, mais assertiva, disse abertamente que já tinha lado na disputa, mas esperaria até esta terça-feira por um posicionamento dos partidos de sua coligação.
Os dois presidenciáveis exigirão que propostas de seus programas sejam assumidas por Lula, que já sinalizou concordância. É possível que eles anunciem apoio ao ex-presidente nesta semana, não necessariamente em atos públicos. O PDT, de Ciro, vislumbra um “apoio crítico”. Mas pedetistas como Rodrigo Neves, terceiro lugar na eleição ao governo do Rio de Janeiro, já se manifestaram: “Que o trabalhismo declare apoio e se engaje na vitória do Brasil e do presidente @LulaOficial”.
Adesões do centro também estão no radar da campanha. Nesta segunda, o ex-senador e ex-presidente nacional do PSDB, Tasso Jereissati, disse que, pessoalmente, já tinha posição pró-Lula. “Evidente que o partido tem que discutir alguns pontos com a equipe dele, mas o que está em jogo para nós é a democracia”, declarou Tasso ao Estadão. Roberto Freire, presidente do Cidadania, foi na mesma direção: “Encaminhei à Executiva Nacional (do Cidadania) posicionamento a favor de que o partido declare apoio a Lula no 2º turno”. O jornalista José Luiz Datena, hoje em conflito com as hordas bolsonaristas, é outro que especula anunciar publicamente o voto no ex-presidente.
3) Buscar o voto evangélico
Às vésperas da eleição, pesquisas indicavam que Bolsonaro podia ter até 20 pontos percentuais de vantagem sobre Lula entre eleitores evangélicos. A campanha do petista chegou a organizar materiais específicos e a promover atividades religiosas. Mas, na reta final da campanha, a pregação eleitoral de pastores em cultos e nas redes sociais ampliou a diferença entre os dois candidatos. “A avaliação da campanha é que a fake news de que Lula fecharia igrejas pode ter contribuído nos últimos dias para o crescimento de Jair Bolsonaro”, registrou a jornalista Andreia Sadi, da GloboNews.
Na visão da campanha de Lula, é necessário fazer mais para buscar o voto dos evangélicos, que representam, segundo o Ipec, 25% do eleitorado brasileiro. A ex-senadora Marina Silva (Rede), eleita deputada federal por São Paulo, será uma das líderes dessa iniciativa. A jornalistas, nesta segunda, ela cobrou humildade do campo progressista na relação com os evangélicos. “Nem todas as pessoas que votaram em Bolsonaro podem ser rotuladas de fascistas”, advertiu. “Precisamos ter humildade para fazer movimento de reconexão com eles – e não tratá-los como homogêneos.”
4) Incentivar a mobilização da militância
O final do primeiro turno foi marcado por agendas e peças de campanha que jogaram para cima a candidatura de Lula. Foi o caso da Super Live Brasil da Esperança, que reuniu dezenas de artistas, influenciadores e intelectuais. Nas ruas e nas redes, as manifestações de apoio ao ex-presidente – seja de celebridades, seja de anônimos – igualmente cresceram. Porém, com a não concretização da expectativa de ver a disputa decidida num único turno, a campanha corre para manter a mobilização em alta.
Desde o fim da votação no domingo, Lula já fez três declarações públicas. Em todas, mirou a militância e procurou demonstrar otimismo. “Nós vamos ganhar estas eleições. Isso (o segundo turno), para nós, é apenas uma prorrogação”, comparou o candidato. Também no domingo, a presidenta nacional do PCdoB, Luciana Santos, reforçou a diretiva: “Hoje, a gente vai celebrar esse triunfo, vai celebrar a democracia e, a partir de terça, a gente já cai em campo. Vamos ocupar as ruas, conversar com cada pessoa que a gente puder, para elevar a consciência popular e garantir ainda mais apoio a Lula.”
O influenciador Felipe Neto foi mais direto. “Sacode essa poeira porra!!!”, escreveu no Twitter. “Eles (os bolsonaristas) tiveram 4 anos de organização, máquina pública e muita grana. Msm assim PT subiu de 56 pra 68 cadeiras (na Câmara dos Deputados), venceu 3 governos e ainda disputa 4. PSOL subiu, PV tb, Novo derreteu de 8 pra 3”. Por fim, uma exortação: “Para de pessimismo, precisamos vencer a Presidência!”.
5) Denunciar Bolsonaro
Já é sabido que a campanha à reeleição de Bolsonaro vai intensificar as fake news contra Lula e a esquerda – o “gabinete do ódio” ganhará protagonismo no segundo turno. Em contrapartida, a candidatura do ex-presidente quer fortalecer a contraofensiva e dar mais visibilidade às respostas aos ataques infundados do bolsonarismo. Pela primeira vez, uma campanha encabeçada pelo PT atribui primazia às redes sociais.
Outra linha da campanha é ampliar as denúncias da gestão bolsonarista – da negligência no enfrentamento à pandemia ao agravamento da crise econômica, passando pelo desmonte de políticas públicas. Diferentemente do primeiro turno, em que Lula foi a sabatinas e debates na linha “paz e amor”, a coligação Brasil da Esperança vai amplificar as críticas ao governo de destruição de Bolsonaro. A meta é manter a rejeição ao presidente num patamar tão elevado que inviabilize suas chances de reeleição.
Conforme pesquisa Datafolha divulgada no sábado, a um dia do pleito, 52% dos eleitores declaram que não votariam “de jeito nenhum” em Bolsonaro. O resultado mostrou empecilhos ao projeto de reeleição do presidente, na medida em que limita seu potencial de votos no segundo turno. Se esse percentual for mantido ou tão-somente variar dentro da margem de erro, o êxito de Lula será inevitável.