ONU chama Fed e outros BCs para parar escalada dos juros
Os bancos centrais correm o risco de mergulhar a economia global em recessão, diz declaração da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) na segunda-feira (3) .
O alerta expressa um crescente temor com a avidez com que o Fed e seus parceiros estão aumentando os custos dos empréstimos sob pretextoi de conter a inflação galopante.
Na sexta-feira, o banco central da Índia advertiu que a economia global está enfrentando um terceiro grande choque na forma de aumentos agressivos das taxas de juros por bancos centrais de países ricos, após a pandemia de COVID-19 e a guerra na Ucrânia.
Em seu relatório anual sobre comércio e desenvolvimento, a UNCTAD salientou que as ações dos principais bancos centrais para aumentar as taxas de juros em resposta ao aumento dos preços eram um “jogo descuidado” que poderia sair pela culatra perigosamente.
O Fed – ressaltou o relatório anual sobre as perspectivas econômicas globais – corre o risco de causar danos significativos aos países em desenvolvimento se continuar aumentando as taxas de juros em um ritmo tão rápido.
O Fed está considerando outra alta acentuada nas taxas de juros a partir do próximo mês, e deve ser acompanhado pelo Banco da Inglaterra e pelo Banco Central Europeu.
A Unctad explicou que tal política não é adequada para a atual situação do mundo e que governos e bancos centrais de economias avançadas cometem um erro importante ao apelarem às políticas agressivas das décadas de 1970 e 1980 para combater a inflação (e que, como se sabe, ao invés de deter a inflação, levaram à estagflação, recessão com inflação alta).
Em vez da demanda excessiva por bens e serviços – observa o relatório -,grande parte da atual explosão inflacionária está sendo causada pelo aumento dos preços da energia e dos alimentos e problemas no comércio global. O que se contrapõe à tese neoliberal de que é imprescindível um forte “choque monetário” por dos governos e bancos centrais.
A UNCTAD aconselha medidas como controles estratégicos de preços, impostos sobre lucros extraordinários, medidas antitruste e regulamentações mais rígidas sobre a especulação com commodities para combater as pressões inflacionárias na fonte sem mergulhar os países mais pobres no abismo.
“O verdadeiro problema enfrentado pelos formuladores de políticas não é uma crise inflacionária causada por muito dinheiro sendo gasto em poucos bens, mas uma crise de distribuição, com muitas empresas pagando dividendos muito altos, muitas pessoas passando de salário em salário e muitos governos sobrevivendo do pagamento de títulos ao pagamento de títulos”, apontou Richard Kozul-Wright, que liderou a equipe responsável pelo relatório.
Outra consequência perversa da alta dos juros pelo Fed é que provoca o fortalecimento do valor do dólar em relação a outras moedas, pressionando os países mais pobres sobre os preços dos bens importados do exterior e elevando o custo do serviço da dívida.
A UNCTAD estima que um aumento de 1 ponto percentual na taxa de juros do Fed reduziria a produção econômica em outros países ricos em 0,5% e nos países pobres em 0,8% nos próximos três anos.
“Ainda há tempo para sairmos da beira da recessão”, afirmou Rebeca Grynspan, Secretária Geral da Unctad. “Temos os meios para acalmar a inflação e apoiar todos os grupos vulneráveis. Isso é uma questão de decisões políticas e vontade política”, acrescentou.
No entanto – ela sublinhou – as ações atuais “prejudicam os mais vulneráveis, principalmente nos países em desenvolvimento e há o risco de empurrar o mundo para uma recessão global”.
Visto por esse ângulo, o que os EUA estão fazendo é exportar inflação e crise da dívida.
Já o presidente do Fed, Jerome Powell, disse em uma coletiva de imprensa que o banco central norte-americano está considerando o impacto de suas políticas no resto do mundo, mas continuará aumentando as taxas de juros.
Estamos “muito cientes do que está acontecendo em outras economias ao redor do mundo e o que isso significa para nós e vice-versa” e tentamos levar isso em consideração. É a reiteração de “a moeda é nossa, mas o problema é de vocês”, inaugurada pelo então secretário do Tesouro de Nixon, John Connally.
Papiro