Em debate da Band, Haddad acua Tarcísio com orçamento secreto de Bolsonaro
Os dois candidatos que disputam o governo do estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Fernando Haddad (PT), participaram na noite desta segunda-feira (10) do primeiro debate do segundo turno das eleições. O encontro foi realizado pela Band, na Zona Sul da capital paulista.
Além dos temas locais, o debate reproduziu a polarização nacional pois cada um dos candidatos o governo paulista representa um projeto em disputa para a Presidência da República. Temas da esfera federal como o chamado “orçamento secreto”, armamentos, economia e pandemia, também foram tratados.
Como o Estado é o maior colégio eleitoral do País, o desempenho de ambos na disputa pelo governo tem relevância para o confronto entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).
De acordo com a pesquisa Datafolha mais recente, encomendada pela Folha de S.Paulo e pela Rede Globo e divulgada em 7 de outubro, Tarcísio lidera a corrida com 55% das intenções de votos válidos. Haddad tem 45%. Ao fim do primeiro turno, o candidato do Republicanos teve 42,3% dos votos válidos, e o petista, 35,7%. Já a pesquisa nacional Ipec no segundo turno mostra Lula com 51% das intenções de voto e Bolsonaro com 42%.
Vários analistas se manifestaram na mídia, destacando Haddad como vitorioso (veja mais abaixo). Com um formato mais fluído, sem palanques estáticos, e apenas dois candidatos, foi perceptível o domínio do candidato sobre o adversário no confronto direto. O telhado de vidro do candidato bolsonarista (e carioca) é sua recente presença no estado e a ausência de obras de seu ministério da Infraestrutura, em São Paulo.
Em trecho que viralizou na web, Haddad provocou Tarcísio dizendo que ele chama bolacha de “biscoito”, rixa popular entre paulistanos e cariocas nas redes sociais, para ressaltar que o ex-ministro de Bolsonaro não conhece São Paulo.
“Você fala que vai melhorar a merenda escolar. Você está sabendo o que as crianças estão comendo na escola hoje? É suco e bolacha. Ou biscoito, como vocês chamam lá no Rio de Janeiro”, alfinetou o candidato petista.
Pedra secreta no sapato
Haddad conseguiu se didático e contundente ao apontar a falta de transparência do modelo de distribuição do orçamento, criado durante a gestão Bolsonaro. Esta foi a pedra no sapato de Tarcísio, encurralado numa situação de defender algo que está claro para a população em sua ineficiência.
Tarcísio tentou jogar a casca de banana do agronegócio para Haddad, que partiu para o ataque ao falar da alteração do regime de chuvas resultante do desmatamento na Amazônia, o que afeta a prática agrícola no estado.
Inflação dos combustíveis
O imposto estadual sobre combustíveis foi forçadamente reduzido por Jair Bolsonaro, sob protestos dos governadores. Para Tarcísio, seu padrinho comprou um briga pelo consumidor, mesmo com o imposto não sendo o principal motivo dos custos altos, mas o rendimento dos acionistas da Petrobras.
Haddad denunciou isto ao dizer que Bolsonaro deixou os acionistas da estatal “esfoliarem” o consumidor brasileiro durante quatro anos, com aumentos sucessivos da gasolina, do diesel e do gás de cozinha, para depois no desespero da véspera de eleição fazer “caridade com o chapéu alheio”.
O candidato criticou o fato de Bolsonaro ter vetado o mecanismo de reposição dos recursos estaduais, deixando os governadores sem arrecadação do ICMS para Saúde e Educação.
“Vou manter a alíquota do ICMS e vou lutar para que o veto do Bolsonaro seja derrubado. Mas vou lutar também para que o presidente Lula enfrente o lobby dos acionistas estrangeiros da Petrobras. Eles não podem ter mais de R$ 100 bilhões de lucro às custas do consumidor brasileiro”.
Segurança pública
Ao discutir sobre segurança pública, Tarcísio reafirmou que é contra a política de câmeras de segurança em agentes da Polícia Militar. A medida é vista como uma forma de evitar o abuso de poder do policial, que vem sendo denunciado continuamente nos meios de comunicação. Ao defender a retirada, Tarcísio teria dialogado apenas com a bolha bolsonarista.
Coube a Haddad defender a medida, afirmando que a política já se mostrou eficiente, com a redução de 80% da letalidade policial. Caiu também o número de mortes dos próprios policiais.A medida também tem aceitação na população.
Nas consideração finais, Haddad mencionou o que pode fazer para enfrentar o empobrecimento do estado durante o governo Bolsonaro, sem destinação secreta de recursos. “A gente pode viver num mundo mais transparente. O dinheiro sai daí, de uma política econômica correta, da atenção aos mais pobres, às famílias que mais precisam e dar bom uso, bom trato da coisa pública com muita transparência.”
Tarcísio falou em focar no social, com construção de moradia para reduzir as famílias morando na rua, falou em resolver lacunas do atendimento médico no interior e na segurança hídrica.
Destaque para Haddad
Na avaliação de cinco colunistas do UOL, o petista se sobressaiu diante de Tarcísio de Freitas (Republicanos) no encontro promovido pela TV Bandeirantes na noite de segunda-feira (10). Leonardo Sakamoto disse que o petista venceu por encaixar mais críticas fundamentadas ao governo Bolsonaro em um segundo turno que é uma guerra de rejeições.
José Roberto de Toledo criticou o modo como Tarcísio parece ter treinado para falar os nomes de todos os municípios paulistas. Alberto Bombig avalia que Haddad conseguiu defender com clareza suas ideias e mostrou energia e desenvoltura corporal ao caminhar pelo palco e ao olhar para as câmeras.
Kennedy Alencar diz que Haddad saiu-se melhor nas respostas, demonstrando maior conhecimento das políticas de interesse do estado. Tarcísio de Freitas soou artificial como paulista. O colunista disse que o petista conseguiu controlar a pauta do que era debatido com o adversário. Haddad demonstrou mais ânimo e segurança. “Não foi um desastre para Tarcísio, mas ficou evidente a artificialidade da candidatura bolsonarista”, disse.
Josias de Souza disse que Haddad levou Tarcísio às cordas em alguns momentos, como no instante em que mostrou que prioridades que necessitam de verba federal, dependem das emendas orçamentárias secretas do centrão. Ou quando forçou o adversário a explicar o comportamento de Bolsonaro na pandemia.
Segundo a colunista do Estadão, Mariana Carneiro, ele conseguiu colar em Tarcísio a rejeição de Bolsonaro. Muito se falou do orçamento secreto, do sequestro do governo pelo Centrão, da inflação e até do desmatamento da Amazônia. Com isso, Haddad forçou o adversário a tentar defender o indefensável.
Rafael Cortez, sócio da Tendências Consultoria, considerou que o debate programático tornou o ambiente mais civilizado do que aquele em que características pessoais dos candidatos são atacadas. Para ele, o debate e seus potenciais efeitos dizem mais sobre a dinâmica nacional do que sobre os desafios para a conquista do Palácio dos Bandeirantes.
Para Álvaro Guedes, especialista em administração pública da Unesp, Fernando Haddad foi o vencedor do debate “pela capacidade de bem articular suas ideias.” Segundo o professor, Tarcísio não expressou suas habilidades técnicas e escondeu Bolsonaro, Haddad fez questão de mostrar seu vínculo com Lula.
Para José Álvaro Moisés, professor sênior do Instituto de Estudos Avançados da USP, o candidato do Republicanos respondeu mal às críticas sobre o fato de várias áreas do governo não terem cobertura do orçamento federal, por conta da utilização do orçamento secreto.
Para Eduardo Grin, cientista político e professor da FGV, a discussão “deixou muito claro para a sociedade paulista dois projetos antagônicos”. Enquanto Haddad foi claro em suas ideias e fez críticas didáticas ao orçamento secreto, Tarcísio enfatizou temas caros ao eleitorado conservador.
Para Aldo Fornazieri, professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo, Haddad se destacou por atacar temas referentes ao orçamento, enquanto Tarcísio de Freitas teve dificuldades de falar sobre o assunto. Para o professor o debate foi em geral equilibrado, com a maior divergência tendo ocorrido durante discussão sobre o tratamento às estatais, como a Sabesp. Tarcísio foi claramente privatista e Haddad prefere manter o controle acionário nas mãos do poder público.
(por Cezar Xavier)