Violência política é parte da estratégica do medo usada pelo bolsonarismo
A todo o momento nos deparamos com situações de violência política que vão desde episódios de agressão verbal e física até assassinatos, o que vem gerando um ambiente agressivo e inseguro para boa parte da população. Um dos casos mais recentes de que se tem notícia ocorreu no final de semana, na cidade de Cascavel (CE), quando, segundo testemunhas, um homem entrou num bar perguntando quem votaria em Lula. Um eleitor do ex-presidente se apresentou, houve uma discussão e ele acabou sendo esfaqueado.
Edmilson Freire da Silva, 59 anos, foi apontado como o culpado pela morte do eleitor de Lula, o caseiro Antônio Carlos Silva de Lima, de 39 anos. Ele estava foragido e foi preso nesta segunda-feira (26).
Neste mesmo final de semana, a jovem Estefane de Oliveira Laudano, 19 anos, foi agredida com uma paulada na cabeça pelo bolsonarista Robson Dekkers Alvino, de 52 anos, por ter feito um comentário sobre o atual presidente em um bar em Angra dos Reis (RJ). Ela levou sete pontos na cabeça.
Mas, os episódios causados pelo ódio político, somente nesses últimos dias, não param por aí. No domingo (25), o deputado federal Paulo Guedes (PT-MG) foi vítima de um atentado a bala enquanto fazia campanha em Montes Claros (MG). Os três tiros teriam sido disparados por um policial militar que estava à paisana. Também houve um tumulto causado por integrantes do MBL que provocaram militantes e acusaram falsamente Guilherme Boulos, candidato a deputado federal do PSol-SP, de ter agredido um adolescente, durante caminhada na avenida Paulista. Em Brasília, também no domingo, uma mulher que vestia uma camiseta com o rosto de Lula foi derrubada no chão e chutada por um homem.
O primeiro caso mais grave que chamou atenção para a escalada desse tipo de violência foi o assassinato do petista Marcelo Arruda pelo bolsonarista Jorge Guaranho em Foz do Iguaçu (PR), no dia 9 de julho. O autor do assassinato está preso. Mais recentemente, outro caso reafirmou o clima agressivo do atual período eleitoral: em setembro, Benedito dos Santos, apoiador de Lula, foi morto pelo bolsonarista Rafael Silva de Oliveira em Confresa (MT) após discussão de teor político.
O medo como estratégia
Estes são apenas alguns dos muitos casos que têm ocorrido com maior intensidade no período eleitoral, mas que são resultado de um clima de ódio que ganhou mais corpo desde que Jair Bolsonaro (PL) chegou à presidência. Sua retórica autoritária e agressiva voltada especialmente contra oponentes, jornalistas e mulheres, bem como seu discurso golpista, de ataque às instituições e seu estímulo ao uso de armas de fogo e à busca por soluções violentas para problemas de toda ordem atiçam seus seguidores, levando a um ambiente de tensão permanente.
“A violência política no Brasil, desta maneira como estamos observando, é inédita. Sempre houve casos assim, mas de outra forma. De maneira orgânica, sistêmica como acontece agora, é algo que nunca se viu no país. E isso está presente em vários estratos sociais e ambientes. Esse caráter sistêmico é algo novo trazido pelo bolsonarismo”, analisa Francisco Fonseca, professor de Ciência Política da FGV e da PUC-São Paulo.
Ele salienta que o bolsonarismo “representa uma visão de mundo, uma estratégia e, sobretudo, uma ‘tecnologia de poder’ advinda de Steve Bannon (ex-estrategista do ex-presidente dos EUA, Donald Trump), que orienta a extrema-direita em vários lugares do mundo. E no Brasil não é diferente”. Essa extrema-direita, explica, “tem, como modos operandi, produzir o medo, simbólico e efetivo, do qual deriva a violência. O medo é uma estratégia”.
O temor da violência política, aliás, foi aferido em pesquisa recente realizada pelo Datafolha a pedido da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP): 67% têm medo desse tipo de violência. Além disso, o Observatório da Violência Política e Eleitoral da UniRio apontou que casos desse tipo saltaram 335% nos últimos três anos. No primeiro trimestre de 2019, foram 47 ocorrências contra 214 no mesmo período deste ano.
Mecanismos de combate à violência
Para Fonseca, o combate à violência política passa por medidas de controle e punições mais severas a partir das instituições do Estado — inclusive no âmbito das eleições deste ano — e da criação de mecanismos de não aceitação desse tipo de comportamento, o que demanda uma mudança na condução política do país.
“As instituições precisam estar preparadas para poderem monitorar a violência para que ela não se propague, inclusive no dia das eleições, porque o bolsonarismo impinge o medo, sobretudo contra as mulheres, os negros, os pobres, que são grupos prioritários que votam no ex-presidente Lula. Então, intimidar estes grupos, nas periferias, sobretudo, é algo que faz parte dessa estratégia para que não votem, para que haja uma grande abstenção. O medo é uma estratégia”, reforça o professor.
Neste sentido, ele lembrou ainda o alto número de pessoas inscritas para trabalharem nas eleições como voluntárias — neste ano foram 830 mil interessados, quase dobro do que foi registrado em 2018, quando houve 430 mil, segundo o Tribunal Superior Eleitoral —, o que tem levantado suspeitas de técnicos do TSE quanto à possibilidade de haver bolsonaristas infiltrados para tumultuar o pleito.
“Essa é uma violência que tá espraiada no Brasil e que precisa ser combatida. A vitória de Lula pode ser o início deste freio, porque isso não vai acabar tão simplesmente. A gente tem aí cerca de 15% de eleitores que são identificados, de certa forma, com o fascismo, mais uns outros 15% que são reacionários ou conservadores — somados, são esses cerca de 30% (de apoiadores de Bolsonaro). Ou seja, há uma importante parcela da população que não vai, simplesmente pela derrota do Bolsonaro, deixar de agir desta maneira violenta”.
Fonseca aponta que “Bolsonaro estando fora do poder é uma um grande passo para superarmos isso, mas o bolsonarismo não vai acabar, será uma batalha longa a ser vencida”.