Putin rechaça agressão da Otan via neonazistas da Ucrânia no Donbass (AFP)

A Rússia anunciou na quarta-feira (21) a mobilização parcial de reservistas e o apoio aos referendos pela unificação que as duas repúblicas do Donbass – Lugansk e Donetsk – e as regiões de Kherson e Zaporozhia vão realizar a partir de sexta-feira (23) até terça-feira (27).

Desde fevereiro, a Rússia vem realizando uma operação militar especial para desnazificação e desmilitarização da Ucrânia e proteção da população oprimida de fala russa, que se levantou em 2014 contra o golpe de Estado – patrocinado pela CIA.

O regime instalado a ferro e fogo assumiu como meta explícita a “desrussificação” e “descomunização” e tem como ‘patrono’ o colaboracionista de Hitler na II Guerra Mundial, Josep Bandera, notório genocida de judeus, poloneses e soviéticos.

Em seu discurso, o presidente Putin disse que o Ocidente “já anda dizendo abertamente que em 1991 foi capaz de dividir a União Soviética, e agora” chegou a hora da própria Rússia, que deve “se desintegrar em muitas regiões mortalmente hostis”.

Putin e seu ministro da Defesa, Sergei Shoigu, apresentaram como razões para tal decisão a extensa linha de contato (de mais de 1000 km), o envolvimento direto de pessoal da Otan na direção das operações militares do regime de Kiev e as ameaças do Ocidente de destruição e pilhagem da Rússia.

RUSSIA RECHAÇA CHANTAGEM NUCLEAR

No discurso, Putin também reagiu à chantagem do uso de armas nucleares contra a Rússia (a mais notória delas, a declaração da agora primeira-ministra britânica Liz Truss).

“A chantagem nuclear também foi lançada”, denunciou o presidente da Federação da Rússia.

Ele destacou “não só o bombardeamento da central nuclear de Zaporozhya, que é encorajada pelo Ocidente, que ameaça uma catástrofe nuclear, mas também das declarações de alguns altos representantes dos principais Estados da Otan sobre a possibilidade e admissibilidade de usar armas de destruição em massa contra a Rússia – armas nucleares”.

Aos que se permitem fazer tais declarações sobre a Rússia – sublinhou o líder russo -, gostaria de lembrar que “nosso país também possui vários meios de destruição, e para alguns componentes – ainda mais modernos que os dos países da Otan”. “E se a integridade territorial de nosso país estiver ameaçada, certamente usaremos todos os meios à nossa disposição para proteger a Rússia e nosso povo. Não é um blefe”.

“Àqueles que estão tentando nos chantagear com armas nucleares devem saber que a rosa dos ventos também pode virar em sua direção”, deixou claro o líder russo.

“LUTA CONTRA A DOMINAÇÃO“

Para completar o alerta, Putin declarou que “está em nossa tradição histórica, no destino de nosso povo, parar aqueles que lutam pela dominação do mundo, que ameaçam com o desmembramento e a escravização de nossa Pátria. Faremos isso agora, e assim será”.

O presidente Putin disse ainda que em março, nas negociações de Istambul, as duas partes estiveram perto de um compromisso, mas “a solução pacífica não agradou ao Ocidente e Kiev recebeu uma ordem direta para romper todos os acordos”.

Foi entupida de armas e lançou “novas gangues de mercenários e chauvinistas estrangeiros, unidades militares treinadas de acordo com os padrões da Otan e sob o comando de fato de conselheiros ocidentais”.

Putin denunciou, ainda, que o regime de repressão em toda a Ucrânia contra seus próprios cidadãos, estabelecido imediatamente após o golpe armado de 2014, foi fortalecido da maneira mais severa após o fim das negociações.

“A política de intimidação, terror e violência assume formas cada vez mais massivas, terríveis e bárbaras. Os herdeiros de Bandera e os punidores nazistas matam pessoas, torturam, jogam-nas na prisão, acertam contas, reprimem, atormentam civis.”.

“Quero enfatizar que sabemos que a maioria das pessoas que vivem nos territórios libertados dos neonazistas [Zaporozhya, Kherson, Lugansk e Donetsk], e estes são, antes de tudo, as terras históricas da Novorossia, não querem estar sob o jugo do regime neonazista”.

Putin assinalou que cerca de cinco milhões de pessoas vivem hoje ali sujeitas a constantes disparos de artilharia e foguetes de militantes neonazistas. “Eles atingem hospitais e escolas, organizam ataques terroristas contra civis”.

REFERENDOS

“Não podemos, não temos o direito moral de entregar pessoas próximas a nós para serem despedaçadas por carrascos, não podemos deixar de responder ao seu desejo sincero de determinar seu próprio destino”, reiterou.

“Em sua agressiva política anti-russa, o Ocidente cruzou todas as linhas”, afirmou o presidente Putin. “Constantemente ouvimos ameaças contra nosso país, nosso povo. Alguns políticos irresponsáveis do Ocidente não falam apenas sobre planos para organizar o fornecimento de armas ofensivas de longo alcance para a Ucrânia – sistemas que permitirão ataques contra a Crimeia e outras regiões da Rússia”.

“Tais ataques terroristas, inclusive com o uso de armas ocidentais, já estão sendo realizados nos assentamentos fronteiriços das regiões de Belgorod e Kursk. Em tempo real, usando sistemas modernos, aeronaves, navios, satélites, drones estratégicos, a Otan realiza reconhecimento em todo o sul da Rússia”.

“Em Washington, Londres, Bruxelas, eles estão pressionando diretamente Kiev a transferir operações militares para nosso território. Não mais se escondendo, eles dizem que a Rússia deve ser derrotada por todos os meios no campo de batalha, seguido da privação da soberania política, econômica, cultural, em geral, de qualquer soberania, com a pilhagem completa do nosso país”.

300 MIL RESERVISTAS COM EXPERIÊNCIA

A mobilização parcial foi proposta pelo ministro da Defesa, Sergei Shoigu, de 300 mil reservistas, já com experiência militar, e estando assegurado que não incluirá estudantes nem recrutas. O Partido Comunista da Federação Russa – e não só ele – inclusive propôs uma mobilização mais ampla.

Na avaliação sobre a situação na frente, o presidente Putin apontou que a República Popular de Lugansk “já foi quase completamente livre de neonazistas”. A luta na República Popular de Donetsk “continua”.

“Aqui, por oito anos, o regime de ocupação de Kiev criou uma linha profundamente escalonada de fortificações de longo prazo. Seu ataque frontal teria resultado em pesadas perdas, então nossas unidades, assim como as unidades militares das repúblicas de Donbass, agem sistematicamente, com competência, usam equipamentos, protegem o pessoal e, passo a passo, liberam as terras de Donetsk, limpam cidades e vilas de neonazistas, prestam assistência às pessoas que o regime de Kiev transformou em reféns, em escudos humanos”.

De acordo com Shoigu, os 300 mil reservistas são apenas pouco mais de 1% da potencial de mobilização russo de 25 milhões de pessoas; as agências de notícias ocidentais dizem que são “15%”. Como esses reforços terão que ser convocados e retreinados, os combates nos próximos 1-3 meses não contarão com eles.

Shoigu observou que a Rússia está enfrentando “nem tanto a Ucrânia propriamente”, mas “a máquina de guerra ocidental inteira”.

Como exemplo, ele mencionou que toda a capacidade de satélites da Otan (70 militares mais de 200 de uso civil) está sendo usada contra a Rússia. Ele acrescentou que armas de alta precisão estão sendo deliberadamente usadas pelos comandantes da Otan para aterrorizar civis.

Na Assembleia Geral anual da ONU, o presidente norte-americano, uma semana após dizer que pretende enviar tropas norte-americanas “a Taiwan”, e envolvido até os cueiros no golpe de Estado de 2014 em Kiev – o filho Hunter pode contar alguns detalhes sórdidos -, meteu-se a fazer preleções contra a Rússia e Putin no conflito na Ucrânia.

Sendo presidente do único país do mundo que usou armas nucleares contra outro povo, em Hiroxima e Nagasaki, e com isso inaugurou a chantagem nuclear e a Guerra Fria contra a União Soviética, ele acusou a Rússia de “ameaçar com armas nucleares”.

O que Putin fez foi advertir os ideólogos da ‘vitória na guerra nuclear’, do ‘ataque de decapitação’ – é para isso que servem os sistemas antimísseis nucleares na Romênia e Polônia e, se deixarem, em breve na Ucrânia, além da frota de

navios de guerra sediada no porto de Rota, no Mediterrâneo, navios denominados de “antimísseis” – a não se meterem a besta.

Sem contar que desde 2008, no célebre discurso da Conferência de Segurança de Munique, Putin deixou claro que era insustentável os EUA continuarem impondo ao mundo sua vontade unilateral, a mais notória expressão disso a expansão da Otan e seus sistemas de armas até às portas da Rússia, apesar de todos os compromissos assumidos (e desrespeitados) quando da reunificação alemã.

PREMIÊ INGLESA SE DISSE “PRONTA A USAR ARMAS NUCLEARES”

Há um mês, madame Liz Truss, agora primeira-ministra britânica, se disse “pronta” a usar armas nucleares inclusive mesmo se isso causasse “a destruição global” – tal como registraram as agências de notícia ocidentais, não é ‘desinformação russa’.

No mais, a “democracia” nos EUA é como sua política externa: nada que não se resolva com um joelhaço no pescoço alheio. Ou “torcendo o braço”, na cínica versão do príncipe do excepcionalismo, Barack Obama.

Ou com o “espanto e pavor” na invasão do Iraque, onde em uma semana já não havia uma usina de eletricidade ou estação de tratamento de água de pé, ao contrário do que é visto na Ucrânia seis meses depois.

Sem surpresa, governos europeus que se viciaram na subserviência a Washington, ainda que sob risco de congelar no inverno e se desindustrializar, foram para a tribuna da ONU para desancar a Rússia soberana.

Em dezembro de 1921, a Rússia havia proposto a Washington e à Otan um acordo bastante razoável: a não anexação pela Otan da Ucrânia, manutenção do status de neutralidade e proibição de bases e sistemas de armas estrangeiros no país, bem como a retirada dos sistemas de armas que ameaçam diretamente a Rússia para a linha Oder-Neisse, como era em 1997, quando da assinatura do tratado de fundação Rússia-Otan.

Antes disso, os EUA haviam quase inteiramente acabado com a arquitetura de segurança coletiva na Europa, ao abandonarem os tratados de proibição de mísseis intermediários e o de Céus Abertos e quase terem acabado com o START-III de limitação de armas nucleares e respectivos lançadores.

BOMBARDEIO DO DONBASS

A resposta de Washington foi a recusa aos acordos propostos pela Rússia, o que foi seguido pelo início, ao longo de toda a linha de contato do Donbass, onde estava concentrado metade do exército ucraniano, como constataram os observadores da OCDE – que não podem ser chamados de pró-russos -, de intensos bombardeios contra os antifascistas do Donbass, tornando evidente que o regime de Kiev pretendia, pela terceira vez em oito anos, devastar a centenária área de população russa, para expulsá-la para a Rússia, reeditando o episódio, na desintegração da Iugoslávia, da expulsão dos sérvios de suas terras ancestrais na Krajina, operação conduzida sob orientação da Otan na época.

A União Europeia – cujo chefe da diplomacia, Josep Borrell, propôs sem rodeios ‘derrotar militarmente Moscou’ – já avisou que irá lançar um novo pacote de sanções contra a Rússia, possivelmente com o efeito bumerangue de aumentar a inflação e os temores de um “outono do descontentamento” nas praças europeias.

Em seu discurso, Biden tentou inflar uma ‘reforma’ da ONU, para na prática instaurar ali sua ‘ordem mundial sob regras’, por meio da diluição do direito de veto estabelecido pela Carta da ONU, que passaria a só existir em casos extremos, o que a China já rechaçou.

Como se sabe, nos “casos extremos” da Iugoslávia e da invasão do Iraque, os EUA dispensaram a Carta da ONU, com os conhecidos resultados.

Como Putin anunciara na véspera da Assembleia Geral da ONU, a criação do mundo multilateral e soberano está “entrando na fase ativa”.

“COLOSSAL CRISE GLOBAL”

O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, no seu discurso de abertura, criticou a situação da diplomacia internacional, dizendo que a atual agenda está “presa numa colossal crise global”.

Para ele, “a comunidade mundial não está pronta ou não quer resolver os graves problemas dramáticos do nosso século” – como a guerra na Ucrânia, a emergência climática, a deplorável situação financeira dos países em desenvolvimento.

Todas essas crises “ameaçam o próprio futuro da humanidade e o destino de nosso planeta”. Portanto, o mundo inteiro precisa se unir e começar a agir o mais rápido e eficientemente possível para superar essa “disfunção”.

“Precisamos de ação em todas as frentes. Não tenhamos ilusões: uma tempestade assola o mundo”, disse o secretário-geral.

Guterres chamou o acordo sobre a entrega de grãos e alimentos ucranianos para a África “um raio de esperança” e um exemplo de que “a paz pode ser alcançada quando agimos juntos”, “uma iniciativa abrangente sem precedentes”. “Alguém pode chamá-la de uma maravilha do mar. Mas, em essência, isso é diplomacia multilateral em ação”, acrescentou.

Papiro