Protesto em frente à Casa Branca contra descaso do governo com os doentes de Covid (Bryan Olin Dozier/AFP)

Os números do abandono da saúde pública nos Estados Unidos falam por si: mais de um milhão e 48 mil mortes por Covid-19, apenas 67% da população recebeu uma única dose da vacina e somente 50% duas doses. O resultado é macabro: são 400 mortos pela enfermidade todos os dias.

E é precisamente nesta terça-feira (20), em pleno outono e às vésperas do rigoroso inverno norte-americano – momento em que a doença encontra todas as possibilidades de se reproduzir – que o presidente Joe Biden decidiu anunciar de forma propagandística em rede nacional o “fim da pandemia”.

Infelizmente, esta não é a realidade, contestou o principal especialista em doenças infecciosas dos Estados Unidos, Anthony Fauci, para quem a pandemia está longe de ser encerrada – uma vez que só “metade da população recebeu duas doses” – e, principalmente, frente à necessidade de manejar corretamente as futuras variantes do vírus.

“Como respondemos e como estamos preparados para a evolução dessas variantes depende de nós. E isso nos leva ao outro aspecto controverso disso: a falta de uma aceitação uniforme das intervenções disponíveis”, declarou Fauci, assessor do presidente para o controle da emergência sanitária, cuja opinião foi desconsiderada.

Com todas as letras Biden disse no programa “60 Minutos”, transmitido no último domingo (18), que o país parece estar em “boa forma” e que “ainda temos um problema com o Covid-19, estamos trabalhando duro para isso; mas a pandemia acabou”. “Se você notar, ninguém está usando máscaras. Todos parecem estar em muito boa forma. E é por isso que acho que está mudando”, acrescentou o presidente, ignorando completamente a sua responsabilidade diante da nação.

Conforme os Centros de Controle e Prevenção de Doenças, apenas no último domingo os Estados Unidos diagnosticaram cerca de 14.000 novos casos.

A declaração do presidente doeu como uma bofetada nas pessoas que sofrem de sintomas de longo prazo do coronavírus, fazendo com que, apesar dos pesares, um grupo delas tenha ido até o lado de fora da Casa Branca na segunda-feira (19) a fim de exigir um mínimo de atenção.

De acordo com a organização sem fins lucrativos MEAction Network, que promoveu o protesto, vários manifestantes sofrem de encefalomielite miálgica, ou síndrome da fadiga crônica (ME/CFS), e deitaram-se na calçada segurando cartazes para serem levados em consideração.

“Estamos doentes e incapacitados com ME/CFS e Long Covid, mas estamos aqui hoje, colocando nossos corpos na linha, para dizer ao presidente Biden que a pandemia não acabou, que milhões de nós estão sendo incapacitados por doenças pós-virais. e precisamos de ação urgente de nosso governo”, disse o manifestante e diretor de defesa da MEAction, Ben HsuBorger.

O termo Long Covid é utilizado para descrever pacientes que ainda sofrem de sintomas semelhantes a vírus que podem durar semanas ou meses após a infecção inicial. ME/CFS é uma doença crônica que pode ser contraída após um diagnóstico de Covid-19.

Levantamentos da MEAction apontam que os sintomas de ME/CFS deixam 75% das pessoas com a doença incapazes de trabalhar e 25% acamadas.

Especialistas em saúde chineses – país que melhor enfrentou e superou as mazelas da doença – alertam que a pandemia nos EUA não está nem perto do fim e que o governo Biden deve tomar precauções para o possível aumento de casos nesta estação, em vez de afrouxar as restrições.

O professor assistente de saúde pública da Universidade de Yale, Chen Xi, reiterou que a pandemia nos Estados Unidos não acabou, pois além de uma média de 400 pessoas morrerem de Covid todos os dias, cerca de 30.000 pacientes estão internados atualmente com a doença no país.

Chen avalia que há muitas pessoas com doenças subjacentes, como deficiência imunológica, câncer, e idosos que não obtiveram proteção adequada das vacinas, e declarar que a pandemia acabou colocaria essas populações em risco.

Em um momento em que o financiamento de saúde dos EUA não é suficiente para lidar com ameaças subsequentes, incluindo testes para novas variantes e injeções de reforço, as declarações de Biden podem inviabilizar que o governo obtenha mais recursos do Congresso para o combate à enfermidade, ressaltou Chen.

A CNN divulgou que a Casa Branca pressionou por US$ 22,5 bilhões por ajuda adicional para o combate à Covid, mas alguns republicanos disseram que os comentários de Biden “essencialmente fecham a porta para as poucas chances de mais dinheiro ser aprovado”. Para a emissora, o presidente vê o fim da pandemia como uma chave para a solução das mazelas de seu governo e, pelo menos parcialmente, responsabiliza os resultados da Covid pela forma como os eleitores o percebem.

Cientistas disseram que as observações extremamente irresponsáveis de Biden podem levar a um aumento nos casos e mortes nos EUA nos próximos meses, quando a Covid se entrelaça com a gripe.

O pesquisador da Academia Chinesa de Ciências Sociais, Lü Xiang, aponta que, como presidente fraco, a declaração de Biden tinha motivos políticos aparentes, enquanto tentava mostrar a conquista do governo e elevar o moral do Partido Democrata, antes das eleições intercalares. Assim, em vez de tomar decisões com base em avaliações científicas dos departamentos de saúde, Biden anuncia o fim da pandemia sem pestanejar, algo absolutamente não científico e extremamente irresponsável, condena Lü.

Papiro