Ataque a Cristina Kirchner é caso grave de disseminação do ódio político
A noite desta quinta-feira (1º) terminou marcada por mais um deplorável episódio de violência política, com o ataque de um brasileiro contra a vice-presidenta da Argentina, Cristina Kirchner. “Estamos diante de um fato com uma gravidade institucional e humana extrema. Atentaram contra a nossa vice-presidente e a paz social foi alterada”, disse o presidente Alberto Fernandez.
O presidente afirmou ainda que “este atentado merece o mais enérgico repúdio de toda a sociedade argentina e de todos os setores políticos”. Ele destacou que trata-se do episódio “mais grave desde 1983, quando o país voltou a ser uma democracia”.
O governo argentino decretou feriado nacional nesta sexta-feira (2) devido ao ocorrido para, conforme o presidente, “que em paz e harmonia o povo argentino possa se expressar em defesa da vida, da democracia e em solidariedade com a nossa vice-presidente”.
O ataque aconteceu quando Cristina Kirchner chegava em casa no bairro Recoleta, por volta das 21h desta quinta-feira. Ela cumprimentava apoiadores que estavam em seu entorno quando um homem se aproximou e apontou uma arma na direção do rosto de Cristina. No entanto, o revólver não disparou.
O homem foi identificado pelas autoridades locais como o brasileiro e motorista de aplicativo Fernando Andrés Sabag Montiel, de 35 anos, nascido em São Paulo e residente na Argentina desde os anos 1990, filho de mãe argentina e pai chileno. Em 2021, ele chegou a ser advertido por porte ilegal de arma — uma faca de 35 centímetros — perto de onde mora, em Buenos Aires.
De acordo com a polícia argentina e conforme noticiado por veículos de imprensa, Montiel tem tatuagens com símbolos nazistas. Em uma busca feita em seu apartamento, foram encontradas 100 balas de calibre 9 milímetros. A arma usada no ataque à vice-presidenta era uma Bersa automática calibre 32, que continha cinco balas.
O caso está sendo investigado, mas os primeiros indícios são de que o atentado deve ter tido motivação política, situação que reflete o clima de ódio que permeia o cenário de vários países, inclusive o Brasil. “A principal hipótese com que se trabalha é que Fernando Sabag atuou sozinho, nos marcos de um discurso antiperonista, antiK e ferozmente contrário a políticas sociais”, escreveu o jornalista do Página 12, Raul Kollmann.
Solidariedade a Cristina
O caso repercutiu nas redes sociais, com declarações de apoio a Cristina e repúdio ao ataque, vindas de diversas autoridades e lideranças políticas. Veículos argentinos e internacionais também destacaram as reações de presidentes como Gabriel Boric, do Chile; Nicolás Maduro, da Venezuela, Lacalle Pou, do Uruguai, entre outros. O presidente Jair Bolsonaro (PL) não havia se pronunciado até o final da manhã desta sexta-feira.
Entre os brasileiros, o tom girou em torno do rechaço à violência política. O ex-presidente Lula (PT) destacou: “Toda a minha solidariedade à companheira Cristina Kirchner, vítima de um fascista criminoso que não sabe respeitar divergências e a diversidade. A Cristina é uma mulher que merece o respeito de qualquer democrata no mundo. Graças a Deus ela escapou ilesa”.
Lula continuou dizendo: “Que o autor sofra todas as consequências legais. Esta violência e ódio politico que vêm sendo estimulados por alguns é uma ameaça à democracia na nossa região. Os democratas do mundo não tolerarão qualquer violência nas divergências políticas”.
A ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) afirmou: “O atentado contra a vida de Cristina Kirchner por um brasileiro armado merece o repúdio do mundo inteiro. O ódio político e a violência de índole fascista, estimuladas por políticos extremistas, são uma ameaça à democracia na América Latina”.
O ex-ministro Ciro Gomes (PDT) declarou: “O atentado frustrado a Cristina Kirchner por pouco não transforma em chuva de sangue a nuvem de ódio que se espalha pelo nosso continente. Nossa solidariedade a esta mulher guerreira que com certeza não se intimidará. Para nós, fica a lição de onde pode chegar o radicalismo cego, e como polarizações odientas podem armar braços de loucos radicais ou de radicais loucos. Ainda há tempo de salvar o Brasil de uma grande tragédia gerada pelo ódio. Paz!”
A senadora Simone Tebet (MDB) apontou: “Violência política no Brasil, violência política na Argentina. É preciso dar um basta a tudo isso. As lideranças devem recriminar essas atitudes. Ainda bem que a arma falhou. Que tristeza! Reafirmo minha posição pela paz na política, pela paz nas eleições.”
Em nota assinada pela presidenta Luciana Santos, o PCdoB salientou: “Consideramos este fato gravíssimo, um resultado do discurso da intolerância, que utiliza como componentes essenciais o anticomunismo e a tentativa de criminalização da esquerda, inclusive através do lawfare”.
O atentado, continua a nota, “é também um sinal de alerta para o Brasil, pois em nosso país ocupa a cadeira presidencial um representante virulento da extrema-direita, que adota uma política de facilitar a compra de armas e, com sua postura, incita a uma espiral sem fim de violências e crimes contra adversários políticos aos quais, em mais de uma ocasião, prometeu “exterminar”.