Salman Rushdie, o escritor alvo da agressão (Vídeo)

O escritor Salman Rushdie “começou a se recuperar”, informou no domingo (14) seu agente, dois dias depois de ter sido esfaqueado em um evento literário no estado de Nova York, na pequena cidade de Chautauqua. “Ele não respira mais por aparelhos, sua recuperação começou”, informou Andrew Wylie em um comunicado enviado a vários veículos.

Ainda segundo seu agente, “vai levar tempo. Os ferimentos são graves, mas sua condição está indo na direção certa”. O autor foi esfaqueado várias vezes no pescoço e abdômen.

A família está “extremamente aliviada” por ele ter saído do respirador e dito “algumas palavras”, comentou um dos filhos do escritor, Zafar Rushdie, no Twitter.

Versos satânicos

Nascido na Índia e radicado em Londres, Rushdie é autor de “Versos Satânicos”, livro considerado ofensivo ao profeta Maomé em muitos países de fé islâmica, o que o levou a viver sob proteção policial durante anos, mas vinha residindo desde 2000 nos EUA, onde obteve em 2016 a cidadania norte-americana.

O livro, lançado em 1988, provocou enormes protestos e foi banido na Índia, Paquistão, Egito, Indonésia, Emirados Árabes e muitos outros países de maioria islâmica. No ano seguinte, se tornou alvo de um decreto religioso do então líder iraniano aiatolá Khomeini, chamando à execução de Rushdie por blasfêmia. Dez anos depois, o presidente iraniano, o aiatolá Kathami, disse que o Irã não endossava mais tal conclamação, de acordo com o portal Middle East Eye.

Agora o governo do Irã rechaça as acusações de que estaria por trás do esfaqueamento do escritor.

“Negamos categoricamente qualquer ligação” entre o agressor de Salman Rushdie e o Irã e “ninguém tem o direito de acusar a República Islâmica”, enfatizou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Irã, Naser Kanani, na segunda-feira (15).

Aliás, seria inusitado que Teerã tirasse a fatwa de mais de três décadas do formol, exatamente no momento em que está ocorrendo em Viena a rodada final para restauração – ou não – do acordo nuclear JCPOA rasgado por Donald Trump. Ainda mais quando um dos pontos em pauta é a retirada do rótulo de “organização terrorista” imposto por Washington à Guarda Revolucionária iraniana no mandato do bilionário e mantido por Biden.

De certa forma, o livro antecipou o que se tornaria o alvo dos EUA, nas três décadas seguintes, sintetizadas pelo ex-comandante militar da OTAN, general Wesley Clark, no famoso episódio em que foi informado no Pentágono de que Washington preparava para desestabilizar e ocupar “sete países em cinco anos”, todos eles com petróleo e população muçulmana.

John Bolton

Por outra coincidência enorme, há poucos dias a inteligência norte-americana divulgou que o Irã teria colocado o ex-conselheiro de segurança nacional de Trump, John Bolton, na sua “lista das terças-feiras fatais”, perdão, a das terças-feiras é aquela famosa lista do Obama…

Em recente entrevista à revista alemã Stern, Rushdie contou como, depois de muitos anos vivendo sob ameaça de morte, sua vida estava “voltando ao normal”. Apesar das ameaças, era frequentemente visto em público e muitas vezes sem proteção perceptível.

“Sir” Salman Rushdie

No mundo islâmico, ainda mais por sua origem em uma família muçulmana, Rushdie é visto como um trânsfuga, que não se importa em ofender as crenças de seu povo, para ficar bem na fita com a ‘inteligentzia’ das potências coloniais, e cuja notoriedade acabou por vir exatamente dessa opção, valores literários à parte.

Atuação que o fez, em 2007, ser agraciado pela rainha com o título de cavaleiro da Coroa Britânica, Sir Salman Rushdie.

O porta-voz iraniano condenou autoridades ocidentais por descreverem “o escritor blasfemo” como um “defensor” da liberdade de expressão. “A liberdade de expressão não pode ser usada como desculpa para insultar as religiões”, advertiu Kanani.

“Fontes” da OTAN andaram sugerindo que o esfaqueador poderia estar sendo “manipulado”, no caso, supostamente pelos iranianos.

Mas como há muitos interesses justo neste momento com relação a como ficam as coisas no Irã, o raciocínio também vale para outros manipuladores. Por exemplo, aqueles que não querem de jeito nenhum que o JCPOA seja restaurado ou que querem uma guerra com o Irã.

As discussões em Viena são intermediadas pela União Europeia. Rússia e China pleiteiam a volta ao acordo; Washington e Teerã discutem indiretamente, através dos mediadores.

Sem direito a fiança

Hadi Matar, de 24 anos, de ascendência libanesa, mas nascido nos Estados Unidos, foi derrubado no chão e dominado por populares após o esfaqueamento do escritor e entregue à polícia. Rushdie foi transportado de helicóptero até um hospital. De acordo com porta-voz da polícia de Nova York, Matar mora em Fairview, no Estado de Nova Jersey. Ele foi conduzido ao tribunal no sábado e acusado pela promotoria de tentativa de homicídio sem possibilidade de fiança.

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